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“De volta à normalidade: 2023 deverá ser um ano mais estável na economia”

Apesar do cenário desafiador para o novo governo, a expectativa é mais otimista do que nos últimos anos, diz o professor Otto Nogami

Apesar do cenário desafiador para o novo governo, a expectativa é mais otimista do que nos últimos anos, diz o professor Otto Nogami

 

Bárbara Nór

 

Depois de um ano conturbado em função dos efeitos prolongados da pandemia e do clima eleitoral, o Brasil iniciou 2023 com um pouco mais de otimismo no cenário econômico — mas não com menos desafios. Essa é a avaliação de Otto Nogami, economista pela Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo e professor em programas de pós-graduação lato sensu e educação executiva do Insper, além de sócio da consultoria Nogami Economia, Estratégias e Treinamento. Para o docente, a principal tarefa do novo governo federal será trazer a economia brasileira de volta à “normalidade”, tanto internamente quanto em sua relação com outros mercados.

Confira na entrevista a seguir.

 

Como o senhor descreveria o cenário que se apresenta para o novo governo?

As condições conjunturais que o atual governo está recebendo são um pouco preocupantes. No ano passado, o clima político institucional vigente no país, todo aquele movimento anterior à própria campanha eleitoral, despertou uma preocupação com relação a esse ambiente político-institucional, ou seja, em relação ao comportamento de governo e à maneira como conduzia as questões. Isso criou um clima de apreensão junto aos consumidores e o empresariado, o que gerou um arrefecimento da atividade econômica. Podem até dizer que o emprego melhorou, e que o salário real médio melhorou, mas essa seria uma tendência natural à medida que a economia começa a se recuperar dos efeitos da pandemia, independentemente da ação do governo. O que as estatísticas sinalizam é um arrefecimento da atividade econômica já notadamente a partir do segundo semestre do ano passado. É a partir disso que surgem os grandes desafios do atual governo, que deve conseguir trazer a economia à sua condição de normalidade.

 

Quais são esses desafios na retomada da normalidade da economia?

Um deles é, sem dúvida alguma, a questão da política fiscal, ou seja, toda a revisão de contas fiscais, seja no que diz respeito a despesas, seja no que se refere à própria arrecadação do governo. Outro aspecto diz respeito à política monetária. Estamos falando de como o Banco Central vai combater o processo inflacionário da economia — e sabemos que o único mecanismo razoável para isso é a elevação da taxa de juros. Por outro lado, na perspectiva de retomar o crescimento da atividade econômica, é preciso trazer a taxa de juros para um patamar mais razoável.

 

Ou seja, diminuir a taxa de juros?

Sim, teria que diminuir, fazendo com que os preços se comportem de maneira mais desejável. Esse é um grande desafio para o governo, que precisa ter mecanismos que ele possa adotar sem interferir na formação de preço do mercado para que os preços possam começar a cair. Esse é um aspecto extremamente difícil de ser feito, porque você tem essa perspectiva da crise internacional, com o aumento de preços gerado pela guerra na Ucrânia, que pode atrapalhar esse processo. No ano passado, o preço dos combustíveis, energia elétrica e telecomunicações foram artificialmente reduzidos pelos benefícios fiscais concedidos pelo governo para reduzir o preço. O realinhamento desses preços neste ano irá pressionar novamente os preços da economia, podendo realimentar o processo inflacionário. Saber balancear isso será um dos maiores desafios da atual gestão.

 

O governo Lula tem feito diversas visitas a outros países e sinalizando mudanças nas relações exteriores do Brasil. Isso pode trazer melhorias para nossas relações comerciais?

Sim. Esse é o terceiro aspecto que eu destacaria entre os desafios do novo governo: a política cambial. Ela acaba sendo muito mais uma consequência de como o governo vai conduzir a política econômica e seus relacionamentos com o mundo externo. Quando falamos de política cambial, estamos nos referindo ao fluxo de moedas estrangeiras, seja oriundo da atividade comercial e serviços, seja de movimento do próprio capital financeiro. Conforme temos um cenário adequado e o governo se reaproxima dos grandes parceiros comerciais, isso acaba se revertendo em uma melhoria da credibilidade da nossa economia. Isso levaria a uma taxa de câmbio mais baixa e, portanto, à valorização da moeda nacional. À medida que há uma valorização da moeda nacional, isso acaba beneficiando a formação de preços da indústria, algo que começa a melhorar nosso cenário. As visitas do presidente a países como Argentina, Estados Unidos e Portugal, por exemplo, podem realmente mudar esse relacionamento do Brasil com o mundo externo, o que poderá trazer benefícios para o comércio internacional e para o fluxo de capitais em direção ao país.

 

Tensões como a invasão do Congresso no dia 8 de janeiro podem ainda desestabilizar o atual governo e sua política econômica?

Esse foi um evento que aconteceu, mas que teve um impacto praticamente zero sobre a atividade econômica. Poderíamos dizer que foi um movimento de um grupo tentando desestabilizar a economia, o que acabou não acontecendo. Nesse sentido, chegamos à conclusão de que nossa economia é um tanto quanto resiliente a esses movimentos pontuais. Porque foi isso — um movimento pontual que não atingiu todas as capitais do país, mas só Brasília. As instituições estão preservadas, os Poderes estão preservados.

 

Neste primeiro mês de governo já é possível vislumbrar as medidas que o governo deve tomar? Para que caminhos elas apontam?

Ainda é cedo para dizer. Você tem discursos e eventuais sinalizações, mas nada de concreto. Precisamos ter um pouco de paciência e esperar dois, três meses para verificar exatamente como essas ações do governo estão repercutindo sobre a atividade econômica. Mas algo que eu destacaria é que o governo precisa prestar mais atenção em relação à infraestrutura — o que envolve a questão educacional, de saúde, segurança e mobilidade. São quatro elementos extremamente importantes que contribuem de maneira muito forte para a melhoria da produtividade. E, entre eles, sem dúvida o da educação é o mais relevante de todos. Porque uma coisa que temos percebido é que o descaso do governo anterior com relação ao setor educacional está criando problemas já nos dias de hoje, e tende a criar problemas ao longo dos próximos anos no que diz respeito à qualidade das mão de obra. Então, além de cuidar da formação básica do indivíduo, é preciso que o governo comece a pensar em como suprir as necessidades que virão logo mais, em especial com relação à qualificação da mão de obra.

 

Outra dificuldade é que durante o processo de transição do governo, vimos também diversos relatos sobre como não haveria dinheiro para cumprir projetos e políticas governamentais.

 

Sim, esse é um desafio. Mas ainda é prematuro, não temos ainda a percepção do que o governo está fazendo ou pretende fazer para equacionar justamente essa questão orçamentária para poder cumprir seus planos. Mas, pelo discurso, por aquilo que vimos no passado em termos de condução da economia por parte do atual governo, eu diria que podemos ter perspectivas positivas em relação à melhoria geral da economia. Pelo menos por enquanto, aposto em uma melhoria nas condições econômicas do país.

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