Obra é resultado dos trabalhos da primeira turma do curso de educação executiva do Centro Insper Agro Global para profissionais de comércio exterior que atuam no agronegócio
Tiago Cordeiro
Olhar para o Brasil de fora para dentro. Esse é o principal objetivo do Centro Insper Agro Global. Criado em 2019 e vinculado ao Centro de Gestão e Políticas Públicas, o objetivo do núcleo é contribuir com cursos e pesquisas para um setor que responde por quase 27% do Produto Interno Bruto (PIB), 40% das exportações e 20% dos empregos no país.
Um dos cursos de educação executiva realizados pelo centro desde 2020 é realizado em parceria com a Fundação Alexandre Gusmão (Funag), ligada ao Ministério das Relações Exteriores. Conta também com apoio do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri). Chama-se “O Brasil no Agronegócio Global” e tem o objetivo de contribuir para a formação de profissionais que atuam no comércio exterior relacionado ao agronegócio. Até agora, foram realizadas três turmas, com 130 alunos no total.
O primeiro grupo de alunos participou da produção de uma série de artigos, destinados a descrever o cenário do mercado de nove diferentes macrorregiões importadoras de produtos do agronegócio brasileiro: América Latina, Estados Unidos e Canadá, União Europeia, Rússia, Oriente Médio e Norte da África, África Subsaariana, Sul da Ásia, China e Sudeste Asiático. Esses artigos se tornaram base do livro O Brasil no Agronegócio Global: reflexões sobre a inserção do agronegócio brasileiro nas principais macrorregiões do planeta.
O trabalho está disponível, gratuitamente, neste link. Tem prefácios de Marcos Lisboa, presidente do Insper, e Alexandre Ghisleni, diretor do Departamento de Promoção do Agronegócio do Ministério das Relações Exteriores. Lisboa afirma: “O agronegócio brasileiro iniciou uma trajetória de inovação e crescimento notável a partir dos anos 1970. A sua produtividade cresceu em média cerca de 3% ao ano nas últimas quatro décadas, diversificando a pauta de produtos e quintuplicando as exportações desde 1990, tornando-se o terceiro maior no ranking mundial, apesar da ausência de acordos internacionais relevantes”.
Por sua vez, Ghisleni escreve: “Um país com o perfil do Brasil — o terceiro maior exportador agrícola do planeta e o que detém o maior saldo comercial no setor — precisa defender seus interesses com habilidade e atenção crescente. Deve fazê-lo para diversificar sua pauta exportadora, agregar valor, manter e ampliar seu acesso a mercados internacionais, contrapor-se a tendências protecionistas verificadas em diversas partes do mundo, garantir condições equânimes de competitividade no curto, médio e longo prazo”.
Como apontam, na abertura do livro, os organizadores do trabalho, Marcos Jank, professor sênior de agronegócio no Insper e coordenador do Centro Insper Agro Global, e Leandro Gilio, pesquisador doutor sênior do centro, a obra pretende “contribuir para toda a comunidade científica e profissional que atue com os temas tratados, bem como contribuir para o processo de formulação de políticas públicas, privadas e estratégicas para o setor em âmbito global”.
Na entrevista a seguir, Marcos Jank explica a composição do trabalho e apresenta algumas das conclusões a que os 34 coautores — pesquisadores, diplomatas, auditores fiscais e outros profissionais — chegaram.
Como surgiu a ideia dessa obra?
Foi resultado da qualidade dos trabalhos apresentados pela primeira turma do curso “O Brasil no Agronegócio Global”. Oferecemos bolsas aos alunos e, em contrapartida, solicitamos que eles elaborassem um trabalho final. Quando vi a qualidade dos trabalhos, sugeri, na última aula, que os participantes interessados desenvolvessem seus textos para formar um livro. Para minha surpresa, a adesão foi entusiasmada. Ao longo de um ano, editamos os artigos. A equipe técnica do Centro Insper Agro Global contribuiu com gráficos e dados.
Esse é o primeiro livro, no Brasil, que trata do agronegócio da perspectiva dos profissionais que atuam no mercado internacional. Nosso foco é olhar a realidade de diferentes regiões, que são nossos principais clientes hoje, e analisar a conjuntura, as principais demandas e os maiores desafios, no comércio, no meio ambiente, na sanidade animal, no acesso aos clientes. Fizemos um lançamento virtual e, no dia 16 de dezembro, vamos disponibilizar o livro na versão impressa. O livro online é gratuito. O impresso terá um custo.
Existem demandas comuns a todas as nove macrorregiões cobertas pelo livro?
Sim. Um dos maiores desafios do agronegócio é se comunicar melhor. O setor se comunica mal, e a imagem do Brasil no exterior não ajuda. O segundo desafio é se engajar de forma mais proativa na agenda ambiental. Outra dificuldade é diversificar a produção. O país exporta commodities de dez setores, basicamente, quando poderia ampliar o portfólio e adicionar valor agregado. O acesso a mercados também é dificultado, em alguns casos, por práticas protecionistas e pela falta de proatividade da diplomacia brasileira na busca por firmar acordos comerciais para o setor. Além disso, falta uma maior sintonia do setor privado e do governo na promoção de produtos.
Há regiões para as quais o Brasil poderia vender mais?
Sim. Existe no Brasil uma preocupação com a dependência excessiva da China, que pressiona por um aumento dos volumes de produtos que o Brasil oferta, visando alimentar sua população cada vez mais urbanizada. Mas a Rússia, por exemplo, está se tornado um concorrente, e não mais um comprador do Brasil, por intermédio da própria China, que investe na diversificação das fontes de recursos. Por outro lado, o Brasil exporta pouco para a Índia, o Sul da Ásia e a África Subsaariana, que são as regiões onde o mundo vai experimentar o maior crescimento populacional nas próximas décadas.
Quais os diferenciais positivos do setor?
O agronegócio é, de longe, o setor mais internacionalizado da economia brasileira, o único global player de fato, que alcança 200 países. Nossa exportação cresce muito rápido, mais do que as dos Estados Unidos ou da União Europeia, ainda que eles acrescentem maior valor agregado a seus produtos. O mundo demanda commodities. Em 2021, nosso agro vai exportar US$ 120 bilhões, um crescimento de 20% em relação ao ano passado. Vai ser o melhor ano das exportações do setor. O Brasil tem um papel a cumprir na segurança alimentar do planeta.
O curso que deu origem ao livro continua formando novas turmas?
Sim. Foram três turmas muito ricas, caracterizadas por uma interação muito produtiva com profissionais de lugares tão díspares quanto Nigéria e Albânia. Depois do livro, vamos produzir, no início de 2022, uma lista de ações em políticas públicas para estimular as exportações do setor. Ela será entregue a todos os candidatos a presidente. Além disso, a próxima turma vai atender a um público diferente, que atua no setor privado. E o livro vai ser a fonte principal de leitura desses novos alunos.