No Mestrado em Políticas Públicas, Gabriel Caser dos Passos pesquisou a relação entre a habilitação dos prefeitos e a redução de hospitalizações e mortes na pandemia
Leandro Steiw
Municípios que elegeram prefeitos ou prefeitas com formação em STEM (acrônimo, em inglês, para ciência, tecnologia, engenharia e matemática) conseguiram melhores resultados na redução de hospitalizações e mortes por covid-19. Essa foi a conclusão de Gabriel Caser dos Passos em sua pesquisa no Mestrado Profissional em Políticas Públicas do Insper, orientada pelo professor Ricardo Laverde. A dissertação deu origem a um artigo que eles vão apresentar na Druid23, conferência internacional de inovação e dinâmica da mudança, que será realizada em junho, em Lisboa, Portugal.
O êxito no enfrentamento à covid se deu por meio de medidas de intervenção não farmacêuticas, ou seja, por iniciativas como exigência do uso de máscaras, proibição de aglomerações em lugares públicos e restrições no transporte público. Essas medidas contribuíram para diminuir a circulação do vírus nos primeiros meses da pandemia. Embora a pesquisa não possa estabelecer que a formação em STEM é a causa dos melhores resultados naquelas cidades, é possível inferir que os municípios administrados por pessoas com essa formação se saíram melhor no controle da doença.
Na pesquisa, buscou-se controlar outros fatores que justificariam o bom desempenho na pandemia — por exemplo, gênero, quantidade de anos de educação do candidato e filiação política. “Mesmo com todos esses controles, o fato de ele ter estudado em cursos de STEM continuou significante”, diz Caser. “Então, é um indício de que a formação em STEM, de fato, teve impacto. Isso sugere que esses líderes podem ter uma vantagem em situações que exigem tomada de decisão rápida com base em dados e evidências limitados.”
Caser utilizou a metodologia de regressão descontínua para eliminar distorções na amostra de municípios. Foram comparadas apenas as cidades nas quais o candidato venceu o pleito municipal por margem muito estreita de votos, permitindo deduzir que a formação profissional do eleito não foi o motivo determinante da escolha dos eleitores. “Consideramos apenas as eleições que foram apertadas para poder comparar a decisão a um evento quase aleatório, que por qualquer motivo diferente o outro candidato teria sido eleito”, explica.
Na literatura especializada, existem experimentos com startups dirigidas por profissionais que receberam treinamento sobre o método científico. Na comparação com grupos de controle, sem o mesmo treinamento, aquelas empresas conseguiam ganhos maiores no longo prazo. “Ao praticar o método científico de construção, teste e reformulação de hipóteses, a pessoa desenvolve uma forma de pensar que parece ter alguma relevância financeira para os empreendedores”, diz Caser. “Na dissertação, estou testando no contexto político, mas ainda se trata de um gestor que implementa ideias, porém no âmbito público. Então, há embasamento teórico e empírico no que estávamos propondo.”
Modo de pensar
O tema da dissertação surgiu durante as aulas de políticas de inovação e desenvolvimento do professor Ricardo Laverde. “A disciplina trabalhava com esse conceito de ciência, tecnologia, engenharia e matemática”, recorda Caser. “Alguns dados mostravam que havia uma correlação entre o número de profissionais de STEM e desenvolvimento econômico. Comecei a me interessar por essas pessoas, querendo entender um pouco como a formação delas influenciava o jeito que elas pensavam e como elas aplicavam isso fora das suas disciplinas.”
Na opinião de Caser, a multidisciplinaridade é uma qualidade destacável do Mestrado em Políticas Públicas do Insper. “Os professores sempre prezaram por apresentar uma série de temas diferentes, que iam desde educação, saúde e orçamento público até inovação, ciência e tecnologia, para que a gente escolhesse algum tema durante o andamento do primeiro ano”, afirma.
Desde a graduação em Direito, na Universidade de São Paulo, Caser se interessava por políticas públicas, mas também entendia que só os conhecimentos em Direito não dariam conta de criar boas propostas. “Eu precisava saber avaliar se uma política pública era boa ou não”, conta. “Por isso, fui me especializar e estudar outras áreas mais ligadas à Economia. O mestrado do Insper convergia para o meu interesse. É um curso com uma pegada mais quantitativa, mas também com um enfoque na criação de políticas públicas.”
O aprendizado adquirido com a pesquisa insere-se em uma das premissas de Caser. “Você cria uma forma de pensar de acordo com os assuntos que estuda e as pessoas com quem convive, que se torna relevante para outros contextos”, diz. “O mestrado me ajudou a criar uma forma de pensar diferente, mais ligada a dados e à evidência científica, mas sempre considerando que o dado só conta um lado da história. É importante ouvir as pessoas e também embasar, em pesquisas qualitativas, o que se encontra nos resultados quantitativos. Acho que o mestrado me deu essa experiência.”
Ele prossegue: “Uma vez, um amigo me falou que, no final das contas, o que importa são as pessoas. Então, as pessoas que conheci no mestrado e os amigos do doutorado que conheci na sala de estudos me fizeram enxergar o mundo de outra forma. Acho que, se não fossem essas pessoas, eu não teria nem me desenvolvido, nem conseguido criar um tema que, para mim, foi tão relevante”.
Na conferência em Portugal, Caser e Laverde poderão apresentar o artigo acadêmico que nasceu da dissertação e trocar ideias com outros pesquisadores da área de inovação. Depois que concluiu o mestrado no Insper, o ex-aluno começou a trabalhar, em regime remoto, com o professor Haishi Li, da Universidade de Hong Kong, e com o economista Gustavo Souza, do Federal Reserve de Chicago. “Estamos pesquisando como as profissões são impactadas pela introdução de softwares que executam a mesma função no mercado de trabalho”, diz Caser.