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Uma aplicação real da blockchain na economia agrícola digital

Como a startup Agrotoken transforma a produção agroindustrial em ativos digitais fragmentáveis e transacionáveis, chamados de tokens

Como a startup Agrotoken transforma a produção agroindustrial em ativos digitais fragmentáveis e transacionáveis, chamados de tokens

 

Anderson Nacaxe

 

Desde a publicação do artigo de Satoshi Nakamoto (o nome por trás da criação da bitcoin) e a introdução do mundo da blockchain e das criptomoedas, muito se tem discutido sobre a aplicabilidade desses ativos na economia real e sobre o efetivo valor dos ativos digitais.

Chamamos as criptos de moedas por serem duráveis, transferíveis e atenderem a critérios de fungibilidade. Também por possuírem um preço comum estabelecido por meio de oferta e demanda e pelo fato de sua criptografia tornar cada ativo digital algo único. Por serem escassas, tornam-se, portanto, um tipo de reserva de valor. Sendo assim, são eficientes meios de troca, perfeitamente arbitráveis entre os agentes, seguros e com uma lógica global de valor.

Mas podemos usá-las na economia de um país? A resposta não é tão simples, pois passa por questões internas de oferta e demanda e também por aspectos macroeconômicos enfrentados por bancos centrais em todo o mundo, como inflação, risco e liquidez, demandando controle de juros, impressão de moeda, emissão de títulos públicos etc.

Criptos são ativos perfeitos para especulação, sobretudo na era do capital improdutivo. Independentemente de fundamentos econômicos que justifiquem ganho ou perda de preço, sua intercambialidade e sua escassez geram a volatilidade perfeita para operadores de tendências e análises técnicas. Contudo, para além do fato de ser uma reserva de valor, precisariam atrair outros agentes da economia real que pudessem multiplicar a moeda e contribuir na sua oferta, colocar valor ao tempo e vincular os ativos a sistemas capazes de gerar mais-valia, ou seja, agregar valor por meio de trabalho, transformação ou arbitragem a essa própria moeda.

Neste contexto, a utilização da tecnologia das criptomoedas no setor primário, com produtores de commodities, representa as primeiras aplicações reais e tangíveis da blockchain como método de captura e redistribuição de valor.

É o exemplo da Agrotoken, que se propõe a criar uma nova camada de tecnologia no agronegócio, que há algum tempo já é digital, provendo a infraestrutura para a criação de ativos digitais fragmentáveis e transacionáveis, chamados de tokens.

Seus tokens são criados apenas por produtores de commodities reais. Eles representam o direito creditório de contratos de venda dessas commodities. Os detentores desses tokens, que são lastreados integralmente por garantias reais dos ativos objetos desses contratos, podem transferir o direito de crédito a compradores certificados. Uma vez criados, os ativos digitais são normalizados em seu risco e preço, sendo transformados no que chamamos de AgroTokens. Esses ativos possuem valor e liquidez comuns, são perfeitamente divisíveis e seguros e podem ser utilizados em um ecossistema digital e totalmente sem atrito de diversas formas:

  • Meio de troca em compra de produtos e serviços;
  • Carteiras digitais e cartões de crédito não bancários;
  • Garantia autoexecutável para empréstimos;
  • Operações estruturadas (como barter);
  • Reserva de valor para poupança ou investimento;
  • Integração com sistemas de crowdfunding e Defi.

Todo o processo de criação de tokens é certificado pela infraestrutura, que atua como Clearing, câmara de compensação e agente fiduciário. Para isso, os tokens são gerados apenas por produtores rurais qualificados e a partir de documentação real, que provê à Agrotoken o direito de cobrança sobre os contratos e como credor das garantias. Esses direitos são “materializados” no ambiente digital e repassados a novos agentes por meio do token, sendo a empresa a responsável pela distribuição dos créditos obtidos na performance dos contratos de venda e de eventuais execuções das garantias.
Com ativos digitais como esse, vinculados diretamente a Ativos do Mundo Real (RWA), o mecanismo econômico de geração de valor é mantido e problemas de integração entre os agentes da cadeia de valor reais endereçados, algo fundamental na cadeia agrícola, que tem de lidar com o desafio do tempo entre as safras, a incerteza da produção, a alta alavancagem e a imensidão de locais e produtores que demandam precificação e análise de risco individual. Isso dificulta, e muito, a liquidez e, sobretudo, a entrada de novos agentes em uma cadeia repleta de atores internacionais centenários e empresas geracionais.
Esses novos ativos permitem visualizarmos um futuro em que não tenhamos mais filas nos postos de combustíveis na iminência de um aumento, em que duas horas de espera em um aumento de 50 centavos geram economia de 25 reais em um tanque de combustível, limitação de cada comprador. Podemos imaginar usinas de cana emitindo Agrotokens e estes sendo comprados diretamente por motoristas na cidade em exchanges, financiando o setor, e que então poderiam trocar por etanol, diretamente na bomba, em uma proporção muito mais estável do que se observa em grandes movimentos de preço, câmbio ou mesmo inflação.
Esse novo tipo de ativo atua como solução para integração entre os agentes de cadeias produtivas, e ao focar o setor primário produtor de commodities, que é base da economia, permite uma integração global. Essa dinâmica protege esses ativos de macromovimentos econômicos que geram inflação ou desvalorização cambial das moedas. Basta verificar que os principais itens das cestas de consumo usados para quantificar inflação das moedas fiduciárias (emitidas por governos) são oriundos desse setor e é a única forma de comparar poder de compra entre economias, como podemos observar nos casos do ouro dourado e negro, e todas as suas influências nas nações.
Como afirmou o economista Joseph Stiglitz, vencedor do Prêmio Nobel, ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional e polêmico anticripto: “O uso da tecnologia blockchain no setor de commodities tem o potencial de reduzir as incertezas e os riscos associados aos instrumentos financeiros tradicionais e fornecer um meio mais estável e confiável de troca de valor”. Isso nos leva a crer que podem melhorar muito a eficiência e a estabilidade desses mercados, bem como fornecer um novo nível de transparência e confiança para os atores. Isso, por sua vez, tem o potencial de servir de modelo para o uso das ativos digitais e da tecnologia blockchain em outras áreas da economia e demonstrar sua viabilidade como um efetivo de Unidade Real de Valor (URV, bem conhecida pelos brasileiros) e como meio de troca.
À medida que o mundo continua a abraçar esta nova tecnologia, será fascinante observar a sua evolução e aplicações mais profundas no cotidiano das pessoas no campo e na cidade.


 

* Anderson Nacaxe, alumnus do Insper, é economista com pós-graduação em Engenharia Financeira e MBA em Finanças. É country manager da Agrotoken no Brasil.

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