O professor Leandro Consentino diz que seu objetivo é ajudar a capacitar pessoas — sejam eleitores, sejam líderes — para entender melhor a política e promover mudanças na sociedade
Quando cursava o ensino médio em Limeira, cidade no interior paulista onde nasceu e vive atualmente, Leandro Consentino decidiu prestar vestibular para o curso de Relações Internacionais. Foi aprovado na Universidade de São Paulo, em 2004. Na época, sua intenção era se tornar diplomata. Com o tempo, porém, percebeu que não iria se sentir confortável com uma carreira no Itamaraty.
“Um diplomata precisa seguir as regras e os padrões estabelecidos pelo governo em vigor sem questionamentos, e eu sempre tive o espírito de pensar criticamente as coisas”, conta. “Diante disso, comecei a considerar como uma alternativa a carreira acadêmica, com foco na área de política. Era algo que eu achava que me permitiria, de alguma forma, ajudar as pessoas e deixar uma marca positiva na sociedade.”
Depois de se graduar em Relações Internacionais (2008), Consentino fez o mestrado (2011) e o doutorado (2017) em Ciência Política, ambos na USP. Está desde 2011 no Insper, onde começou a trabalhar como monitor. Hoje ele ministra a disciplina Pensamento Crítico e Ética, que faz parte da trilha de humanidades para alunos de graduação em Administração e Economia. Leciona também na pós-graduação, no Programa Avançado em Gestão Pública (PAGP), e dá aulas em disciplinas eletivas, geralmente focadas em política e relações internacionais.
A seguir, conheça mais sobre a trajetória do professor Leandro Consentino.
Nasci em Limeira (SP), onde fiz todo o ensino fundamental e médio. Quando estava no ensino médio, cogitei inicialmente seguir carreira na área da saúde, especialmente em genética, que sempre me despertou interesse. No entanto, ao me aprofundar no assunto, percebi que havia pesquisas com animais, com o uso de cobaias, e que eu não me sentiria confortável, por exemplo, em dissecar um animal vivo. Diante disso, concluí que a área de biológicas não era para mim. As exatas, por sua vez, nunca foram meu forte. Assim, a área de humanidades se tornou uma escolha natural.
Dentro dela, explorei diferentes opções e descobri que o curso de relações internacionais me atraía por reunir um conjunto abrangente de conhecimentos, o que me permitiria integrar diversos saberes, como economia, política e direito, abrindo portas para diversas carreiras. Na época, a diplomacia me parecia um caminho promissor, o que reforçou meu interesse por estudar relações internacionais.
Em 2004, fui aprovado na USP e cursei a graduação em Relações Internacionais por quatro anos e meio. O curso tem duração normal de quatro anos, mas fiquei por um período maior devido à flexibilidade na grade curricular dos dois últimos anos, que permitia a escolha de disciplinas de outras áreas. Meu foco principal era a política, área que sempre me atraiu, mas também cursei disciplinas de direito, economia e outras áreas.
Na época, meu objetivo era seguir carreira na diplomacia. Mas, por sorte, um amigo foi aprovado no concurso do Itamaraty antes de mim e, conversando com ele, percebi que a vida de diplomata não se encaixava com meus valores. Um diplomata precisa seguir as regras e os padrões estabelecidos pelo governo em vigor sem questionamentos, e eu sempre tive o espírito de pensar criticamente as coisas. Diante disso, comecei a considerar como uma alternativa a carreira acadêmica, com foco na área de política. Era algo que eu achava que me permitiria, de alguma forma, ajudar as pessoas e deixar uma marca positiva na sociedade.
Em 2009, ingressei no mestrado em Ciência Política na USP, orientado por Maria Hermínia Tavares de Almeida, uma importante cientista política. Durante dois anos e meio, me dediquei ao mestrado, mas ao final me deparei com a incerteza sobre meu futuro profissional. Além disso, me sentia insatisfeito com a falta de impacto social das discussões em Ciência Política, que pareciam se limitar a um círculo fechado de especialistas e políticos, sem alcançar a população em geral. Foi assim que me aproximei da Fundação Mário Covas, onde comecei a dar cursos de educação política.
