O maior telescópio espacial já lançado está gerando imagens inéditas do cosmo graças a uma série de soluções que atuam de forma integrada
Tiago Cordeiro
A 1,5 milhão de quilômetros da Terra, orbitando o sol, o telescópio espacial James Webb começou a mostrar a que veio — e fazendo valer cada centavo dos 10 bilhões de dólares investidos nele por um consórcio internacional formado pelas agências espaciais americana (Nasa), europeia (Esa) e canadense (CSA).
Nos últimos dias, a Nasa começou a divulgar novos registros do universo: duas nebulosas (gigantescas nuvens de poeira e gás, uma espécie de berçário de estrelas), um exoplaneta (planeta fora do Sistema Solar) gasoso e um conglomerado de galáxias que estão aproximadamente a 290 milhões de anos-luz de distância.
A escolha desses corpos espaciais para dar início aos trabalhos, que deverão durar até 20 anos, não foi aleatória. Uma das nebulosas, a do Anel Sul, aponta para o futuro do nosso próprio Sol, que em algum momento deverá se tornar, ele também, uma vasta nuvem de hidrogênio, plasma e poeira. A outra, a de Carina, é uma espécie de berçário de novas estrelas, muitas delas bem maiores do que o nosso Sol. Já havia imagens das duas, mas não com o grau de detalhamento possibilitado pelo James Webb, que fornece subsídios inéditos para os astrônomos.
O principal objetivo do James Webb, que foi lançado em 25 de dezembro de 2021, é precisamente oferecer novos dados a respeito de planetas a galáxias, alguns já conhecidos, dos mais diferentes portes. As comparações entre as primeiras imagens fornecidas pelo telescópio e fotografias dos mesmos copos celestes fornecidas pelo telescópio Hubble (que foi lançado em 1990 e permanece em atividade) deixa claro que esse objetivo será alcançado.
Batizado em homenagem a James E. Webb, administrador da Nasa de 1961 a 1968, época dos programas espaciais Mercury, Gemini e Apollo, o aparelho começou a ser projetado em 1996 e só ficou pronto em 2016. Tem o peso de um ônibus escolar e um escudo solar do tamanho de uma quadra de tênis — ele impede que calor e radiação comprometam o funcionamento dos instrumentos mais sensíveis.
Conta ainda com 32 pequenos motores para ajustar a posição de espelhos e lentes. Opera a 223°C negativos, de forma a viabilizar o funcionamento de um sistema que permite enxergar em infravermelho, o que possibilita capturar sistemas posicionados atrás de nuvens de gás — outro telescópio, o Spitzer, já utilizava o sistema, mas seu espelho principal tinha 80 centímetros de diâmetro, enquanto o do James Webb tem 6 metros; foi transformado em 18 peças hexagonais, que se abriram no espaço como um origami.
Com isso, o James Webb pode enxergar 13,7 bilhões de anos no passado — o que representa muito mais do que 13,7 bilhões de anos-luz, uma vez que o universo se expande. É apenas 100 milhões a 250 milhões de anos menos do que o Big Bang, a origem do nosso universo. E 300 milhões de anos a mais do que o Hubble é capaz de captar. Assim, vai permitir lançar um novo olhar para o passado, o que vai ajudar os cientistas a entenderem melhor a formação de planetas, estrelas e galáxias. Esse desempenho é resultado de uma combinação de tecnologias implementadas no equipamento.
Algumas inovações foram desenvolvidas para o James Webb e aplicadas a outros telescópios. É o caso do sensor HAWAII-2RG, que faz ajustes sutis no posicionamento da câmera enquanto ela registra imagens de corpos espaciais em deslocamento. Quando o Hubble precisou de reparo, em 2009, recebeu esse sistema — e também novos circuitos integrados de aplicação específica, ou ASICs, que condensam uma série de peças em um conjunto de componentes menor e mais leve.
Das 6 toneladas do telescópio, os instrumentos que, de fato, fazem o trabalho de coleta de imagem pesam, somados, 2,4 toneladas. É pouco, na verdade, graças, em parte, ao desenvolvimento de uma série de novos materiais, como uma liga de grafite com titânio e conexões utilizando uma liga de ferro e níquel de alto desempenho conhecida como invar.
Graças a essas inovações, a estrutura que sustenta os espelhos é leve e rígida, capaz de não oscilar enquanto os espelhos se movem — aliás, eles são feitos do metal berílio, coberto por uma camada finíssima de ouro. A densidade corresponde a um décimo da do espelho do Hubble.
E mais: na busca por melhorar a precisão desse componente, foi preciso desenvolver ume tecnologia de medição mais precisa. Agora ela vem sendo aplicada para mapear olhos humanos e melhorar o desempenho de cirurgias oculares a laser. Sinal de que as inovações aplicadas no espaço poderão ser muito úteis também na Terra.