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O impacto potencial da gripe aviária no mercado brasileiro

Doença já atingiu 70 países e pode chegar ao Brasil. Risco de fechamento de mercados existe, mas pode haver flexibilização com a negociação de escopo regionalizado

Doença já atingiu 70 países e pode chegar ao Brasil. Risco de fechamento de mercados existe, mas pode haver flexibilização com a negociação de escopo regionalizado

 

Fernanda K. Lemos*

 

A gripe ou influenza aviária (H5N1) é um vírus de rápida e fácil transmissão que já compromete a sanidade da produção de aves em pelo menos 12 países nas Américas, 27 países na Europa, 13 países na África e 17 países na Ásia. O primeiro caso nos Estados Unidos, maior produtor comercial de frangos, foi detectado em janeiro de 2022 em uma ave selvagem. Em setembro do mesmo ano, a doença foi identificada em uma granja comercial no estado de Indiana[1]. Na Europa, a epidemia foi identificada em outubro de 2021 e o relatório mais recente aponta que a gripe comprometeu a produção em 27 países.

Embora a difusão do vírus entre países e continentes aconteça primordialmente pelo fluxo de aves silvestres, o comércio internacional de carne de aves poder ser um veículo de contaminação extrafronteira, pois o vírus sobrevive ao processo de congelamento. Neste sentido, a saúde animal do país importador pode ficar exposta se houver precariedade de controle na manipulação ou no descarte da proteína. Aproximadamente 80% das exportações mundiais de carne de frango provêm do Brasil (33%), dos Estados Unidos (25%), da União Europeia e Reino Unido (14%) e da Tailândia (8%).

 

Gráfico: exportação de frango

 

Esta situação levou países importadores como o Japão a fechar fronteiras com 74 condados e 7 estados inteiros nos Estados Unidos, além várias regiões em 7 países da Europa. Outros países importadores, principalmente do Oriente Médio e da Ásia, também têm realizado suspensões por estados ou regiões (a chamada “regionalização”), em vez de optarem pelo fechamento total de fronteiras com países contaminados, para evitar o desabastecimento. Mas vale ressaltar que, embora a Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA) tenha “flexibilizado” a questão do fechamento de países quando envolve ocorrências cujo controle pode se dar por zoneamento, o comércio entre países ainda fica sujeito a acordos bilaterais e às relações de controle sanitário estabelecidas.

 

Gráfico: importação de frango

 

No entanto, a evolução da epidemia global de gripe aviária preocupa o mercado por causa da alta letalidade e da necessidade de dizimação de rebanho comercial de frangos, o que elevaria o preço do frango e a eventual substituição dessa proteína por outras mais baratas. Um desequilíbrio na oferta global pode levar ao aumento de preços de frangos e ovos e ao impulso da demanda por pescados, carne bovina e carne suína, substitutos diretos. Vale ressaltar que países onde a religião islâmica é majoritária tem no frango a sua principal base proteica, uma vez que o consumo de carne suína tem restrições religiosas.

No Brasil, o Ministério da Agricultura e Pecuária está em alerta máximo devido à massiva difusão global e às recentes ocorrências em países vizinhos dos estados sulinos. Diversas medidas foram tomadas de forma preventiva no monitoramento de estabelecimentos e instruções de controle preventivo, segundo relato da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).

Embora o zoneamento e isolamento das regiões produtoras seja uma medida global que previne o desabastecimento e grandes flutuações em preços, 64% da produção certificada pelo Serviço de Inspeção Federal (SIF) ocorre nos estados do Paraná (35,5%), de Santa Catarina (14,8%) e do Rio Grande do Sul (13,6%). A produção total brasileira de frango em 2022 foi de 14,5 milhões de toneladas. Somados, os três estados do Sul responderam por 9,28 milhões de toneladas produzidas e por 79% das exportações brasileiras, equivalentes a 3,641 milhões de toneladas, segundo dados da ABPA.

O Brasil é o maior fornecedor global de carne de frango, exporta aproximadamente 30% de sua produção e detém 33% do mercado internacional. As consequências de um possível fechamento internacional desses três grandes estados produtores podem ser devastadoras, pois eles correspondem a uma parcela significativa das importações globais de carne de aves.

Os impactos para o mercado interno dependerão das deliberações do governo federal quanto à comercialização de animais sacrificados. Uma vez que o vírus não apresenta riscos diretos a saúde humana, a proteína pode ser disponibilizada no mercado doméstico, o que no curto prazo levará à queda dos preços, seguida pela elevação até a recuperação do rebanho e do status de livres de gripe aviária.

A comercialização no mercado doméstico da carne de animais abatidos pode não representar um risco caso a proteína seja processada e a indústria tome os cuidados para lidar com o descarte. As secreções do alimento, o descarte de ossos ou os restos da proteína não cozida são veículos de disseminação e servem de alimento para animais silvestres. O tratamento e o descarte são focos de risco pela difusão desses animais selvagens que buscam em lixos seus alimentos e servem de veículo para a propagação em outras regiões.

 

[1] USDA – Animal and Plant Health Inspection Service


*Fernanda K. Lemos é pesquisadora sênior do Insper Agro Global e pesquisadora associada da Universidade de York e do Metricis/Insper.

 

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