Durante esse período, Humberto Dantas, então superintendente da Fundação, tornou-se professor do Insper e me convidou para acompanhá-lo como monitor na disciplina de sociologia e política. Isso foi em 2011, um momento particularmente difícil em minha vida. No ano anterior, eu havia perdido meu pai e enfrentava diversos desafios pessoais. Apesar das circunstâncias, concluí o mestrado e, praticamente no dia seguinte, comecei a trabalhar como monitor no Insper.
Em 2013, iniciei meu doutorado em Ciência Política na USP, mas não pude aceitar a bolsa oferecida, pois trabalhava no Insper e a bolsa não permitia acumular emprego. Para complementar minha renda, me inseri mais profundamente no ecossistema da educação política, onde já tinha alguma experiência com palestras esporádicas. Passei a dar aulas em várias instituições, como a Fundação Mário Covas, onde me tornei superintendente, e a Fundação Konrad Adenauer. Também lecionei no Colégio Sidarta, na Granja Viana, além de viajar pelo país ministrando cursos livres. Esse período me permitiu não apenas me sustentar financeiramente, mas também aprender a dialogar com pessoas de diferentes setores e origens.
Refletindo sobre minha trajetória, percebi que desde o ensino médio eu gostava de dar aulas para meus amigos, o que parecia ser algo natural para mim. Conectar esses pontos me levou a entender que a educação poderia ser uma forma eficaz de contribuir para a política. A ideia de ensinar as pessoas sobre como a política funciona, capacitando tanto os eleitores quanto os futuros candidatos, se tornou um propósito claro para mim. Essa motivação se fortaleceu durante o mestrado em Ciência Política, pois percebi que a educação política era uma maneira poderosa de promover mudanças sociais.
Meu interesse pela política foi influenciado por meu pai, que sempre se manteve bem informado sobre os acontecimentos ao redor do mundo, apesar de não ser politicamente ativo (ele trabalhava com seguros, enquanto minha mãe sempre foi dona de casa). Desde o ensino fundamental, participei de grêmios estudantis e, na faculdade, atuei na gestão do centro acadêmico. A política sempre esteve presente na minha vida, tanto em casa quanto na escola. Esse envolvimento natural com a política, aliado ao desejo de compreender e ensinar como ela funciona, me levou a perceber que poderia ajudar a transformar a sociedade por meio da educação política.
Atualmente, no Insper, dou aulas na graduação em Administração e Economia, em uma disciplina chamada Pensamento Crítico e Ética, que é a primeira da trilha de humanidades desses cursos. Na pós-graduação, estou envolvido no Programa Avançado em Gestão Pública (PAGP), no qual inicialmente dava uma matéria sobre Constituição e Política. Posteriormente, foi incluído um componente de ética, e atualmente dou aula sobre Ética e Organização Pública nesse programa. Essa experiência tem sido enriquecedora, permitindo que eu integre aspectos teóricos e práticos, preparando os alunos para os desafios reais da administração pública.
Paralelamente, ministro disciplinas eletivas, geralmente focadas em política e relações internacionais. Uma das iniciativas recentes mais bem-sucedidas foi a disciplina Seminários de Política e Relações Internacionais. Nela, convidei profissionais de diversas áreas, como gestão pública, jornalismo político e relações internacionais, para falar com os alunos sobre suas trajetórias e temas atuais. Essa abordagem não apenas expôs os alunos a conhecimentos práticos e atualizados, mas também conseguiu manter seu interesse ao longo do semestre. A interação com profissionais que atuam no mercado e na política proporcionou uma experiência dinâmica e inspiradora, que espero expandir em futuras oportunidades no Insper.
