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Wealth planning e empresas familiares: é preciso se preparar

Como a Medida Provisória 1.171/2023 pode afetar o planejamento patrimonial e os investimentos no exterior das famílias empresárias

Como a Medida Provisória 1.171/2023 pode afetar o planejamento patrimonial e os investimentos no exterior das famílias empresárias

 

Daniel Tregier e Fabio Lago Meirelles*

 

Em 30 de maio de 2023, foi publicada a Medida Provisória nº 1.171/2023, que mudou as regras de tributação dos investimentos no exterior. A alteração da legislação pode ter impacto para empresários, executivos e famílias empresárias que costumam ter patrimônio e investimentos no exterior.

Embora a Medida Provisória tenha efeito imediato e força de lei, ela ainda precisa ser aprovada pelo Congresso (Câmara dos Deputados e Senado) em um prazo de 60 dias, prorrogável por mais 60 dias.

Mesmo que seja necessária sua aprovação pelo Congresso, a MP já traz relevantes alterações para quem possui ativos no exterior e, mais uma vez, atesta a importância de ter uma planejamento patrimonial e sucessório adequado para as famílias empresárias.

Em resumo, serão afetados os residentes fiscais brasileiros que tenham conta em nome da pessoa física com investimentos no exterior, os detentores de ações de companhias offshore em paraísos fiscais (ou fundações privadas, fundos privados ou entidades despersonalizadas) que realizam investimentos e os instituidores e beneficiários de trusts. As principais alterações seriam as seguintes:

 

Para os detentores de empresas offshore

O efeito prático no caso das empresas offshore seria a tributação dos lucros de 15% a 22,5% (com uma faixa de isenção de até RS 6.000,00).

Rendimentos anuais

Até R$ 6.000,00 – 0%

De R$ 6.000,01 até R$ 50.000,00 – 15%

Acima de R$ 50.000,00 – 22,5%

Os lucros até 31/12/2023 seguiriam a regra anterior, ou seja, seriam tributados apenas se houvesse redução de capital/distribuição de lucro. No entanto, a lei possibilitou levantar o valor presente e tributar com uma alíquota de 10%, o que poderia ser vantajoso em relação a tributar esse valor, no futuro, pela regra nova. No caso da opção por essa alternativa, o tributo deverá ser pago até o dia 30/11/2023.

Com a nova regra, os lucros apurados a partir do ano que vem (1/1/2024) serão tributados anualmente na DAA (Declaração de Ajuste Anual). Os prejuízos, a partir de 1/1/2024, poderão ser compensados com os lucros.

A variação cambial do valor principal aplicado na offshore será tributada apenas quando houver, efetivamente, uma devolução de capital para a pessoa física residente no Brasil (ex: quando houver redução de capital). A regra será do ganho de capital na regra atual — alíquotas de 15% a 22,5%. O cálculo deverá ser feito pela média ponderada dos aportes.

Quanto às empresas offshore que detenham participação em empresas no Brasil, os lucros da empresa no país não seriam computados para fins da tributação a que se refere a Medida Provisória.

 

Para os detentores de investimentos na pessoa física

As “Aplicações Financeiras” mencionadas na MP são as famosas contas (remuneradas) e investimentos no exterior realizadas diretamente por meio da pessoa física.

Sendo assim, os rendimentos gerados por essas contas e investimentos, a partir de 1º de janeiro de 2024, deverão ser tributados na forma do artigo 2º da MP, ou seja, de forma separada dos demais rendimentos e dos ganhos de capital, na Declaração de Ajuste Anual (DAA).

Os rendimentos serão tributados de acordo com as seguintes alíquotas:

(i) 0% sobre a parcela anual dos rendimentos que não ultrapassar R$ 6 mil;

(ii) 15% sobre a parcela anual dos rendimentos que exceder R$ 6 mil e não ultrapassar R$ 50 mil; e

(iii) 22,5% sobre a parcela anual dos rendimentos que ultrapassar R$ 50 mil.

É importante destacar que o cálculo para aferição do quantum devido deve ser escalado entre as faixas acima.

