Realizar busca
test

Com o ChatGPT, a engenharia de prompt desponta como uma nova profissão

As ferramentas de inteligência artificial precisarão de pessoas que saibam interagir com as máquinas e fazer as perguntas certas, diz o professor Tiago Tavares

As ferramentas de inteligência artificial precisarão de pessoas que saibam interagir com as máquinas e fazer as perguntas certas, diz o professor Tiago Tavares

 

Leandro Steiw

 

Embora ainda não se conheçam os limites do potencial do ChatGPT e de outras ferramentas de modelo de linguagem, os primeiros experimentos indicam que será necessário saber interagir com esses sistemas de inteligência artificial (IA) para obter resultados satisfatórios. As novas aptidões moldariam uma profissão do futuro: o engenheiro de prompt. Nessa abordagem, prompt é a linha de comando na qual se digita, em texto corrente, a pergunta que o computador vai responder.

O engenheiro de prompt não será um profissional com diploma de algum curso dedicado ou mesmo com registro no conselho profissional de Engenharia. Também não pertencerá à Ciência de Dados. Será uma pessoa capaz de fazer perguntas tão específicas que a IA possa responder exatamente o que se procura. “A única capacidade real dessas ferramentas baseadas em modelos de linguagem é predizer a próxima palavra com base nas palavras anteriores”, diz Tiago Tavares, professor do curso de Ciência da Computação do Insper.

Funciona mais ou menos assim: após uma pergunta, o ChatGPT combina a leitura de todos os livros e fontes de informação que foram armazenados no seu banco de dados. A partir dessa quantidade gigantesca de material, ou seja, dessas palavras do passado, o sistema consegue “entender” qual é o contexto da conversa do presente, quem está falando e qual é a intenção da fala até aquele momento. A habilidade atual do modelo de IA é distinguir o que são perguntas e o que são respostas.

Segundo Tavares, o GPT-3, modelo fundacional de linguagem do ChatGPT, consegue olhar para trás cerca de 1.000 a 2.000 palavras. “Não significa que o chatbot está aprendendo”, diz o professor. “Ele está olhando palavras suficientes para responder às últimas perguntas. E, se você manteve coerência no seu diálogo com a máquina, essa coerência acaba se propagando. Aí é que a engenharia de prompt acontece. Criando o contexto que faz sentido, o chatbot pode responder exatamente o que você quer saber.”

Tavares recorre a uma analogia. Numa entrevista de emprego, a pergunta “me fale sobre você” supõe um contexto. As pessoas já sabem o que querem dizer e o que querem ouvir. Mas, em uma mesa de bar, a mesma pergunta tende a gerar outras respostas. O engenheiro de prompt domina a informação contextual, logo, extrairá respostas melhores do que usuários com perguntas aleatórias. Aqui, “prompt” ganha o sentido de “mote”, a proposição ou tema que se quer desenvolver.

Uma pergunta mais específica seria a seguinte: “ChatGPT, finja que você é uma pessoa com tais e tais características e, numa entrevista de emprego, recebeu a pergunta ‘me fale sobre você’; como você responderia?”. Diante da resposta, pode-se pedir: “Use mais jargões da indústria automobilística”. “Esse contexto que se deu para o chat vai servir como um prompt mesmo, para que as probabilidades de palavras que continuam o diálogo correspondam ao que você pediu para ele”, diz Tavares. “E você consegue refinar esse processo de conversa — por isso parece uma conversa.”

O termo “engenharia de prompt” deve considerar a dimensão exata da ferramenta. “Por mais que exista a antropomorfização do ChatGPT, ele é só um dispositivo matemático, então o usuário precisa dizer exatamente o que quer. Numa comparação com o comportamento humano, a ferramenta é quase como uma pessoa muito competente e eficaz, mas extremamente cínica. “Ela vai fazer exatamente o que você está pedindo, nem uma vírgula a mais”, diz o professor.

