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Saneamento básico em assentamentos informais deve fazer parte de projeto de regularização fundiária e urbanística

Levantamento do Laboratório Arq.Futuro de Cidades identificará as principais barreiras para implantação de serviços como fornecimento de água e coleta de esgoto nas favelas

Levantamento do Laboratório Arq.Futuro de Cidades identificará as principais barreiras para implantação de serviços como fornecimento de água e coleta de esgoto nas favelas

Esgoto a céu aberto em Ilhéus, na Bahia
Esgoto a céu aberto em Ilhéus, na Bahia

 

Bruno Toranzo

 

É extremamente  baixo o índice de acesso ao saneamento básico no país, com cerca de 102 milhões de pessoas enfrentando algum tipo de privação em relação aos serviços desse gênero, revelou um levantamento do Instituto Trata Brasil, que utilizou como base os dados entre 2013 e 2022 da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), realizada pelo IBGE. Ao considerar o número total de 74 milhões de moradias no território nacional, o trabalho constatou que quase 9 milhões não têm acesso à rede geral de água, 17 milhões recebem água em uma frequência insuficiente, 11 milhões não contam com reservatório de água, 1 milhão de moradias carecem de banheiro e 22 milhões não têm coleta de esgoto. Mais:  69,7 milhões de pessoas encontram-se sem acesso aos serviços de coleta de esgoto, sendo que 27% delas situam-se abaixo da linha da pobreza em 2022 (com renda mensal de até R$ 417,45). A maioria das moradias nessas circunstâncias localiza-se nas áreas urbanas (62,7%).

Os assentamentos informais, como as favelas, estão entre os territórios que apresentam maior dificuldade para a efetivação do fornecimento de infraestrutura de saneamento básico. Por isso, o Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper está trabalhando em um estudo que identificará as principais barreiras para o fornecimento desses serviços em tais localidades pelas concessionárias e pelos municípios, que precisam atuar juntos para que os esforços sejam bem-sucedidos.

“A partir daí, queremos construir soluções que possam ser replicadas pelo país, contribuindo assim para o aperfeiçoamento da legislação. Muitas dessas barreiras são desconsideradas na formulação das políticas públicas e surgem no momento da execução dos serviços pelas concessionárias”, diz Victor Carvalho Pinto, coordenador do Núcleo Cidade e Regulação do Laboratório. “Algumas situações que já constatamos são o controle das favelas pelo crime organizado, o abastecimento de água por meio de ligações clandestinas, a ausência de coleta de resíduos sólidos e de drenagem, comprometendo o esgotamento sanitário, a inadequação das tecnologias existentes em favelas de alta densidade, além da insegurança jurídica quanto à propriedade da terra e regularidade da ocupação.”

Segundo Carvalho Pinto, as normas nacionais de referência estão sendo elaboradas agora, e o Insper participa dessas consultas públicas promovidas pela Agência Nacional de Águas, cuja competência foi expandida pelo Marco Legal do Saneamento para incluir o saneamento básico, mediante a edição de normas de referência destinadas a padronizar a regulação dos serviços, que são de competência dos municípios e regiões metropolitanas. “Antes disso, já contribuímos para as normas sobre universalização dos serviços e sobre a matriz de riscos nos contratos de concessão”, destaca ele. Como os assentamentos informais surgem à margem do planejamento urbano, alguns estão em áreas que nunca poderiam ter sido ocupadas porque apresentam risco para os moradores, como deslizamento de terra. Outros comprometem o meio ambiente, gerando poluição da água, o que pode afetar o abastecimento da própria cidade.

Nesses assentamentos, não existe apenas falta de saneamento como também de segurança, educação, saúde, mobilidade, assistência social e demais políticas públicas. A própria configuração do assentamento é um obstáculo às obras de saneamento básico, com vias estreitas e sinuosas, ocupação das margens de córregos e ausência de espaços públicos e de lazer. “É preciso que todos esses elementos sejam estudados para a elaboração de um projeto de regularização fundiária e urbanística. Esse projeto definirá as edificações que serão mantidas e aquelas que precisarão ser realocadas para áreas mais seguras. Também poderá incluir a construção de moradias novas para os moradores de áreas de risco”, ressalta o pesquisador. O saneamento básico deve ser considerado um componente desse projeto, contribuindo dessa forma para a solução definitiva do assentamento. “No modelo vigente, as empresas de abastecimento de água e esgotamento sanitário atuam isoladamente, implantando suas redes por meio da adaptação das obras ao assentamento como ele existe. É uma medida importante como solução emergencial, mas insustentável no médio prazo”, afirma Carvalho Pinto.

 

Boas práticas

Safira De La Sala, coordenadora-adjunta do Núcleo Cidade e Regulação do Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper, explica que é fundamental identificar e compreender as boas práticas do setor — tanto do passado como do presente —, principalmente no que referem aos casos em que os municípios que fizeram a regularização do uso da terra antes das obras de saneamento básico. Para ela, essa é a única maneira de cumprir de modo sustentável e com eficiência as metas estabelecidas pelo governo federal no novo Marco Legal do Saneamento de levar água potável e segura a 99% dos brasileiros e fornecer coleta e tratamento de esgoto a 90% da população do país até 2033.

Um desses casos é o Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus (Prosamim). Nos anos 2000, a capital amazonense sofria com o problema de assentamentos informais nas margens dos igarapés, o que representava risco não apenas para as famílias moradoras desses locais como também para a disponibilidade dos recursos hídricos utilizados pelo município. O programa urbanizou uma área de 340 mil metros quadrados ao longo do igarapé do Quarenta, por meio da retirada de 2.580 famílias daqueles locais.

Safira observa que, ao integrar os assentamentos informais à infraestrutura da cidade, há ainda a questão de possibilitar às pessoas de baixa renda terem condições financeiras de pagar o custo do serviço de saneamento básico por meio da cobrança de uma tarifa social. “Também em Manaus, a própria concessionária criou uma taxa ainda menor do que a social, o Tarifa 10. É preciso que estudemos como essas iniciativas que estão surgindo agora podem ser reproduzidas em outras cidades”, sublinha Safira.

 

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