O mercado está em um momento de profunda transformação, exigindo condutas éticas e transparentes das empresas e de seus representantes independentemente da posição ocupada na cadeia produtiva. Diante dessa mudança, as empresas precisam se adequar às legislações e regulamentações vigentes, fazendo a gestão integrada de riscos e evitando danos de reputação e impactos financeiros que possam comprometer a perenidade do negócio.
O compliance é parte da governança corporativa e, basicamente, é um conjunto de regras, padrões e procedimentos éticos e legais que deve orientar o comportamento da empresa e de seus empregados. Mas especialistas defendem que o compliance deve ir além dessa definição inicial. “É um mecanismo preventivo e um instrumento para criar, manter e atualizar a cultura da organização, alinhando os valores éticos dela”, explica a professora de Governança Corporativa e Compliance do Insper, Pâmela Roque.
Pesquisa mede a maturidade no assunto
A segunda edição da pesquisa Maturidade do Compliance no Brasil, realizada pela KPMG, mostra que o país tem um longo caminho a ser percorrido: apenas 58% das empresas entrevistadas têm mecanismos de gestão de risco de compliance e 42% não possuem sistemas de monitoramento da efetividade desses mecanismos.
A professora afirma que a maturidade será alcançada quando todos os envolvidos entenderem a realidade brasileira, que é de um país em crise – política e economicamente falando -, com diversidade nos modelos de negócios e no perfil dos próprios empresários.
“Os Estados Unidos, por exemplo, é uma referência nesse assunto, porém não dá para copiar e aplicar o modelo americano em um país com as peculiaridades do Brasil, inclusive com leis trabalhistas tão específicas”, diferencia a especialista.
Outro dado que chama atenção é que 99% do total das 6,4 milhões de empresas que existem no Brasil são micro e pequenas e elas geram 52% dos empregos com carteira assinada no setor privado.
“Somos incipientes, sem profissionalização e com um processo ainda custoso. Por isso, é preciso desenvolver políticas que atendam à realidade das MPEs para que elas também tenham governança corporativa e criem as próprias políticas de compliance”, defende Roque.
Debate aponta caminhos
O compliance tem ganhado cada vez mais espaço nas discussões após escândalos internacionais e nacionais, como Mensalão e Lava Jato, com envolvimento de empresas e de seus representantes em diferentes cargos em crimes de lavagem de dinheiro, caixas dois e fraude.
Os profissionais de Direito e Administração estão mais próximos ao tema e se tornaram estratégicos para o fortalecimento desta cultura de compliance nas organizações, tendo inclusive que rever o que foi aplicado até então. O tema pautou o II Congresso Nacional ABD&A, realizado nos dias 8 e 9 de novembro no Insper, com a participação de especialistas.
Internamente, as empresas podem seguir alguns passos:
– revisar processos para assegurar que as políticas, normas e práticas internas estejam em conformidade com o que a lei e as regulamentações estabelecem;
– conhecer com quem a organização se relaciona, implantando programas para conhecer clientes, colaboradores, parceiros comerciais e fornecedores;
– ir além da análise técnica ao avaliar um fornecedor, conhecer as suas práticas produtivas, como a origem de suas matérias-primas, sua conduta comercial e a idoneidade dos seus sócios e administradores.
“Criamos compliance ‘para inglês ver’, ou seja, sem mudança de cultura empresarial. É preciso ter regras claras em todo o processo, desde o envio de documentos para a Procuradoria-Geral da República e um cronograma de trabalho”, aponta o advogado Alexandre Wunderlich, do escritório Alexandre Wunderlich Advogados.
“Quando pensamos nos riscos que as empresas estão expostas estamos pensando em governança. Temos novas fronteiras para refletir, inclusive, sobre como estabelecer políticas claras de conformidade sobre como se dará a relação público e privado”, indica o advogado Otávio Yazbek, que é do escritório Yazbek Advogados e monitor independente no caso Odebrecht.
A principal solução apontada por especialistas é o movimento de associações representativas na criação de critérios pertinentes para cada setor, assim como há no mercado financeiro através do Banco Central e da Comissão de Valores Mobiliários.