Em um cenário de taxas de juros elevadas e crescente competição por negócios, um estudo pioneiro no Brasil — realizado por uma parceria entre o Insper, a gestora de ativos alternativos Spectra Investments e o provedor de serviços de consultoria em liderança global Heidrick & Struggles — revela como os operating partners (OPs) têm se tornado figuras cada vez mais estratégicas no mercado de private equity. A pesquisa, lançada durante um evento realizado em 23 de outubro, em São Paulo, entrevistou 19 gestoras responsáveis por mais de 350 bilhões de dólares em ativos sob gestão, traçando um panorama detalhado sobre o perfil, a remuneração e o papel desses profissionais no país.
Private equity é um modelo de investimento em que fundos especializados adquirem participação em empresas de capital fechado — diferentemente das empresas listadas em bolsa — com o objetivo de implementar teses de criação de valor durante um período, que geralmente dura entre 3 a 7 anos, e depois vender a participação gerando retorno alto a seus cotistas. Esse tipo de investimento é conhecido como “smart money” porque vai além do aporte financeiro: inclui participação ativa em conselho, melhoria na governança, profissionalização e ganhos de eficiências operacionais nas empresas investidas.
É nesse contexto que atuam os operating partners, profissionais especializados que combinam experiência executiva com conhecimento setorial para ajudar as equipes de gestão das empresas do portfólio na criação de valor. “O modelo de private equity é um tipo de investimento ativo, onde o fundo traz governança, profissionalização, processos e auxilia a gestão da empresa na criação de valor. É diferente de um fundo de ações, em que os gestores apenas monitoram o preço e acompanham a empresa. No private equity, os gestores atuam no conselho de administração e têm o poder de interferir na gestão da empresa. Podem adquirir tanto controle quanto participação minoritária, e são sócios especialmente interessantes para empresas fechadas que precisam de profissionalização e ganho de eficiência”, explica Andrea Minardi, professora do Insper e uma das coordenadoras do estudo ao lado de Humberto Gallucci (Spectra) e Natasha La Marca (Heidrick & Struggles).
O momento é particularmente propício para a atuação dos OPs — com quase 4 trilhões de dólares em capital disponível globalmente para investimento em ativos ilíquidos (conhecido como “dry poder”) em dezembro de 2023, as gestoras enfrentam o desafio de gerar retornos atrativos em um ambiente de juros elevados, onde a alavancagem financeira tradicional — estratégia de usar dívida para ampliar o potencial de retorno dos investimentos — se torna mais complexa.
A pesquisa identificou dois papéis principais desempenhados pelos operating partners: value creation e industry advisor. O primeiro grupo é formado por profissionais com ampla experiência operacional, responsáveis por implementar estratégias que aumentem a eficiência e o crescimento das empresas investidas. Já os industry advisors são tipicamente executivos bem-sucedidos com profunda expertise setorial, que fornecem insights estratégicos para orientar decisões de alocação de capital.
Entre as gestoras pesquisadas, 74% contam com OPs exercendo papel de value creation, enquanto 52% os utilizam como industry advisors. Um dado interessante é que 42% das gestoras combinam ambas as funções, demonstrando a versatilidade necessária nesses profissionais.
“Com o mercado cada vez mais competitivo e a alavancagem financeira se tornando mais desafiadora, a criação de valor por meio dos ativos das empresas tem ganhado mais importância. A figura do ‘value creation’, um sócio que atua de maneira intensa com o time de gestão das empresas investidas passou a ser mais valorizada, destaca Minardi.
O estudo revelou que a experiência mais valorizada para um operating partner é ter ocupado posições de C-level (74% das respostas), seguida por experiência em consultoria (53%). A remuneração média fixa anual é de 690 mil reais, com mediana de 480 mil, com uma diferença significativa entre gestoras estrangeiras (média de 1,344 milhão de reais) e locais (média de 420 mil reais).
“Como algumas gestoras são pequenas, elas são criativas na forma de remunerar, pois nem sempre conseguem oferecer um alto salário fixo”, observa Minardi. De fato, 89% das gestoras oferecem uma combinação de salário fixo com bônus ou carry (taxa de desempenho dos fundos), e em alguns casos outras formas de remuneração alinhada ao desempenho, como opções em ações de empresas investidas e possibilidade de coinvestimento.
Um aspecto relevante identificado pela pesquisa é o equilíbrio necessário entre os interesses do fundo e da empresa investida. “Há um risco de esses profissionais desenvolverem maior comprometimento com a empresa investida do que com o fundo que os contratou. Por isso, o alinhamento dos interesses é fundamental. Esses profissionais recebem um salário fixo da empresa investida, mas é comum receberem carry, que em 80% dos casos é baseado no resultado do fundo como um todo, e não apenas no dos deals de que os OPs participaram, o que ajuda a manter harmonia entre os objetivos de todas as partes envolvidas”, explica a professora.
O mercado brasileiro apresenta características próprias que tornam o papel dos operating partners ainda mais relevante. “No Brasil, há uma necessidade maior de extração de valor dos ativos, e o conselheiro precisa estar mais envolvido na gestão do que, por exemplo nos Estados Unidos, onde muitos fundos apenas dão orientações iniciais e deixam o processo mais solto”, compara Minardi.
O estudo foi apresentado em um evento que reuniu importantes nomes do setor. Um dos destaques foi o painel sobre Value Creation, que contou com a participação de Frances Fukuda, managing director na Warburg Pincus, Rogerio Cafruni, senior director e head do time de Portfolio Support da Advent para a América Latina, e Nelson Bechara, sócio-fundador da Noon Capital Partners. O evento incluiu ainda uma palestra seguida por uma seção de perguntas e respostas com Conrado Engel, senior advisor da General Atlantic, que compartilhou suas experiências e perspectivas sobre o mercado.
Embora o Brasil tenha muitas empresas familiares que podem se beneficiar da sociedade com fundos de private equity, o risco cambial tem afastado capital internacional, e as altas taxas de juros no Brasil tem desincentivado investidores brasileiros a alocar mais capital em PE. Assim, há mais empresas que precisam de recursos de fundos de private equity do que a capacidade atual de investimento das gestoras nacionais e internacionais. Esse desbalanceamento entre oferta e demanda gera oportunidades para altos retornos em private equity no Brasil — que podem ser muito ampliados com o envolvimento de sócios operacionais.