O desafio proposto pela Augme Capital em trabalho de PFE foi verificar a possibilidade de antecipar os movimentos de mercado envolvendo venda de títulos de fundos de investimento
Bruno Toranzo
Como prever o comportamento do investidor e antecipar movimentos vendedores de ativos por causa do estresse de liquidez no mercado? Essa pergunta deu início ao PFE (Projeto Final de Engenharia) que, por meio do uso de estatísticas descritivas e técnicas de ciência de dados, criou um relatório para avaliar a probabilidade de desvalorização no preço unitário dos papéis ou dos títulos de fundos de investimento emitidos por um determinado emissor nas duas semanas seguintes à elaboração do documento.
O trabalho, realizado pelos alunos João Vitor Menezes de Magalhães, João Pedro Farias de Araujo, Luiz Eduardo Correa Santoro e Rafael Alves Madarás, foi demandado pela parceira Augme Capital, uma gestora de fundos com mais de 3 bilhões de reais investidos sob sua gestão. Ela atua em um setor cujo principal desafio é antecipar as movimentações do mercado. Quanto mais conhecimento sobre as tendências de fluxo de investimento, melhor a decisão sobre a alocação dos recursos, incluindo os momentos corretos ou mais adequados de compra e venda dos papéis dos fundos de investimento geridos.
“O que se pretendeu desde o início foi verificar a possibilidade de antecipar os movimentos de mercado por meio de informações públicas de fundos de investimento como composição da carteira e fluxos de operações, especialmente de pedidos de resgate. Utilizamos, como fonte para isso, o site da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), principalmente as informações sobre liquidez e debêntures”, explica Tiago Tavares, professor do Insper e orientador desse PFE. O principal objetivo foi evitar um dos piores movimentos para os preços dos ativos, conhecido como sell-off — que ocorre quando as solicitações de resgate são muito altas, fazendo com que o responsável pela gestão dos ativos dos clientes precise vender um ativo compulsoriamente a fim de honrar os resgates. Esse movimento provoca no mercado um número elevado de vendas, derrubando o preço dos ativos e gerando oportunidades mais baratas de compra.
“Nessa situação específica, portanto, ocorre grande volume de vendas de títulos em período curto, o que ocasiona a queda do preço dos papéis. Há diversos motivos para isso, trazendo uma dificuldade elevada de como antecipar movimentos que são essencialmente inesperados”, diz Tavares. Ao tentar controlar esse processo ou ao menos amenizá-lo, o PFE tinha como proposta trazer uma vantagem competitiva à Augme, já que passaria a contar, por meio dos relatórios, com análise mais embasada sobre onde — e em qual momento — fazer ou resgatar os investimentos.
Os alunos baixaram os dados do site da CVM por meio da técnica de webscrapping, que consiste em transformar essas informações textuais em um modelo de tabelas que possa ser lido pelo computador de forma automática. A etapa de predição veio na sequência, tentando prever ou antecipar o comportamento de resgate por parte dos investidores a partir de dados históricos de patrimônio líquido dos fundos. Para isso, foram executados vários algoritmos de predição, mas nenhum deles funcionou bem. “Percebemos que, de fato, é muito difícil prever um movimento ligado a diversos fatores simultâneos e imprevisíveis. Essa característica reduz a eficácia do modelo de predição”, destaca o professor.
Sendo assim, observa Tiago, não houve resultado que permitiu prever o futuro por meio da observação do passado. “A realidade é que todos os trabalhos que tentaram prever o futuro do mercado de ações por meio de redes neurais falharam. Esse dado é muito complexo porque há muitas variações sobre os motivos que levam a um determinado movimento e também porque o sistema está todo interligado. A Bolsa dos Estados Unidos influencia a nossa, que também sente os reflexos dos mercados acionários europeus, e assim por diante”, afirma. De qualquer forma, o principal ganho para a Augme Capital foi saber que o modelo de predição não funciona bem, mas que as decisões baseadas em dados são preferíveis a decidir no escuro.
“Para os alunos, o principal desafio foi compreender esse universo complexo de investimentos para depois modelar o problema proposto. Eles também puderam perceber que nem sempre o modelo vai resolver o problema, e isso é natural, já que os modelos precisam mesmo ser testados. As reuniões semanais com a empresa, que deu todo o suporte necessário, foram muito relevantes para o sucesso do PFE”, afirma o professor.