Na terça-feira, 11 de fevereiro, foi celebrado o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, uma data instituída pela ONU para reforçar a importância da participação feminina nas áreas de ciência e tecnologia. No entanto, a desigualdade de gênero em STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) continua sendo um problema estrutural no Brasil e no mundo. A falta de referências femininas e a sub-representação das mulheres em posições de liderança impactam suas oportunidades de crescimento, limitando seu protagonismo em descobertas científicas e no desenvolvimento tecnológico.
Segundo um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em 2023, as mulheres representaram 52% dos pesquisadores em ciência e tecnologia no Brasil, mas essa participação está concentrada em ciências da saúde, enquanto engenharia e computação continuam dominadas por homens. No mercado de trabalho, a diferença se torna ainda mais evidente: globalmente, apenas 34% da força de trabalho em STEM é feminina, e no Brasil, as mulheres representam apenas 35% das matrículas em cursos dessas áreas, de acordo com dados da Unesco.
Desde a infância, meninas são desencorajadas, de forma sutil ou explícita, a se interessarem por matemática e ciências exatas. Brinquedos, atividades e expectativas sociais reforçam estereótipos de gênero, associando a ciência a uma aptidão supostamente masculina e incentivando as meninas a seguir carreiras ligadas ao cuidado e às humanidades. Estudos indicam que, por volta dos seis anos de idade, muitas meninas já internalizam a crença de que “ser muito inteligente” é algo mais característico dos meninos. No ensino superior, essa percepção impacta a escolha das carreiras: cursos de tecnologia e engenharia continuam com baixa presença feminina, e a falta de professoras nesses cursos reforça a ideia de que esse ambiente não é acolhedor para mulheres.
No ambiente acadêmico e profissional, os desafios persistem. A falta de representatividade feminina em STEM, associada a preconceitos e à dificuldade de conciliar carreira e vida pessoal, resulta em uma alta taxa de evasão. Além disso, a maternidade se torna um fator crítico na progressão das mulheres na ciência. A produtividade acadêmica é frequentemente medida pelo número e qualidade das publicações científicas, e muitas cientistas enfrentam dificuldades ao precisar conciliar essa exigência com o período da maternidade. Essa realidade reforça barreiras invisíveis que dificultam a ascensão das mulheres na pesquisa e na inovação.
A baixa participação feminina em STEM não é apenas uma questão de equidade, mas também um entrave à inovação e ao desenvolvimento científico. Pesquisas indicam que equipes diversas são mais eficazes na resolução de problemas complexos e contribuem para o desenvolvimento de soluções mais abrangentes e inclusivas. Quando mulheres são sub-representadas em ciência e tecnologia, perde-se a oportunidade de aproveitar perspectivas e talentos fundamentais para avanços em diversas áreas. Além disso, muitas inovações são desenvolvidas sem considerar as necessidades específicas das mulheres, como já ocorreu em áreas como saúde e segurança veicular.
Para ampliar a participação feminina em STEM, especialistas e organizações sugerem diversas estratégias, como estimular o interesse por ciência e tecnologia desde a infância, promover redes de mentoria e modelos femininos, adotar políticas de inclusão e flexibilização no ambiente acadêmico e profissional, criar bolsas e financiamentos específicos para pesquisadoras e fomentar uma mudança cultural ampla. O envolvimento de instituições públicas e privadas é essencial para desconstruir estereótipos e criar um ecossistema mais inclusivo.
Nesse contexto, iniciativas concretas têm surgido para apoiar mulheres em STEM e impulsionar sua presença no setor. Um exemplo é o Women in Tech, programa do Hub de Inovação e Empreendedorismo Paulo Cunha do Insper, que busca promover o desenvolvimento profissional e acadêmico de alunas por meio de mentorias, eventos, workshops e atividades voltadas para a inserção e permanência feminina em carreiras de ciência e tecnologia.
A iniciativa busca não apenas auxiliar as estudantes na escolha de seus caminhos profissionais, mas também criar uma rede de apoio e incentivo para que possam superar desafios e se posicionar com mais segurança no mercado de trabalho. Desde sua criação em 2021, o programa tem evoluído e expandido suas frentes de atuação, impactando diretamente a trajetória acadêmica e profissional de suas participantes.
Com um formato flexível e adaptável às necessidades das alunas, a mentoria tem sido um dos pilares do Women in Tech, proporcionando trocas valiosas entre estudantes e profissionais já consolidadas na área. As mentoradas encontram no programa um espaço para esclarecer dúvidas sobre carreira, desenvolver habilidades e construir uma rede de contatos que pode abrir portas no futuro. Para as profissionais envolvidas, a experiência também é enriquecedora, pois permite compartilhar conhecimento e contribuir para a formação de novas lideranças femininas em STEM.
Outro foco do Women in Tech tem sido auxiliar no desenvolvimento de habilidades técnicas e interpessoais. Além do aprimoramento em áreas como tecnologia e engenharia, as participantes do programa são incentivadas a fortalecer soft skills essenciais, como comunicação, liderança e networking. Ao promover esse ambiente de troca e aprendizado, o programa busca não apenas empoderar as alunas individualmente, mas também contribuir para a criação de um ecossistema mais diverso e inovador dentro das carreiras tecnológicas. Com a expansão prevista para os próximos anos, a iniciativa se consolida como um pilar essencial para a inclusão e o fortalecimento da presença feminina em STEM, preparando futuras líderes para enfrentar os desafios da área com competência e protagonismo.
Entre as iniciativas que têm surgido para fortalecer a presença feminina na ciência e tecnologia, vale destacar também o projeto “Empoderando Futuros: Construindo uma Rede Nacional para Meninas e Mulheres na Área de STEM”, que busca ampliar as oportunidades para mulheres em ciências exatas, engenharias e computação. Financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o projeto reúne pesquisadoras do Insper e de outras 14 instituições brasileiras, com o intuito de promover ações em todas as regiões do país, inclusive fora dos grandes centros urbanos.
Entre as iniciativas estão treinamento de professores, oficinas de pensamento computacional, desenvolvimento de competências empreendedoras, programas de mentoria e rodas de conversa para criar redes de apoio entre alunas. A proposta visa enfrentar não apenas as desigualdades de gênero, mas também as interseccionais, ampliando as oportunidades para mulheres negras, indígenas e periféricas. Com um ecossistema estruturado para apoiar meninas e mulheres, o projeto busca criar um impacto duradouro na inserção e permanência feminina em STEM.
Embora os desafios persistam, iniciativas como essa representam um passo importante na construção de um ambiente mais equitativo para mulheres em ciência e tecnologia. A mudança passa pelo fortalecimento de políticas públicas, pelo engajamento do setor privado e pela criação de redes de apoio que garantam que mais mulheres tenham acesso, reconhecimento e oportunidades reais para crescer e inovar nessas áreas.