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“Os cientistas da computação devem saber combinar agilidade e eficácia”

A professora Graziela Tonin, especialista em metodologias ágeis, fala sobre as habilidades necessárias para profissionais que desenvolvem softwares em um mundo onde tudo muda velozmente

A professora Graziela Tonin, especialista em metodologias ágeis, fala sobre as habilidades necessárias para profissionais que desenvolvem softwares em um mundo onde tudo muda velozmente

 

Graziela Tonin, especialista em metodologias ágeis e professora do Insper

Doutora em Ciência da Computação pela Universidade de São Paulo, na área de Engenharia de Software, Dívida Técnica e Metodologias Ágeis, a professora Graziela Tonin vai lecionar a disciplina Projeto Ágil e Programação Eficaz no novo curso de Ciência da Computação do Insper. Na entrevista a seguir, ela explica o que são os métodos ágeis – e por que os futuros cientistas da computação devem dominar essas ferramentas para se ajustar às mudanças repentinas do mercado e desenvolver produtos que atendam às necessidades dos clientes.

 

O que os alunos vão estudar na disciplina Projeto Ágil e Programação Eficaz?
O objetivo dessa disciplina é mostrar, na prática, como os alunos podem desenvolver um software com garantia de qualidade, desde o levantamento e a identificação do problema, a definição dos requisitos, até o entendimento das regras de negócio e a tradução para requisitos técnicos. Para isso, é preciso que os alunos aprendam a organizar, priorizar, planejar e implementar, seguindo as boas práticas de programação e definição de arquitetura, metodologias, práticas, artefatos e cerimônias ágeis. Ou seja, aplicar esses conceitos para solucionar problemas reais, com interação constante com profissionais e empresas do mercado em um ambiente próximo do real.

Como os alunos vão aprender esses conceitos em sala de aula?
A ideia é montar times estrategicamente definidos para englobar estudantes com diversos perfis, com o objetivo de ter a maior diversidade possível nas equipes. O objetivo é trabalhar a busca de excelência técnica, bem como desenvolver habilidades de trabalho em equipe, organização e gestão das tarefas, definição e entrega de metas, guiados por OKRs (objetivos e resultados-chave), com base em dados coletados por métricas de garantia de qualidade e também de entrega de valor para o cliente. Para isso, é preciso buscar aliar a vanguarda do conhecimento com metodologias ativas. Os alunos irão experimentar e testar constantemente todo o conteúdo da disciplina e terão feedback frequente do seu desempenho, assim como poderão dar feedback constante sobre a disciplina.

Além do conteúdo eminentemente técnico, que outras habilidades serão trabalhadas nas aulas?
Vamos trabalhar com conceitos de liderança para que os alunos estejam preparados não somente para implementar um software, mas também para liderar equipes ágeis multidisciplinares em busca de um mesmo objetivo, guiados por resultados mensuráveis, com métricas claras, e baseados na coleta e na análise dos dados. Vamos utilizar ciclos interativos e incrementais, com exemplos e dicas de como definir a melhor estratégia conforme o contexto de cada empresa, projeto e cliente. Quero compartilhar com os alunos um pouco da minha experiência prática de mais de 10 anos aplicando metodologias ágeis e engenharia de software em empresas dos mais diversos setores.

Como surgiu a metodologia ágil e quais são as suas principais características?
Os mais diversos métodos ágeis surgiram há muito tempo. Por exemplo, o conceito de Lean Manufacturing, ou manufatura enxuta, já era utilizado pela montadora japonesa Toyota logo após a Segunda Guerra Mundial, em 1950. Um dos métodos ágeis mais utilizados atualmente no mundo, que é o Scrum e suas práticas, começou a ser testado em 1986 e ganhou visibilidade no formato atual a partir da publicação de um trabalho dos consultores americanos Ken Schwaber e Jeff Sutherland, em 1995. Ao longo dos anos, esses métodos, suas práticas e técnicas foram testados e aprimorados, bem como novos métodos foram criados. Então, em 2001, um grupo de 17 consultores e criadores de alguns métodos ágeis se reuniram para compartilhar suas experiências e formas melhores de desenvolver um software, surgindo assim o Manifesto Ágil.

O que foi esse Manifesto Ágil?
Foi uma declaração de valores e princípios para ajudar no desenvolvimento ágil de um software. O manifesto contém quatro valores e 12 princípios, que expressam claramente o que rege os métodos ágeis. Esses valores são: 1) Os indivíduos e suas interações, mais do que processos e ferramentas; 2) O software em funcionamento, mais do que uma documentação abrangente; 3) A colaboração com o cliente, mais do que a negociação de contratos; 4) Responder a mudanças, mais do que seguir um plano. Esses princípios destacam a importância das relações e interações humanas, bem como a entrega incremental de partes do produto funcionando, com foco na melhoria contínua, na constante interação, na aproximação e validação com o cliente e na importância de ser capaz de responder às mudanças rapidamente, sempre buscando a entrega de valor para o cliente.

