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Orgulho Gay: a luta por um mercado de trabalho mais inclusivo

Poder ser quem é sem medo de represálias ainda é desafio para a inclusão efetiva das pessoas LGBTQIAP+ no mercado de trabalho

Poder ser quem é sem medo de represálias ainda é desafio para a inclusão efetiva das pessoas LGBTQIAP+ no mercado de trabalho

Felipe Cyrillo
Felipe Cyrillo, diretor de growth marketing na empresa de tecnologia Smilink

 

Bárbara Nór

 

Quando Felipe Cyrillo, 31, começou a graduação em Economia no Insper, em 2012, sua vontade era de um dia trabalhar no mercado financeiro. Mas, na metade do curso, ele acabou desistindo da ideia. Não por falta de interesse pelo tema, mas por causa dos relatos de um ambiente preconceituoso e machista que ouvia de outros colegas e profissionais da área. “Foi difícil porque era algo de que eu gostava muito, mas, quando comecei a conversar com pessoas do mercado, pensei que não iria me sujeitar àquele ambiente”, diz Cyrillo.

Ele conta que ouvia como o mercado era tóxico e homofóbico de colegas próximos, inclusive do próprio namorado da época. “Eram lugares em que as pessoas precisavam anular a personalidade para ter uma chance de carreira.” No fim, Cyrillo acabou decidindo mudar para o curso de Administração e enveredar para o Marketing, área que sentiu que seria mais acolhedora. Hoje, ele é diretor de growth marketing na Smilink, empresa de tecnologia voltada para ortodontia.

Para Cyrillo, embora ainda haja muito a ser feito, a situação agora é diferente. “As empresas e pessoas estão falando mais sobre o tema da inclusão LGBTQIAP+. Entendo que há um interesse real em fazer a coisa mudar.” E isso, em grande parte, se deve à luta do movimento gay. A própria história de Cyrillo é um exemplo disso. Na época em que estudava, o ambiente da faculdade era bem diferente, ele conta. “Tínhamos muito poucos gays assumidos, eu era um dos únicos”, diz. “Não havia tanta visibilidade das pautas de diversidade.” Como resposta, ele e outros colegas começaram a se juntar a grupos de pessoas LGBT de outras faculdades de São Paulo para organizar encontros, festas e eventos.

Logo a iniciativa fez com que mais pessoas se sentissem confortáveis em se assumir, e Cyrillo percebeu que estava longe de estar sozinho na faculdade. Foi aí que surgiu a ideia de montar um grupo do Insper dedicado à pauta, o Inspride — o nome foi ideia do próprio Cyrillo. “Naquela época, ele era mais um grupo de conversa, para trocarmos ideia de como estávamos passando e nos apoiar”, diz. Hoje, o Inspride é um coletivo consolidado, com iniciativas de conscientização e acolhimento para a comunidade do Insper, e parte de um ecossistema maior voltado para tornar a faculdade um ambiente mais diverso, com a Comissão de Diversidade, Equidade e Inclusão.

Já Cyrillo continua levantando o tema por onde passa, em especial desde que começou a assumir posições de liderança. “Em toda empresa que eu entro, se não existe um comitê de diversidade eu começo a conversa para estruturarmos, vendo quem se interessa para montar um primeiro grupo de afinidade”, afirma. “Busco muito usar essa posição que alcancei para fazer com que outros não tenham que passar pelo que passei no começo da minha carreira.”

Segundo Cyrillo, tanto empresas menores quanto as maiores podem e devem ter programas voltado para a diversidade e inclusão. “Quando falamos de empresas pequenas, o principal é ter uma cultura aberta a feedback”, diz. Isso permitiria que as próprias pessoas pudessem ensinar umas às outras sobre quais comportamentos podem ser excludentes e ofensivos, por exemplo. “Ninguém é obrigado a nascer sabendo. O importante é ter um ambiente seguro em que as pessoas possam se questionar e sem ficar na defensiva.” Já empresas maiores podem fazer mudanças importantes com investimento adequado, como criar programas específicos de vagas afirmativas e de aceleração de carreira, além de grupos de afinidade e cartilhas de diversidade.

