O transporte de passageiros e o delivery por meio de aplicativos já mobiliza 1,6 milhão de pessoas no Brasil, o equivalente à população de uma cidade do porte de Recife (PE). Desse total, 385,7 mil são entregadores, segundo pesquisa realizada pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap). Tal fenômeno vem transformando a vida nas cidades, com impactos econômicos, sociais e urbanísticos.
Conectados por aplicativos e utilizando GPS e sistemas online de troca de mensagens, esses profissionais geram dados diariamente. O iFood, presente em 1.500 cidades brasileiras, processa atualmente 100 milhões de pedidos mensais por meio de um ecossistema formado por 310 mil entregadores conectados. Reconhecendo a importância dessas informações, a empresa agora disponibiliza seu banco de dados para pesquisadores acadêmicos de todo o país através do Centro de Dados e IA do Insper, onde poderão ser acessados dentro das primeiras salas seguras implementadas no Brasil por uma instituição de ensino superior.
A aproximação entre o Insper e a empresa iniciou-se por meio do Centro de Estudos de Cidades | Laboratório Arq.Futuro (Insper Cidades). Como parte dessa interação, em julho, 56 alunos de diferentes cursos – Administração, Ciências Econômicas, Ciência da Computação, Direito e Engenharias – participaram de um curso de férias sobre mobilidade urbana, visitando a companhia para discutir segurança viária e uso de dados.
“A partir dessa aproximação, surgiu a proposta do iFood de compartilhar seus dados; e aí a segurança com que hoje o Insper pode receber esses dados de parceiros foi fundamental”, relata Adriano Borges, coordenador acadêmico do Insper Cidades e que conduziu o curso de julho.
“O iFood é hoje um destacado agente da transformação da vida urbana contemporânea, e poder estabelecer essa parceria reforça a linha de atuação do Centro de Estudo das Cidades | Laboratório Arq.Futuro de trabalhar e fomentar a análise e pesquisa dos complexos desafios do desenvolvimento das cidades a partir do uso de dados e evidências que permitem formulações com maior impacto na sociedade”, diz Tomas Alvim, coordenador-geral do Centro.
Borges ressalta que a segurança viária é um tema central na mobilidade urbana e uma das linhas de pesquisa do Observatório Nacional de Mobilidade Sustentável, que faz parte do Centro de Estudos de Cidades | Laboratório Arq.Futuro. “O número de mortos no trânsito cresceu em São Paulo, e os motociclistas estão entre as principais vítimas dos sinistros que acontecem nas ruas das cidades. Além disso, o setor de entregas em domicílio, em especial de comida, cresceu muito e hoje cumpre um papel muito relevante na logística urbana, na mobilidade e no dia a dia das cidades”, afirma.
Com a parceria, pesquisadores de diversas instituições poderão acessar dados coletados e tratados pelo iFood nas salas seguras do Centro de Dados e IA do Insper. Esses espaços são especialmente projetados para garantir a máxima segurança para acesso a dados sensíveis com finalidade de pesquisa.
Esses ambientes são equipados com tecnologias avançadas e medidas rigorosas de controle de acesso para proteger contra ameaças físicas e digitais. Para acessar tais dados, o pesquisador deve submeter seu projeto de pesquisa no site do centro para avaliação e aprovação — processo do qual participa o parceiro, no caso o iFood.
“Esta parceria, que chegou a nós por intermédio do Insper Cidades, é extremamente importante. Os dados do iFood podem embasar estudos dos mais relevantes”, diz Suelane Garcia, coordenadora técnica do Centro de Dados e IA e Data Protection Officer (DPO) da escola. “Zelamos pela governança, garantindo que todas as questões de sigilo e confidencialidade sejam preservadas. Temos processos, protocolos, toda uma dinâmica estabelecida para contribuir com a comunidade acadêmica, garantindo a segurança para as empresas.”
Com a parceria, pesquisadores acadêmicos poderão solicitar acesso a diferentes agrupamentos de dados. Entre eles se incluem:
1. Telemetria e ganhos
Informações sobre hora trabalhada e ganhos, coletados da tabela interna de telemetria do iFood, que gera dados de latitude, longitude e velocidade a partir dos dispositivos dos entregadores quando eles estão online. A precisão dos dados depende da qualidade do sinal GPS, do tipo de dispositivo e do nível de bateria. Por isso, foi aplicado um filtro para capturar apenas drivers com uma acurácia de 50%.
2. Velocidade média em São Paulo
Dados da velocidade média em rota dos entregadores na cidade de São Paulo. Eles podem ser utilizados para diversas finalidades, incluindo pesquisas sobre a efetividade da Faixa Azul na mobilidade urbana e na eficiência das entregas. Também podem ajudar na tomada de decisões relacionadas ao planejamento e melhoria da infraestrutura viária. E, ainda, contribuir para estudos sobre segurança no trânsito, identificando áreas com maior risco de acidentes.
3. Programa Decola
Informações sobre os entregadores que participaram do programa Decola, uma plataforma de aprendizagem gratuita para entregadores parceiros iFood. Os conteúdos estão divididos em categorias que abordam temas essenciais para o dia a dia de entregas, com o objetivo de gerar mais proveito da plataforma e consequente melhora nas condições de trabalho e ganhos.
4. Programa Meu Diploma do Ensino Médio
Dados sobre o programa Meu Diploma do Ensino Médio (MDEM), uma iniciativa do iFood em parceria com a edtech Termine Seus Estudos e Descomplica. O programa oferece uma bolsa de estudos completa, 100% gratuita, com tutoria, aulas ao vivo e gravadas e suporte via WhatsApp para ajudá-los a se prepararem para a prova do Exame Nacional para Certificação de Competência de Jovens e Adultos (Encceja) e concluir o ensino médio.
No caso das bases de dados do Decola e do MDEM, é viável desenvolver uma série de linhas de estudos. Por exemplo, pesquisadores podem avaliar o impacto do programa na renda, no mercado de trabalho, nas desigualdades educacionais, na mobilidade social e na saúde dos entregadores, além de realizar cruzamentos com bases de dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e da Relação Anual de Informações Sociais (Rais).
É possível também realizar pesquisas longitudinais, estudando a evolução dos entregadores no mercado de trabalho após a conclusão dos programas educacionais. Os pesquisadores podem também desenvolver análises estatísticas de tendências, avaliando o impacto das iniciativas do iFood sobre diferentes demografias, como idade, gênero, região, entre outros. Podem ainda analisar como diferentes grupos de entregadores se beneficiam dos programas, comparando os resultados entre grupos com diferentes características demográficas e socioeconômicas para identificar possíveis desigualdades e áreas de melhoria.