Por que as duas características que vão ser estimuladas em suas aulas — agilidade e eficácia — são importantes no trabalho de um cientista da computação?
Vivemos hoje em um mundo com algumas características VUCA (volatile, uncertain, complex, ambiguous), ou seja, volátil, incerto, complexo e ambíguo, mas cada vez mais alinhado ao conceito de mundo BANI (brittle, anxious, non-linear, incomprehensible), isto é, frágil, ansioso, não linear e difícil de compreender. Nesse ambiente, parte dos modelos de negócio terá de sofrer uma disrupção para sobreviver. Consequentemente, esses negócios precisam ter a capacidade de se adaptar rapidamente de acordo com as demandas de seus clientes. Nesse mundo conectado em rede e com os novos modelos de negócios necessários para atendê-lo, a tecnologia será um de seus pilares, seja na forma de software, seja na forma de hardware. Por um lado, vamos precisar entregar softwares eficazes que suportem a crescente transformação digital e automatização. Por outro, nosso cotidiano será cada vez mais dependente de hardware e software conectados, fornecendo produtos e serviços para as mais diversas atividades em uma sociedade que o Japão chamou de sociedade 5.0 — ou seja, centrada no usuário, voltada cada vez mais para melhorar a qualidade de vida, alinhada aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, respeitando os princípios de ESG e gerando um impacto de tamanhos inimagináveis, uma vez que trocamos informações instantaneamente e cada vez mais sujeitos a eventos adversos com impacto global.

Nessa nova sociedade, onde entram os cientistas da computação?
As decisões desse mundo com potencial de gerar impacto na vida das pessoas e no futuro do planeta irão passar cada vez mais por softwares. Elas serão baseadas em informações coletadas de volumes gigantescos de dados registrados por sensores, gerados por humanos e por máquinas. Nesse ambiente, é fundamental que as pessoas que irão pensar, planejar e codificar essas soluções desenvolvam constantemente novas habilidades. Por isso é indispensável essa combinação, entre ser ágil e conseguir se adaptar rapidamente, por exemplo, a eventos adversos, mas sem perder a capacidade de produzir um software com a qualidade necessária para a resolução eficaz desses desafios e problemas, entregando valor ao cliente final.

A metodologia ágil deixou de ser exclusiva de profissionais de tecnologia e passou a ser utilizada em várias outras áreas. É um modismo ou a metodologia é realmente versátil e aplicável em diversas atividades?
Considerando que já se passaram 20 anos desde o lançamento do Manifesto Ágil, bem como o aumento substancial do uso das metodologias ágeis em empresas de renome no mundo inteiro, podemos afirmar que ela deixou de ser um modismo para, de fato, mostrar ser capaz de agregar valor aos projetos e às empresas, com resultados mensuráveis e comprovados. A partir do sucesso e dos benefícios alcançados na indústria de software, essas ferramentas passaram a ganhar visibilidade em outros setores da própria indústria de software e em outras áreas de negócios. Realmente, as metodologias ágeis têm se mostrado eficientes para uso nos mais diversos cenários e em diferentes níveis de complexidade.

Que resultados alcançaram algumas dessas empresas que utilizam metodologias ágeis?
O mais recente VersionOne, um dos principais relatórios da área de metodologias ágeis, destacou que a adoção de metodologias ágeis pelos times de desenvolvimento de software no mundo aumentou de 37% em 2020 para 82% em 2021. O relatório apontou também que essas metodologias estão sendo adotadas por diferentes áreas das organizações, como operação, marketing, segurança, recursos humanos, vendas e finanças. Isso mostra que, mesmo em empresas de TI, as metodologias ágeis vêm sendo utilizadas nos mais diversos setores. Além disso, há diversos relatos de organizações, das mais variadas áreas, que têm adotado metodologia ágeis. Alguns exemplos são a Nasa e a GE (aeroespacial), a Roche e a AstraZeneca (farmacêutica), a Rolls-Royce (automobilística), o Nubank (financeira), a Lego (brinquedos) e a Cisco (tecnologia). Milhares de outras empresas ao redor do mundo relatam os benefícios de utilizar metodologias ágeis, como a gestão da priorização de mudanças, o alinhamento entre os times técnicos e de negócio, a melhoria na velocidade de entrega, o aumento do moral do time e da produtividade, entre outros resultados. Portanto, ao longo dos anos, as metodologias ágeis têm se mostrado eficazes para que os projetos consigam se ajustar às mudanças repentinas do mercado, bem como às necessidades dos clientes.

 

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