Minha trajetória como aluno foi toda na USP, enquanto minha trajetória como docente é quase toda no Insper, com exceção de breves períodos em que lecionei em outras instituições. Essas experiências me fizeram perceber o contraste em relação ao Insper. Não se trata apenas da infraestrutura, embora isso realmente chame a atenção. O Insper é uma escola muito bem equipada, o que é excelente para os alunos. No entanto, uma escola bem equipada, sem um conteúdo de qualidade, acaba se tornando vazia, apenas uma fachada bonita sem substância.
O grande diferencial do Insper é, sem dúvida, tornar os alunos protagonistas do ensino. Isso significa que o foco está no real aprendizado do aluno, mais do que na forma como os professores ensinam. O Insper tem um cuidado muito grande com questões como plágio e cola, não apenas por uma questão de honestidade intelectual, mas também para ensinar aos alunos desde o início que não se faz ciência com base na cópia ou no improviso. A ideia é que os alunos compreendam que a construção do conhecimento deve ser sempre baseada em evidências.
Os valores que o Insper promove são fundamentais para construir uma escola diferente. O foco em evidências científicas e o aprendizado centrado no aluno são pilares que sustentam o objetivo central do Insper, que é contribuir para o desenvolvimento do país. Esse compromisso é algo que me atraiu ao Insper e que continua me motivando a trabalhar na escola.
O momento político atual do Brasil reflete um histórico descaso com a educação para a política e a cidadania. Após a ditadura militar, disciplinas como Educação Moral e Cívica e Organização Social e Política do Brasil foram removidas dos currículos sem serem substituídas por programas que ensinassem cidadania e democracia. Isso gerou uma lacuna na formação dos brasileiros como cidadãos conscientes, uma falha que se torna evidente na situação política atual. Muitos acreditam que a formação democrática é algo que se aprende naturalmente, mas a ausência de uma educação estruturada nessa área cobra seu preço.
Em outros países, a educação política é integrada desde cedo, com alunos aprendendo sobre democracia e política já no ensino fundamental. No Brasil, a política é frequentemente vista como algo pertencente apenas aos políticos, o que limita a capacidade da sociedade de cobrar e fiscalizar seus representantes de maneira eficaz. A mensagem transmitida pelas urnas eletrônicas, que exibem a palavra “fim” após o eleitor registrar seu voto, simboliza erroneamente o término da participação cidadã. Esse momento deveria ser, na realidade, o início de um engajamento político contínuo.
Apesar das deficiências na educação política, há crescente preocupação e iniciativas do terceiro setor para preencher essa lacuna. Entidades como a Fundação Konrad Adenauer, a Oficina Municipal, o RenovaBR e o Centro de Liderança Pública (CLP) trabalham para capacitar cidadãos e gestores públicos. Essas iniciativas são fundamentais para promover um diálogo mais saudável e construtivo na política brasileira, e eu tenho procurado contribuir com essas entidades além do meu trabalho acadêmico no Insper. A polarização atual e a falta de diálogo demonstram a necessidade urgente de uma educação política robusta para consolidar uma democracia plena no Brasil.
À medida que amadurecemos, percebemos que fazer planos de longo prazo pode ser arriscado. Ao mesmo tempo, é essencial traçar objetivos claros. No meu caso, o plano é crescer na profissão docente. Encontrei meu caminho na educação e não me vejo fazendo outra coisa, pois tenho uma grande paixão por ensinar.
Embora no passado eu tivesse interesse em diplomacia e política institucional, hoje meu foco está na formação cidadã. Desejo capacitar pessoas, sejam líderes, sejam eleitores, para entender melhor o mundo da política e contribuir para a transformação social. Acredito que podemos mudar a visão negativa da política, muitas vezes associada a escândalos e disputas mesquinhas, e promovê-la como uma ferramenta essencial para a mudança social. Essa é a contribuição que quero dar e onde quero crescer.
Vejo no Insper um papel fundamental nessa missão e acredito que a instituição pode ampliar ainda mais sua atuação nessa área. Gostaria de ver mais discussões sobre política nacional e internacional dentro do Insper, especialmente na graduação. Sonho com a criação de programas e cursos que integrem política e relações internacionais, ajudando a formar profissionais mais completos e cidadãos mais conscientes.