Celeiro de startups e bem posicionado nos rankings globais de inovação, o país aposta agora em negócios de alto crescimento já testados no mercado
Bruno Toranzo
As startups lidam com a inovação nos produtos ou serviços ou em alguma etapa do seu negócio. São empresas recém-criadas que utilizam largamente a tecnologia, com possibilidades promissoras de crescimento. Em Israel, esses empreendimentos encontraram terreno propício para se desenvolver, a ponto de o país ser chamado de “startup nation”.
O país está hoje na 15ª posição no ranking Global Innovation Index 2021, elaborado pela Organização Mundial de Propriedade Intelectual — e aparece como líder em diversas categorias, como na colaboração entre os setores econômicos para impulsionar a inovação e o gasto público em pesquisa e desenvolvimento (P&D).
No ano passado, o capital levantado pelas startups que atuam no país foi de 25 bilhões de dólares — cerca de 56% desse dinheiro foi captado por empresas que oferecem serviços de software corporativo, cibersegurança e financeiros.
As rodadas de investimento de larga escala estão se tornando comuns, já que 88 foram definidas como megarrodadas no ano passado, com pelo menos 100 milhões de dólares aplicados. O crescimento foi superior a dez vezes em comparação com 2018, o primeiro ano de medição, que registrou sete dessas rodadas. Os números fazem parte do estudo “Annual Innovation Report/State of High-Tech 2022”, produzido pela Autoridade de Inovação de Israel, agência do governo com atuação independente.
“Israel está se tornando agora uma scale-up nation. O pequeno mercado doméstico sempre foi um desafio para as startups chegarem a esse estágio de desenvolvimento. Quando o empreendedor tinha uma startup com solução promissora, optava por vendê-la ou transferir a sede para fora de Israel, como Estados Unidos ou Europa”, diz Charles Kirschbaum, professor e coordenador do Mestrado Profissional em Administração no Insper.
Ele foi um dos docentes que lideraram a Israel Innovation Experience 2022, viagem internacional organizada pelo Hub de Inovação Paulo Cunha para proporcionar aos participantes o entendimento da situação de empreendedorismo e inovação naquele país. “Essa situação começou a mudar no período da pandemia, com a necessidade de adoção do home office, o que demonstrou para os israelenses que a operação pode ser administrada com sucesso a partir de Israel”, diz Kirschbaum. A consequência disso foi que as startups ganharam tempo de maturação em Israel mesmo, e não em outros lugares.
As scale-ups estão em estágio posterior ao das startups. São empresas que crescem de forma escalável, sustentando esse desempenho por um longo período, o que só ocorre se oferecer um produto ou serviço já testado, com viabilidade garantida e aceitação pelo mercado.
De acordo com a OCDE, o clube dos países ricos, para uma empresa alcançar o estágio de scale-up, o crescimento deve ser de no mínimo 20% ao ano por três anos consecutivos. Nem toda scale-up é uma startup, já que esse termo se aplica a todas as empresas que apresentam esse alto desempenho. No Brasil, há exemplos de startups que se tornaram scale-ups, como o app de transporte 99, o iFood e o Banco Inter.
Em Israel, os investidores apostam em scale-ups de quatro segmentos principais: software corporativo, fintechs, cibersegurança e comércio eletrônico, que aparecem nessa ordem nas primeiras posições em termos de alocação de fundos, de acordo com o estudo da Autoridade de Inovação de Israel. A área de software corporativo recebeu 25% desses investimentos. “A liderança de software não surpreende, pois o país tem tradição nessas soluções, com Waze e Wix como exemplos”, lembra Kirschbaum.
Para o professor do Insper, Israel tem enorme potencial também em agrotech pela junção de dois fatores que impulsionam novas soluções: dificuldade em obter água doce, motivo pelo qual domina a tecnologia de dessalinização (processo que retira o sal da água do mar), e desafio para cultivar em terras inférteis, algumas de características desérticas (a razão para isso passa também pela insuficiência de água doce).
Israel faz parte da lista de países considerados referência em alta tecnologia. O país lidera o mundo em pesquisa e desenvolvimento como porcentagem do PIB. Foi inclusive o primeiro a ultrapassar a marca de 5% de investimento. Em 2019, direcionou 5,4% do PIB para P&D. A Coreia do Sul aparece na sequência, com 4,8%, seguida da Suécia e dos Estados Unidos, com 3,5%. Suíça e Alemanha, com 3,1%, França, com 2,4%, e Reino Unido, com 1,7%, completam a lista de países no topo do ranking. A média da OCDE é de 2,7% do PIB em pesquisa e desenvolvimento.
Israel também lidera o ranking mundial de empregados de alta tecnologia em relação ao número total, com 9,5%. Ou seja, de cada cem trabalhadores, quase dez atuam nesse setor. A Irlanda aparece na segunda posição, com 9,2%, seguida da Suíça, com 6,9%, da Finlândia, com 6,6%, da Suécia, com 5,7%, e do Reino Unido, com 5,5%.
O estudo revela que 8% dos trabalhadores de alta tecnologia em Israel são contratados por empresas que se definem startups. A maioria é contratada por empresas maduras, com destaque para aquelas ligadas ao setor militar/defesa, que, por causa da geopolítica conturbada, recebem altos investimentos.
“O que se percebe nesses números é que Israel respira inovação. Por isso, o profissional, para se dar bem no mercado de trabalho, precisa desenvolver habilidades voltadas para empreendedorismo e tecnologia, como inteligência artificial”, diz Kirschbaum. “Para quem empreende, é preciso ter visão global, com objetivo genuíno de abrir um negócio. É diferente da situação observada no Brasil, que está muito ligada ao empreendedorismo por necessidade, ou seja, abrir uma empresa porque não encontra emprego e precisa trabalhar.”