Como líder, não só ele procura incentivar essa transformação, como também ser um exemplo para outros profissionais mais jovens — algo que ele não teve. “No começo eu era gerenciado por homens brancos, cis, héteros, de alta renda, sem nenhuma deficiência”, diz. “Eu me convencia de que queria chegar apenas até o nível de especialista ou baixa liderança, porque a imagem que tinha era que quem chegava ao topo da gestão precisava se anular de alguma forma para fazer parte do padrão.” E, ele diz, sem poder ser autêntico, dificilmente se constroem relações significativas — algo essencial para a carreira gerencial. “Você também vai neutralizando seu potencial de criatividade e acaba entregando muito menos do que poderia”, afirma.

Para Cyrillo, estar em uma posição de liderança hoje é a chance de poder mostrar para outras pessoas que elas têm outras opções. “Eu não tinha referências e passei por muitas situações sem entender que aquilo não precisava ser a minha realidade”, diz. “Hoje parece fácil falar, mas busco mostrar que você não precisa tolerar esse tipo de coisa, e as empresas precisam perceber que elas vão perder talentos se não investirem no que é necessário.”

 

David Palácio
David Palácio, community manager no Insper

 

Por que é importante ter uma liderança mais diversa

No caso de David Palácio, community manager no Insper e membro da Comissão de Diversidade, Equidade e Inclusão, a importância da representatividade na liderança foi algo que ele sentiu na pele logo no começo da carreira. Em um de seus primeiros empregos, em uma unidade do Sesc, ele trabalhou com um gerente que era gay assumido. “Eu nunca tinha tido uma liderança com pessoa LGBTQIAP+ e foi muito importante”, diz. “Ele trouxe muitas oportunidades para mim e era uma referência de como eu poderia ser gay e liderar.”

A experiência contrastava com o que Palácio vivia naquela época na graduação de Filosofia, que cursou em uma faculdade cristã. “Era um ambiente muito fechado.Havia pessoas LGBTQIAP+, mas elas não se posicionavam, e isso me incomodava”, diz. Mas, assim como Cyrillo, se anular para poder se encaixar foi algo que Palácio se recusou a fazer. “Eu não conseguiria ficar em um lugar onde eu não me sinta bem, nem compreendido do jeito que sou.”

Ele lembra, no entanto, que nem todos podem fazer essa escolha. “Muitas pessoas precisam se submeter a diversas situações constrangedoras, esconder sua personalidade, a sua própria família, o que é muito triste”, diz. Por outro lado, conta Palácio, a importância de se afirmar foi algo que ele também foi aprendendo ao longo do tempo, desde que se assumiu para a família, aos 15 anos. “Eu percebi que, se me calar, não vou me sentir bem, e foi uma grande conquista poder me posicionar em todos os lugares.”

E viver a diversidade, para Palácio, envolve que ele mesmo entre em contato com diferentes realidades. É por isso que, no Insper, ele participa da Comissão de Diversidade, Equidade e Inclusão. “Fazer parte da comissão é importante também para eu criar uma conexão com outros grupos”, observa. “Acesso comunidades que eu não acessaria estando apenas na minha função.”

Isso ajuda também, comenta, na sua própria atuação como community manager no Hub de Inovação do Insper. “É importante que eu tenha essa abertura para a diferença, diversidade e inclusão, para que cada membro da minha comunidade seja compreendido na sua individualidade e em como faz a diferença no negócio e na sociedade.”

Ele procura também promover negócios de impacto LGBTQIAP+ e mostrar como empreender com diversidade em mente é fundamental. “Principalmente hoje, não dá para dissociar o que você é do seu trabalho, está tudo conectado”, diz. “Muitas pessoas esperam que a gente não se exponha, mas nesse caso isso significa não viver, não cultivar o que você tem de próprio.”

Segundo Palácio, as empresas estão muito mais receptivas para o tema do que há pouco mais de uma década, quando ele começou a trabalhar. Mas, critica, ainda existe muito “pinkwashing” nas empresas. “Muitas promovem a causa da diversidade no discurso, mas, na prática, faltam ações práticas”, afirma. Por exemplo, cita, não têm banheiro multigênero, não têm comissão de diversidade cuja participação esteja incluída na carga horária dos funcionários, nem incluem casais homoafetivos em benefícios como licenças-maternidade ou paternidade e plano de saúde.

Outras políticas fundamentais seriam campanhas de sensibilização que convidassem de fato as pessoas protagonistas das causas e a criação de vagas afirmativas. “Se você não tiver essas contratações intencionais, o natural é o status quo continuar”, diz Palácio. “Então é importante trazer as cotas porque você dá possibilidade para pessoas muito talentosas e promissoras no ambiente e vai garantindo que a igualdade se amplie com o tempo.”

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