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Jornalistas e influenciadores podem ser parceiros em educação financeira

Evento do Insper debateu os limites entre informação e credibilidade na internet e nos veículos tradicionais

Evento do Insper debateu os limites entre informação e credibilidade na internet e nos veículos tradicionais

 

Leandro Steiw

 

O prestígio cada vez maior dos influenciadores da internet sobre os investidores, principalmente os mais jovens, mexeu com as bases do jornalismo de economia. Para tentar compreender o fenômeno, o Centro Celso Pinto de Estudos de Jornalismo Econômico do Insper realizou o evento Jornalistas e influenciadores no mercado de capitais. Os convidados debateram os resultados do relatório FInfluence – Quem fala de investimentos nas redes sociais, uma parceria da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) com o Instituto Brasileiro de Pesquisa e Análise de Dados (IBPAD).

Participaram da conversa Amanda Brum (jornalista e gerente executiva da Anbima), Ana Estela de Sousa Pinto (jornalista e editora de economia da Folha de S.Paulo), Charles Mendlowicz (economista e host do podcast “Os Economistas”) e Vanessa Adachi (jornalista, cofundadora e editora-chefe do Reset, veículo digital de jornalismo econômico). A apresentação e mediação foram de André Lahóz Mendonça de Barros (jornalista, economista e coordenador executivo de Marketing e Comunicação do Insper) e Carlos Eduardo Lins da Silva (professor do Programa Avançado em Comunicação e Jornalismo e coordenador do Centro Celso Pinto de Jornalismo Econômico no Insper).

Conforme explicou Lins da Silva na abertura do evento, o Centro Celso Pinto é uma iniciativa inédita no país e está trabalhando na pesquisa e na divulgação do jornalismo dedicado à cobertura de temas econômicos no Brasil. O Centro já fez um guia de boas práticas em jornalismo do agronegócio, está trabalhando num guia de cobertura da saúde suplementar e terminando um livro sobre a história da Gazeta Mercantil, uma referência em jornalismo econômico no Brasil no século 20. O evento sobre jornalistas e influenciadores é parte do esforço do Centro Celso Pinto de promover debates sobre temas importantes relacionados à imprensa.

Os profissionais que participaram das discussões concordaram: a apuração e a checagem dos fatos na imprensa são superiores, mas o jornalista não consegue interagir com o público tão agilmente quanto o influenciador. Isso ajuda a explicar o turbilhão enfrentado pelo jornalismo de economia, “curiosamente, no momento em que nunca esteve tão em evidência a necessidade de uma boa cobertura sobre todos os temas”, como ressaltou o mediador Mendonça de Barros.

 

Amanda Brum e Ana Estela de Sousa Pinto
Amanda Brum e Ana Estela de Sousa Pinto

 

Segundo Amanda Brum, os dados do relatório mostram que o tratamento da informação, consagrado pelas mídias tradicionais, não é mais o mesmo. “A principal fonte de quem investe no Brasil, não importa a classe social ou a idade, é o YouTube”, afirmou. Se nas décadas anteriores as informações passavam por um processo de apuração e edição profissional, atualmente qualquer pessoa pode abrir uma conta nas redes sociais, falar sobre um assunto que seja de interesse e arrebanhar milhões de seguidores. E, acima de tudo, sem intermediários. Uma das conclusões da pesquisa confirmou a impressão inicial: as bolhas existem. Os influenciadores falam para seus seguidores e, raramente, conseguem extrapolar o seu círculo de influência.

O relatório mediu popularidade do influenciador, comprometimento com publicações frequentes, engajamento médio dos seguidores, autoridade para formar uma bolha temática e potencial do influenciador em mobilizar outros atores na discussão de determinado tema. Foram identificados 277 influenciadores ativos que falam sobre investimentos, prioritariamente, com 612 perfis no Instagram, YouTube, Facebook e Twitter. Eles atingem 91 milhões de pessoas, mais do que os perfis relacionados aos veículos tradicionais de imprensa conseguem juntos — embora sejam apenas 10 órgãos de comunicação, com 80 milhões de seguidores.

Entre produtores de conteúdo, analistas profissionais de mercado, traders que indicam investimentos, investidores independentes e especialistas, o top influenciador é o Economista Sincero, como se autodenomina o economista Charles Mendlowicz. Amanda Brum ressaltou: o ranking é resultado do cruzamento desses cinco critérios adotados pela pesquisa, sem julgamento de valor. A idoneidade ou não dos ranqueados em educação financeira seria uma questão a ser tratada por órgãos reguladores ou similares.

