Os professores Andrea Minardi e Bruno Aranha conversaram sobre os desafios que o Brasil deve enfrentar para participar do crescimento sustentável
Leandro Steiw
A transição para a economia verde é um dos maiores desafios mundiais e uma janela de oportunidades para o Brasil. Esses temas delinearam a conversa entre Andrea Minardi, professora senior research fellow do Insper, e Bruno Aranha, sócio-fundador da gestora YvY Capital e ex-diretor de crédito produtivo e socioambiental do BNDES. O encontro ocorreu em 18 de outubro e foi uma apresentação do curso “Finanças para transição verde: equity, dívida e blended finance”, promovido pelo Insper.
O bate-papo, disponível neste link, partiu da premissa de que os países precisam migrar de uma economia focada em combustíveis fósseis e com grande desigualdade social para uma economia circular baseada na preservação da biodiversidade, neutra em emissão de gases de efeito estufa e com maior justiça e inclusão social. Conforme Andrea Minardi, as discussões que começaram no Protocolo de Kyoto, em 1997, avançaram em ações como o Pacto Global, que alinhou as empresas em 2000, e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU), em 2015.
Inevitável, a transição verde é bastante cara e exige formas inovadoras de financiamento. “Vamos precisar rapidamente avançar para 5 a 6 trilhões de dólares anuais de investimento, que atualmente estão por volta de 1,5 trilhão de dólares”, disse Aranha. Ou seja, o volume precisa quadruplicar. No entanto, ainda é um valor pequeno em um mercado de 100 trilhões de dólares de bonds, os títulos de dívidas negociados internacionalmente, comparou o professor.
Com características naturais especiais, o Brasil pode exercer papel importante na transição. A matriz elétrica do país é composta por fontes renováveis, 75% fornecida por hidrelétricas e usinas eólicas e solares. Um dos desafios é avançar para a fase do hidrogênio, que o mundo todo está buscando. “O hidrogênio é uma forma de encapsularmos essa energia e exportarmos para o mundo”, afirmou Aranha. “Podemos encapsular também por intermédio da produção de materiais básicos, aço e outros industrializados, trazendo as cadeias de supply chain para o Brasil. Via de regra, produzir no Brasil é mais limpo do que no resto do globo.”
A professora Andrea lembrou o potencial de o agronegócio tornar-se sustentável. “O Brasil tem seis biomas e 58% do território é coberto por florestas, mas a taxa de desmatamento ainda é muito alta”, disse. “Para manter a floresta em pé, é preciso dar alternativa econômica para as populações locais e desenvolver projetos com elas. As questões ambiental e o social estão muito ligadas. Se não resolvemos uma, a outra piora também.”
Para Aranha, a produção de biocombustíveis oferece uma miríade de oportunidades para o Brasil, que incluem desde o etanol até o biometano, o combustível sustentável de aviação (SAF) e o diesel verde. Na produção de alimentos, há ainda espaço na transição para os bioinsumos e a agricultura de precisão — na qual usam-se os insumos na medida do necessário. “Há de 50 a 100 milhões de áreas degradadas e subtilizadas que podem ser usadas sem precisar aumentar a fronteira agrícola, mas precisamos trazer outros investimentos para o setor, além dos que já existem”, afirmou Aranha.
Ele deu outros exemplos de agregação de valor para a floresta conjugados a preservação e desenvolvimento econômico e social: concessão de áreas públicas para desenvolvimento sustentável capitaneado pela iniciativa privada; turismo de parques (que, nos Estados Unidos, representa 2% do PIB); concessão de florestas para projetos de carbono florestal; produção dos chamados superfoods (açaí, castanha, cacau); e bioeconomia para produção de cosméticos e medicamentos.
A solução para mover a agenda da transição verde deve articular corporações, investidores financeiros, setor público, academia e terceiro setor, entre outros, disse Aranha. Financiamento proveniente de arranjos de blended finance, que combinam recursos públicos, privados e filantrópicos, é uma das alternativas discutidas na academia e no mercado financeiro. “Existem diferentes arranjos de blended finance para apoiar esses projetos desafiadores”, observou Aranha. “O capital precisa encontrar os bons projetos, além das questões regulatórias, da cadeia de fornecimento estável, do horizonte de tempo de segurança jurídica e dos talentos profissionais.”
Capaz de impulsionar a outro patamar de competitividade mundial, a transição verde deve sempre pensar o Brasil como um país em desenvolvimento, concordaram Andrea e Aranha. Isso significa considerar a geração de emprego e renda, a diminuição da desigualdade e a criação de oportunidades locais de trabalho.