A boa notícia é que o Brasil já conhece o caminho para crescer com sustentabilidade, desde que invista em políticas públicas
Leandro Steiw
O Brasil conhece os caminhos para reduzir o desmatamento e pode crescer sem perder o rumo dos desafios climáticos. Mas o protagonismo do agronegócio continua acalentando polêmicas, conforme se viu no painel “O desafio de expansão do agro com preservação ambiental”, parte das comemorações dos cinco anos do Centro de Gestão e Políticas Públicas (CGPP) do Insper.
Debateram o tema Marcos Jank (coordenador do centro Insper Agro Global), Izabella Teixeira (ministra do Meio Ambiente de 2010 a 2016), Paulo Hartung (presidente da Indústria Brasileira de Árvores e ex-governador do Espírito Santo) e André Nassar (presidente executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais). A mediação foi de André Lahóz Mendonça de Barros, coordenador executivo de Marketing e Comunicação do Insper.
O Brasil já conseguiu reduzir a taxa anual de área degradada, principalmente no período de 2004 a 2014. A taxa só voltou a crescer a partir de 2014, agravando o problema do uso da terra no Brasil — 28% do território é usado pela agropecuária, enquanto 66% é vegetação nativa. Para Marcos Jank, mesmo que hoje o desmatamento seja inferior a outros períodos históricos, as pressões no Brasil mudaram de patamar. Ele disse que, se anteriormente eram de legislação brasileira, a tensão se tornou internacional. “O desmatamento afeta a reputação do país e a capitalização das empresas brasileiras, embora ainda não atinja o comércio internacional”, afirmou Jank, reforçando o “ainda”.
Jank disse que, em relação às mudanças climáticas, a agropecuária brasileira é ao mesmo tempo vilã (porque desmata), vítima (porque sofre os efeitos dos eventos extremos) e solução (porque pratica programas de redução das emissões de carbono, integração entre lavoura e pecuária e de conservação e recuperação de áreas). “Se o Brasil resolver o problema histórico de desmatamento, a agricultura tropical moderna brasileira pode ser um grande gerador de créditos de carbono”, disse. Também conta a favor do desenvolvimento do país o fato de metade da matriz energética brasileira ser limpa e renovável.
Três falhas levam ao desmatamento elevado, segundo Jank. “O principal problema está nas terras devolutas, sob controle público, que são um convite para invasão, grilagem e criminalidade”, disse Jank. Os dados indicam que 29% do desmatamento ocorre nessas terras devolutas. O segundo problema é a demora na implantação do novo Código Florestal, que, 10 anos após a sua assinatura, ainda não foi totalmente implementado. Por fim, a lentidão e ineficiência do processo de regularização fundiária, principalmente na Região Norte, onde falta fiscalização contra o desmatamento ilegal.
O engenheiro agrônomo André Nassar defendeu que todas as propriedades que não desmataram depois de 2008, marco do Código Florestal, sejam regularizadas, o que incluiria 95% das propriedades privadas no país na agenda positiva ambiental. Sobrariam 5%, que desmataram depois de 2008, obrigadas a apresentar a autorização de supressão da vegetação para conseguir a regularização. Ele acredita que os planos de mitigação das emissões de carbono não deveriam ser impostos pelos governos, mas apresentados por cada setor produtivo envolvido, que estabeleceria metas e compromissos. “O setor produtivo precisa participar da elaboração das metas, senão vira uma guerra”, disse.
Na opinião da ex-ministra Izabella Teixeira, politicamente o agronegócio não assume os compromissos que deveria no que se refere ao combate ao desmatamento e à priorização à agricultura de baixo carbono, ao se apresentar com diferentes clivagens. “A agricultura é o carro-chefe da vocalização de um país contemporâneo, mas não da maneira como se apresenta hoje politicamente, como um quebra-cabeça com puxadinhos”, disse. Ela disse que o agronegócio tem que buscar uma nova perspectiva, que considere ao mesmo tempo questões de segurança alimentar, climática e hídrica.
Por sua vez, o ex-governador capixaba Paulo Hartung observou que é possível aumentar a produção de alimentos no país sem derrubar uma árvore sequer, caminhando em direção à segurança alimentar. Ele se justificou com um dado apresentado por Jank: o Brasil dispõe de mais de 80 milhões de hectares de terras com algum nível de degradação por uso humano que podem ter um maior aproveitamento produtivo. “Que país tem isso?”, questionou. “Temos vitórias e derrotas, e as derrotas não devem ser empurradas para baixo do tapete. A evolução do agronegócio, vista de maneira macro, é uma vitória do Brasil. Temos de parar de agarrar em trem que deu errado.”
Marcos Jank destacou que um dos objetivos do Insper Agro Global é buscar pontos de comunicação e diálogo que permitam avançar na questão agroambiental, mas que, infelizmente, o diálogo se polarizou não só no Brasil, mas no mundo. “A agenda climática beneficia o Brasil, desde que o país faça a lição de casa, que é combater duramente o desmatamento ilegal e implantar de vez o Código Florestal, dez anos depois da sua aprovação pelo Congresso Nacional”, disse. “Os fatos são positivos e as oportunidades são maiores do que as ameaças. O que falta é política pública.”