Tavares conta que a engenharia de prompt apareceu no uso de softwares de criação de imagens a partir de descrições textuais, no estilo do DALL-E. Os melhores desenhos dependem de comandos refinados. A ordem “desenhe um coelho no estilo de Pablo Picasso” resulta em inúmeras possibilidades, não necessariamente satisfatórias à imaginação do usuário. “Não tem magia, mas às vezes tem algumas surpresas”, diz Tavares. “Como seres humanos, nós nem mencionamos certas coisas porque achamos que estão tão implícitas no contexto ou que é impossível não compreender. O grande truque de prompts que as pessoas tem feito é sacar quais são esses detalhes despercebidos. Se você especifica direito, as respostas são muito boas.”

 

Professor Tiago Tavares
Professor Tiago Tavares durante mesa-redonda sobre o ChatGPT

Experimentar é preciso

Não dá para ignorar ou proibir o uso do ChatGPT ou das ferramentas similares que surgirão nos próximos anos. Sobre os desafios, o Insper já realizou uma mesa-redonda com professores dos cursos de Ciência da Computação e Engenharia de Computação. Os alunos e os professores de todos os cursos do Insper são incentivados a conhecer o chatbot. “Estamos experimentando bastante e conversando muito francamente sobre o ChatGPT”, diz Tavares.

Os limites do potencial dessas ferramentas são desconhecidos. “É uma batalha perdida querer proibir”, afirma o professor. “E acho que nem é tão vantajoso assim. Porque vai ser uma ferramenta do mundo real. Talvez daqui a cinco anos seja tão trivial fazer prompt engineering quanto usar o Excel. Estamos gostando da ideia de experimentar o uso e de entender até que ponto isso fortalece nossa capacidade de ter ideias e de testar mais ideias, de ver coisas diferentes.”

A aderência dos estudantes aos sistemas de inteligência artificial desafia os professores a se tornarem, de certa forma, engenheiros de prompt. Questões bem elaboradas podem driblar as deficiências dos chatbots, algumas já identificadas: a ferramenta não monta raciocínios novos, não consegue citar fontes (e até inventa nomes de trabalhos e autores) e pode reproduzir discursos de ódio e preconceito apesar da curadoria humana e dos filtros constantemente atualizados.

Por enquanto, o ChatGPT sempre dá uma resposta, mesmo que equivocada. Curiosamente, uma característica tipicamente humana. Tavares compara, bem-humorado, àquelas pessoas que querem falar bonito, mas que invariavelmente dizem coisas erradas. As dificuldades dos estudantes, no entanto, não mudaram na hora de escrever. “Quem conseguia fazer uma boa redação também consegue fazer bons prompts de redação”, diz o professor. “Até o momento, é o que temos observado. Os alunos que não sabiam por onde começar continuam não sabendo por onde começar.”

As ferramentas se transformam e estamos diante de mais um salto evolutivo da tecnologia baseada em modelo de linguagem. Para Tavares, a inteligência artificial trará ganhos de produtividade e, ao mesmo tempo, todos os riscos associados a entidades eletrônicas que parecem humanas.

Tudo é muito experimental ainda. “Sempre houve alguma interação entre homem e máquina, que de repente pode ser válido também”, afirma Tavares. “Você acompanha a redação feita por um robô e consegue julgar esse trabalho. Isto é uma habilidade importante: encontrar as falhas de raciocínio no meio de uma redação feita por outro agente.” Na essência, em qualquer área do conhecimento, professores já fazem isso. O engenheiro de prompt deve seguir o mesmo caminho.

Este website usa Cookies

Saiba como o Insper trata os seus dados pessoais em nosso Aviso de Privacidade, disponível no Portal da Privacidade.

Aviso de Privacidade

Definições Cookies

Uso de Cookies

Saiba como o Insper trata os seus dados pessoais em nosso Aviso de Privacidade, disponível no Portal da Privacidade.

Aviso de Privacidade