Encontro do movimento SP+B debateu a busca de soluções para resolver o déficit habitacional em meio à disponibilidade de imóveis vagos em São Paulo
De um lado, famílias sem casas para morar — o déficit habitacional no Brasil era de 5,8 milhões de moradias em 2019, de acordo com os dados mais recentes da Fundação João Pinheiro. De outro lado, casas vazias — são cerca de 11,4 milhões de domicílios particulares desocupados em todo o país, conforme o Censo Demográfico de 2022, divulgado pelo IBGE em junho.
Esse contraste entre a necessidade de moradias e a disponibilidade de imóveis ociosos é ainda mais gritante na cidade de São Paulo. Segundo o IBGE, os imóveis particulares desocupados, vagos ou com uso apenas ocasional somam quase 676 mil unidades na capital paulista — 12 vezes o total de pessoas em situação de rua na cidade. Entre 2010 e 2022, a quantidade de domicílios sem moradores mais do que dobrou em São Paulo, cidade que concentra 25% dos moradores de rua de todo o Brasil.
Foi para discutir questões como essa que o SP+B — uma iniciativa lançada em janeiro deste ano pelo movimento global Cidades+B, liderado pelo Sistema B, com o intuito de incentivar empresas a contribuírem para uma sociedade melhor e mais justa — realizou um encontro em São Paulo, no dia 7 de agosto. O evento reuniu nomes de diversas organizações interessadas em tornar a cidade mais sustentável e inclusiva. “A dinâmica e a diversidade de especialistas presentes tornaram a reunião muito interessante. Essa diversidade foi de grande importância por trazer para o debate representantes do setor privado, do terceiro setor e do governo”, diz Tomas Alvim, coordenador-geral do Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper.
De acordo com Alvim, nesse primeiro encontro — há mais dois já planejados —, os diferentes atores se organizaram em grupos para abordar questões abrangentes do setor. “O momento foi mais de reflexão do que discussão. Nas próximas rodadas, haverá uma focalização das diferentes visões e propostas para direcionar soluções e implementações mais eficazes.”
O grande desafio, conforme Alvim, é harmonizar a oferta e a demanda por moradias. “O Brasil tem cerca de 24 milhões de moradias que carecem de condições dignas de habitabilidade, enquanto aproximadamente 7 milhões de famílias não têm casa para morar. Isso totaliza 31 milhões. Se multiplicarmos esse número por três, ultrapassamos 90 milhões de pessoas”, ressalta Alvim. “É inaceitável observar que quase metade da população do país vive em condições precárias, sem acesso adequado a saneamento e habitação, embora tenhamos tecnologia, capital e áreas suficientes para resolver o problema habitacional.”
O cientista social e arquiteto José Police Neto, um dos coordenadores do Núcleo Habitação & Real Estate do Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper, também participou do evento. “Foi uma reunião providencial com representantes de empresas, do poder público e da sociedade civil para discutir como se organizar para oferecer soluções de impacto social na cidade na área da habitação”, afirma ele.
Police Neto destaca também o fato de que São Paulo já produziu moradias suficientes, mas não consegue alocar todos os cidadãos nas unidades habitacionais disponíveis. “Para resolver essa equação, a prioridade é direcionar esforços para um serviço de moradia social em espaços já construídos. Além disso, é crucial considerar modelos de locação social e locação incentivada para famílias cuja renda seja insuficiente para arcar com os custos da moradia.”
A locação social é uma forma de subsídio para permitir que famílias paguem um valor de aluguel mais acessível. “Em vez de gastar com subsídio de transporte para uma pessoa que hoje mora a três horas do trabalho, é melhor gastar um pouquinho mais para que essa pessoa possa morar perto de onde desempenha suas atividades, melhorando sua qualidade de vida e proporcionando-lhe oportunidades de crescimento”, observa Police Neto.
Já a locação incentivada é uma abordagem que visa manter o dinamismo e a vitalidade da cidade, evitando que haja áreas subutilizadas ou debilitadas. Esse enfoque estimula o povoamento de regiões que enfrentam desafios, revitalizando esses espaços e equilibrando a distribuição da população. “É uma estratégia para repovoar áreas como o centro de São Paulo. Sem uma política forte de locação incentivada, a revitalização do centro se torna difícil, já que as pessoas podem não optar por adquirir imóveis nessa região com o objetivo de residir”, explica Police Neto.