 

André Lahóz e Carlos Eduardo Lins da Silva
André Lahóz Mendonça de Barros e Carlos Eduardo Lins da Silva

 

Parceiros da mídia

Para Ana Estela de Sousa Pinto, o jornalista que cobre mercado financeiro é muito diferente do influenciador, mas eles não são necessariamente competidores, porque ambos comungam o objetivo de fornecer informação. “A popularidade do influenciador é muito baseada na figura dele, é quase uma celebridade, é ele que importa”, dissea editora de economia da Folha de S. Paulo. “Nas redações, o jornalista nunca quer ser notícia, ele quer estar distante e escreve em terceira pessoa. A nossa vocação, até agora, não era pegar o público pela mão e dizer que é assim que se faz. Talvez fosse bom acordarmos para isso.”

Ana Estela acredita que os influenciadores podem ser parceiros da mídia e serem professores de quem trabalha com jornalismo econômico, porque conseguem dialogar com públicos que os jornalistas querem atingir. Charles Mendlowicz, o Economista Sincero, concorda. “Parcerias são o futuro”, afirmou o influenciador. “Nasci e cresci lendo a mídia tradicional de economia. Eu não fazia nada sem ler o que estava acontecendo no mundo.” Mendlowicz contou que ainda hoje, antes de divulgar alguma informação, confere a veracidade dos fatos em jornais. Mas acredita que os mais jovens não cultivam o mesmo hábito.

Na opinião de “Charlão”, como é chamado por alguns seguidores, os influenciadores que estão no topo da lista da Anbima são melhores comunicadores do que conhecedores de economia e finanças e poderiam fazer sucesso em qualquer outra área. Essa característica abriria espaço para as mídias tradicionais criarem os seus próprios influenciadores na área de finanças, preservando o processo de checagem das informações. O complicador seria a ascensão rápida dos influenciadores. “A pandemia fez em cinco anos um fenômeno de dez anos”, disse Mendlowicz. “Não daria para falar que as redações poderiam ter feito os seus influenciadores, porque, quando a gente viu, já havia acontecido.”

A jornalista Vanessa Adachi considera fundamental o papel dos influenciadores na democratização da informação. “Impessoalidade é a grande dificuldade do jornalista para transitar nesse mundo dos influenciadores”, afirmou. “É notório que precisamos aprender a falar com esse público, porque somos muito encastelados. Mas também vejo muitos problemas. Tem informação boa e ruim, não tem ninguém checando isso o tempo inteiro. O grande drama para qualquer pai e qualquer mãe é como você educa os seus filhos para entender como eles consomem informação em rede social, como consegue navegar nesse universo de uma maneira saudável. Essa acurácia da informação é a grande joia do jornalismo.”

 

Charles Mendlowicz e Vanessa Adachi
Charles Mendlowicz e Vanessa Adachi

Império de seguidores

Os comunicadores da internet não parecem ter resolvido uma discussão clássica do jornalismo — o poder dos patrocinadores sobre a independência do noticiário. Mendonça de Barros questionou se o próprio império do número de seguidores e da reação instantânea não desvirtua o que faz o jornalismo. “É muito menos claro quem é o patrão do influenciador, a quem ele está servindo, as práticas nocivas que podem ou não acontecer”, disse.

Ana Estela analisou pela perspectiva da educação financeira: se o influenciador contribuir para diminuir a distância entre as pessoas e o mercado financeiro, há convergência de interesse e os jornais deveriam aprender essa linguagem para potencializar o seu papel como agentes públicos. No entanto, se a informação for puro marketing e oferecida sem transparência, está muito longe do que se pode chamar de jornalismo.

Na internet, os limites entre jornalismo e marketing são tênues. Charles Mendlowicz observou que boa parte dos “influenciadores gigantes” já trabalham para bancos e corretoras, inclusive sob a marca de portais e veículos de comunicação tradicionais. Assim, torna-se complexo distinguir o que é educação financeira ou apenas “um clique de venda”, como definiu Vanessa Adachi. Diante do dilema, Mendlowicz garantiu que se guia pela segurança financeira do investidor em 15 ou 20 anos no futuro. “Se eu machucar financeiramente o meu seguidor, ele não vai estar comigo amanhã”, afirmou.

A desvantagem do veículo de imprensa é que a produção de notícia é cara quando se quer oferecer uma variedade de coisas chatas e divertidas ao leitor, segundo Ana Estela. “O influenciador só se preocupa com as divertidas”, afirmou. “Portanto, existe um lugar para um noticiário normal, porque não somos inimigos. Uma pesquisadora da LSE (London School of Economics) disse esta frase: ‘Os jornais precisam ter capacidade de continuar evoluindo quando os influenciadores já forem uma coisa do passado’. O jornalismo tem que continuar sua tarefa e descobrir a forma de continuar fazendo isso.”

 

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