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Um instrumento para conhecer o mapa da renda no Brasil

Os convidados da mesa “Superação da Pobreza” identificaram os avanços e as deficiências do Cadastro Único, que define quem recebe os benefícios sociais

Os convidados da mesa “Superação da Pobreza” identificaram os avanços e as deficiências do Cadastro Único

 

Leandro Steiw

 

O Cadastro Único é um aliado importante das políticas públicas de distribuição de renda. Mas há espaço para melhorar a qualidade e o uso das informações que definem quem tem direito a benefícios como Bolsa Família e tarifa social de energia elétrica. O chamado mapa das famílias de baixa renda no Brasil foi tema da mesa “Superação da Pobreza”, do 2º Encontro do CGPP: Políticas Públicas para um Brasil Melhor, do Insper.

Participaram do debate Ricardo Paes de Barros, pesquisador do CGPP, Wanda Engel, consultora do Instituto Synergos no Brasil, Rafael Osório, diretor-adjunto de estudos e políticas sociais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), e Letícia Bartholo, secretária de avaliação, gestão da informação e Cadastro Único do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome. A mediação foi da professora Laura Machado, coordenadora dos programas de pós-graduação em gestão pública no Insper.

Paes de Barros ressaltou a variedade de informações do Cadastro Único, obtidas por meio de um questionário com 100 quesitos e complementada por dois suplementos sobre pessoas em situação de rua e populações tradicionais e específicas. No final da década de 1990, a viabilidade de um cadastro semelhante e de abrangência nacional parecia obra de ficção, afirmou.

Wanda Engel, que trabalhou na criação do cadastro, disse que experiências anteriores de políticas públicas contribuíram para a rápida implantação da primeira versão do instrumento. Ao final de 2002, havia 5,37 milhões de famílias cadastradas – dessas, 3,7 milhões já estavam com cartão bancário – e 93% dos municípios do país dispunham de algum tipo de dado. “Em dois anos, tivemos esse enorme avanço no cadastramento das pessoas”, recordou. “O cadastro permite uma visão das necessidades das famílias, é um orientador de demanda e tem uma função de diagnóstico importantíssima.”

Para Rafael Osório, o Cadastro Único deve ser olhado como um mapa de oportunidades, porque a situação dos pobres é muito heterogênea no Brasil – não se pode comparar a situação da população ribeirinha à das pessoas que vivem em comunidades dominadas pelo tráfico, por exemplo. “Temos informações integradas sobre a renda das famílias que poucos países têm e sistemas melhores que a maioria da América Latina”, disse. “Não precisamos mais perguntar renda formal, porque podemos verificar a declaração de renda das pessoas. Uma das fragilidades do cadastro é a renda informal, que as pessoas não declaram porque, afinal, é uma renda informal e ocultável. Também precisamos saber melhor quem mora com quem, porque os nossos registros de renda são de indivíduos.”

Comparando os programas de distribuição de renda de 20 países latino-americanos, Paes de Barros disse que o Brasil é o único que se baseia na renda familiar per capita declarada. Ou seja, o beneficiário que possui uma moradia popular do programa Minha Casa, Minha Vida é tratado igual à pessoa que vive na rua ou o ribeirinho que mora no barco. “Outros países medem a renda e misturam com outros dados para ter uma medida mais estrutural da pobreza daquela família, porque a renda também flutua bastante”, afirmou. “Se com a informação de renda temos uma focalização, com mais informação usada bem estatisticamente conseguimos fazer tão bem quanto.”

 

Melhorias possíveis

Outras deficiências são mais recentes, resultado da interrupção dos avanços a partir de 2019, segundo Letícia Bartholo. Ela disse que as informações do cadastro permitiram o sucesso do Auxílio Emergencial, durante o início da pandemia de covid-19, em 2020. No entanto, o modo de pagar a transferência de renda para os mais pobres foi alterado nove vezes entre 2020 e 2022. “Nesse contexto de confusão e mudanças, não havia como o auxílio ser conhecido pela população, como era o Bolsa Família”, disse ela.

Os convidados concordaram que há necessidade de melhorar o foco desse sistema de informações sobre a população de baixa renda. Na opinião de Letícia, devem-se revisar os conceitos de composição familiar (baseada em famílias, territórios e domicílios), capacitar os municípios e integrar as informações com outras bases de dados da população. Ela e Wanda comentaram a importância de incentivar a intersetorialidade dentro dos municípios, para que as áreas de saúde e educação possam compartilhar informações sobre famílias pobres com a assistência social.

e incentivar a intersetorialidade dentro dos municípios, para que as áreas de saúde e educação possam passar informações sobre famílias pobres para a assistência social.

Paes de Barros sugeriu ainda que o cadastramento seja feito em visita domiciliar, como forma de entender melhor a pobreza no país. Atualmente, o registro é feito pessoalmente em postos de atendimento. Pesquisas de avaliação sistemáticas, feitas anteriormente pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, seriam bem-vindas em relação à fidedignidade dos dados. “Ajudaria os órgãos de controle a confiar no Cadastro Único”, disse o pesquisador do Insper.

A atualização dos formulários deve ser permanente, atendendo aos desafios do momento. “Quando fizemos o formulário do cadastro de 2010, fome e insegurança alimentar não eram mais uma questão premente e voltaram a ser”, afirmou Letícia. Para ela, a vulnerabilidade da população às mudanças climáticas, diante de eventos extremos cada vez mais frequentes, é outra questão urgente – que, nos formulários de 2010, não era tanto. Letícia resumiu: “Desejamos que o cadastro seja mais cardápio do que prato feito, para que cada programa social escolha como vai fazer a sua seleção e não simplesmente use a renda familiar per capita porque o cadastro quis”.

Em meio a todos os avanços e deficiências do cadastro, Wanda acredita que o objetivo deve ser lastrear um início de programa de desenvolvimento familiar, abrindo às famílias a possibilidade de um projeto de vida. “Temos uma política de assistência social com algumas sementes de política de superação da pobreza”, disse ela. “A saída da pobreza é um passo essencial a ser dado.”

 

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