O professor Thales Graça Athanásio fala sobre os desafios da inclusão de pessoas negras no meio acadêmico e no mercado de trabalho
Bárbara Nór
“Em todos os lugares que trabalhei, ouvi de muitos alunos que eles nunca tinham tido um professor negro”, diz Thales Graça Athanásio, professor de Cálculo nos cursos de Administração e Economia do Insper, além de especialista em Desenvolvimento de Ensino e Aprendizagem (DEA). “Ouvi isso inclusive de alunos negros, que nunca tinham visto alguém como eles em uma posição como essa.”
Mas, desde o Ensino Médio, Athanásio tinha certeza de que queria dar aula. Na escola, ele não só gostava de estudar, mas também de ajudar os colegas a estudarem, principalmente na véspera de provas. “Achava enriquecedor ver o pessoal entendendo o conteúdo.” O que ele não esperava era dar aula no ensino superior. Até 2015, ele só havia dado aulas para alunos de educação básica. “Foi quando vi o Insper pela primeira vez que me dei conta de como poderia ser dar aula em uma faculdade. Fiquei fascinado pela infraestrutura”, afirma.
Hoje, além do gosto por ensinar, ele também abraçou seu papel como educador no enfrentamento ao racismo. No Insper, ele participa da Comissão de Diversidade, Equidade e Inclusão, atuando na rede de afinidade Raça. Lá, ele busca colocar em questão pontos como a inclusão de pessoas negras no meio acadêmico e no mercado de trabalho. “Temos poucos professores e alunos negros aqui, mas existe uma preocupação em melhorar essa situação”, diz. “Como professor, acredito que a educação é parte dessa mudança toda, que é também uma mudança cultural.”
O desafio, comenta, é que mudanças como essa não acontecem do dia para a noite e exigem um trabalho contínuo. Isso porque situações como a baixa presença de negros no ambiente acadêmico seriam um reflexo da sociedade do Brasil como um todo — que tem o racismo como parte de sua estrutura. “Em um cenário como o nosso, poucas pessoas negras conseguem fazer faculdade — e, quando elas fazem, é pouco provável que elas vão ficar no meio acadêmico”, diz Athanásio. “Falta incentivo para os alunos entrarem na faculdade, mas, principalmente, faltam condições.” Muitos jovens, ele diz, são obrigados a escolher entre trabalhar ou estudar e, diante da necessidade de ajudar a pagar as contas, acabam abandonando os estudos.
“O trabalho maior é assumir que existe um problema e tentar resolver”, diz o professor. “Já trabalhei em lugares que tentaram esconder o que acontece em vez de tentar dialogar.” Assim, como parte da Comissão de Diversidade, Equidade e Inclusão, a rede de afinidade Raça tem promovido rodas de conversa e discussões sobre filmes com diretores convidados. “Queremos trazer essa pauta à tona e conseguir atingir um público cada vez maior.”
No próximo evento, que deve acontecer na véspera do Dia da Consciência Negra, por exemplo, o plano é convidar três pessoas negras — uma mulher, um homossexual e um homem trans para discutir suas vivências e questões como o negro no mercado de trabalho. “Convidamos toda a comunidade do Insper e a ideia é conseguir avançar o debate”, diz Athanásio. “É difícil mudar a sociedade como um todo, mas podemos melhorar os ambientes começando essa discussão.”
Além de seu trabalho na Comissão, ele comenta que acabou desenvolvendo um relacionamento próximo com alunos negros do Insper — que, inclusive, formaram um Coletivo Negro. “Eles estão fazendo um trabalho muito legal e estão bastante engajados. Acabamos trocando muitas experiências”, afirma. Vários desses alunos, conta, acabam relatando situações em que sofreram preconceito ou ouviram coisas inadequadas. “A gente sabe que existe um viés inconsciente e, muitas vezes, pode parecer normal para quem está falando, mas para quem está ouvindo afeta de outra maneira.”
E é por isso, diz o professor, que ter espaços de conversa e de conscientização é tão importante. “As pessoas têm a tendência de achar que colocar uma pessoa negra no espaço vai resolver o problema”, diz. “Mas colocar uma pessoa só vai deixá-la mais estressada. Você não vai mudar a cultura inteira porque colocou uma pessoa negra, uma pessoa com deficiência, LGBTQIAPN+ ou mulher lá dentro.”
Assim, seria preciso trabalhar diversas frentes ao mesmo tempo. Além das iniciativas de inclusão, por meio de dispositivos como cotas e vagas afirmativas, tanto o ambiente deve ser trabalhado para ser inclusivo de fato, quanto as pessoas precisam ter seu desenvolvimento apoiado para crescer na vida acadêmica ou profissional. “É preciso ter um investimento em formação e desenvolvimento pensando no longo prazo.”