 

Para os instituidores ou beneficiários de trust

Os bens e direitos do trust são considerados como:

(i) patrimônio do instituidor (settlor) após criação do trust;

(ii) patrimônio do beneficiário no momento da distribuição pelo trust para o beneficiário ou do falecimento do instituidor (settlor), o que ocorrer primeiro.

A MP não distingue os trusts revogável e irrevogável.

O trust é entendido como transparente para fins de tributação. Significa dizer que, se houver a vinculação a uma offshore, seguirá as novas regras de tributação da offshore. Por outro lado, se houver uma conta de investimentos diretamente vinculada ao trust, será tratado nas regras da conta remunerada / investimentos por meio da pessoa física.

A distribuição pelo trust ao beneficiário é considerada doação (quando intervivos) ou sucessão (causa mortis). Dessa forma, sobre a distribuição serão aplicadas as regras estaduais do imposto de doação e transmissão causa mortis (ITCMD, ITCD ou ITD) — §3.º do artigo 7º da MP.

Os bens e direitos do trust, a partir de 1º de janeiro de 2024, deverão ser declarados, independentemente da data da sua aquisição, em relação à data-base de 31 de dezembro de 2023, diretamente pelo titular na DAA, pelo custo de aquisição.

 

O que realmente muda com a nova legislação

O ponto fulcral de alteração proposta pela MP nº 1771/23 é a extinção do diferimento no pagamento dos tributos em investimentos no exterior, vindo ao encontro das normas internacionais antielisão da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). As regras CFC (Controlled Foreign Corporation) da OCDE têm como objetivo combater o diferimento tributário, ou seja, a prática de pessoas ou empresas de adiar o pagamento de impostos sobre lucros gerados em outros países com impostos mais baixos. Essas regras ainda faltavam no Brasil, causando, positiva ou negativamente, insegurança jurídica — na exata medida em que cada movimento havido em companhias offshore e fundos privados, distribuições de trusts e fundações, eram alvo de severas discussões sobre qual a tributação incidente, já que ausentes os regramentos específicos.

Essas regras foram estabelecidas com base no Modelo de Convenção Fiscal da OCDE e foram incorporadas aos tratados fiscais bilaterais celebrados pelos países membros da organização. As regras CFC determinam que um país pode tributar os lucros gerados por uma empresa em outro país, se essa empresa for controlada por residentes do país de origem e não for tributada no país onde está estabelecida ou pagar uma alíquota de imposto inferior a um determinado limite. Ou seja, a MP nº 1171/23 vem justamente para aplicar as regras CFC para os residentes no Brasil, prestando-se a combater a erosão da base tributária e a transferência de lucros (BEPS, na sigla em inglês).

Natural, como ponto positivo, é a segurança jurídica que essa normatização trará, já que cada movimento havido em estruturas no exterior, estando normatizadas suas hipóteses de incidência, serão realizadas com segurança, trazendo mais confiabilidade ao próprio Sistema Jurídico Nacional.  No mais, é importante dizer que a legislação abriu uma brecha para que o valor de mercado dos bens e direitos e da própria estrutura no exterior sejam atualizados até 30/11/2023 com o pagamento do IR em alíquota definitiva de 10%.

 

Conclusão

Precisamos avaliar ainda como essa questão vai evoluir no Congresso. No entanto, é preciso estar preparado caso a MP seja aprovada e verificar como está o atual planejamento patrimonial familiar e, se não houver um planejamento ainda, começar a pensar a respeito.

 


Daniel Tregier

Daniel Tregier, advogado formado pela FMU/SP e LL.M em Direito Tributário pelo Insper. É responsável pela área de operações internacionais e wealth planning do RSZ&M Advogados.

 

Fabio Lago Meirelles

Fabio Lago Meirelles, advogado formado pela FMU/SP, pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil, LL.M em Direito Penal e Processo Penal, especialista em Planejamento Estratégico pela ADESG/SP (método ESG), em Contabilidade Geral pela FGV e em IFRS pela IACAFM/IBEFAC. Atua na área de operações internacionais e wealth planning do RSZ&M Advogados.

 

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