Ao completar uma década de existência em 2025, o curso de Engenharia Mecânica do Insper se destaca por sua proposta inovadora que busca formar profissionais com visão ampla, capazes de trabalhar não apenas com aspectos técnicos, mas também com design centrado no usuário e na viabilidade de negócios.
O professor Carlos Valente, coordenador do curso desde 2016, possui formação em Engenharia Mecânica com ênfase em Mecatrônica pela Universidade de São Paulo (USP), campus de São Carlos, onde também fez Mestrado em Robótica e Doutorado em Automação da Manufatura. Sua experiência inclui pesquisa na Universidade da Califórnia em Berkeley, nos Estados Unidos.
Na entrevista a seguir, Valente destaca que, contrariando a visão tradicional do engenheiro mecânico focado apenas em automóveis e aeronaves, o profissional formado pelo Insper atua em áreas diversas, como energia renovável, saúde e mobilidade urbana. A formação prática, com projetos reais em parceria com empresas, é fundamental nesse processo.
A área de engenharia mecânica mudou muito nos últimos anos?
Com certeza. A digitalização fundamentalmente mudou a forma como os projetos são executados. Quando me formei, novos projetos já eram realizados em computadores, mas ainda usávamos pranchetas para consultar projetos antigos. Hoje, ferramentas de simulação e auxílio computacional à engenharia são essenciais para qualquer engenheiro mecânico. Além disso, a digitalização transformou as máquinas e sistemas em elementos mais conectados e inteligentes, com ganhos de segurança, usabilidade e produtividade. A união destas soluções de conectividade e simulação permitem réplicas digitais de sistemas físicos que ajudam a prever falhas e a otimizar o desempenho operacional do sistema. E, mais recentemente, a inteligência artificial vem abrindo novas oportunidades e revolucionando as técnicas clássicas de engenharia.
O perfil do aluno também mudou?
Na minha época de estudante, o perfil do estudante de engenharia mecânica era clássico: um sujeito que gostava de carros ou aviões. Hoje, a nova geração traz outras preocupações. Ela se interessa por problemas das cidades, mobilidade, logística, eletrificação de transportes. Há muito interesse também na sustentabilidade: energias renováveis, uso eficiente de recursos, equipamentos mais eficientes. E também há interesse crescente na área de saúde, na interface entre engenharia e medicina.
Quando perguntamos aos alunos o que os trouxe para a Engenharia Mecânica, muitos dizem que ela é mais abrangente e abre mais portas. Os problemas que gostariam de trabalhar são diversos: alguns citam carros e aviões, mas muitos também mencionam energia, saúde e problemas urbanos.
Em sua avaliação, quais são as perspectivas profissionais para o engenheiro mecânico?
São extremamente amplas. Nosso curso busca oferecer ao aluno e à aluna uma formação focada não somente do projeto em si, mas em todo o contexto deste produto ou sistema mecânico. Ou seja, uma visão do ciclo de vida completo do produto desde a sua concepção, partindo do design e, portanto, do usuário, passando pela sua produção, uso e manutenção de suas funções principais e, por último, seu fim de vida, envolvendo temas de descarte adequado, reutilização ou remanufatura. Essa visão sistêmica e abrangente abre portas para várias oportunidades de mercado ao longo da cadeia de valor desse produto, o que torna o curso uma escolha estratégica para quem busca múltiplas possibilidades de carreira. Como consequência, nossos alunos formados se distribuem em várias atividades econômicas: indústria automotiva, aeronáutica, saúde, energia (especialmente renovável), bens de capital, bens de consumo, agronegócio, consultorias (tanto estratégicas quanto técnicas), mercado financeiro, startups e inovação. As últimas turmas têm mostrado interesse crescente pelo setor de energia — geração solar e eólica, distribuição, comercialização. Temos ainda alunos trabalhado em grandes empresas do Brasil e também do exterior. O mercado é extremamente diversificado para quem tem uma formação sólida.
Existe um perfil ideal para estudar Engenharia Mecânica?
Eu diria que é um curso para aquele estudante que se sente confortável com os conceitos de matemática e física, mas, principalmente, para o aluno curioso, que prefere estar conectado ao mundo real e atuar sobre problemas relevantes da sociedade: energia, água, alimento, mobilidade, segurança, sustentabilidade, bem-estar etc. É esse espírito de curiosidade para entender os problemas reais e desejo de resolvê-los que caracteriza o bom engenheiro.
Quais os principais desafios da profissão no futuro?
Um desafio importante é que o profissional saia da “caixinha” de ser um mero usuário de ferramentas computacionais. É preciso ter visão sistêmica, entender problemas globais e ir além de apenas entregar protótipos. É crucial entender que a engenharia moderna se faz de pessoas para pessoas, conectando suas necessidades e requisitos e entregando soluções viáveis sob um olhar técnico, financeiro e social.
Enfrentamos desafios cada vez mais complexos e relevantes: uma fábrica inteligente, uma central de geração de energia sustentável, uma solução de mobilidade urbana, um hospital de referência, uma fazenda conectada. Isso exige capacidade de aprender continuamente diante das rápidas evoluções tecnológicas do setor, e ainda habilidades de comunicação e gestão de equipes multidisciplinares. A formação nessas competências interpessoais é um dos pilares do programa de engenharia do Insper.
Outra preocupação, mas também uma grande oportunidade, é como integrar a inteligência artificial à engenharia mecânica. Sim, essa é uma ferramenta que já extrapolou as fronteiras dos cursos de computação e hoje se apresenta para todas as profissões. Em Engenharia Mecânica, tradicionalmente, resolvemos problemas de forma analítica (usando as tradicionais fórmulas) ou por meio de métodos numéricos (métodos de aproximações e iterações). Hoje, temos uma nova abordagem: usar dados para prever comportamentos, antecipar falhas e, por que não, para repensar projetos e gerar novos insights. Como trabalhar mecânica e projetos baseados em dados, sem perder a parte conceitual? Essa é uma inovação que queremos trazer para nosso curso e para nossos alunos e alunas.
A inteligência artificial vai tirar empregos de engenheiros mecânicos ou vai criar mais oportunidades?
A IA pode dificultar para aquele mero usuário de software, mas criará oportunidades diversas. As empresas têm muitos dados que antes eram coletados apenas para registros históricos e regulatórios. Hoje, esses dados podem ser usados ativamente para se tomarem decisões de engenharia. Em outras palavras, fecham-se algumas portas mais específicas e abrem-se oportunidades para repensar como será feita essa nova engenharia baseada em informações.
Como o curso de Engenharia Mecânica do Insper está estruturado no que se refere ao conteúdo curricular?
Mantivemos tudo que é fundamental: matemática, física, química, e os conceitos específicos de mecânica — projetar e fabricar equipamentos e máquinas. Mas nosso grande diferencial é a construção do curso baseado em projetos, do primeiro ao décimo semestre. Por exemplo, os princípios essenciais de mecânica dos fluidos, mecânica dos sólidos, termodinâmica, materiais, vibrações e manufatura aditiva são ministrados em disciplinas que mesclam aulas conceituais com dinâmicas práticas para a construção de um respirador pulmonar, um coração artificial, uma turbina eólica, uma chopeira etc. Assim, aprende-se engenharia praticando engenharia. Ao longo dessa jornada, são praticados os três pilares fundamentais do curso: além da viabilidade técnica (o tradicional da engenharia), trabalhamos também a viabilidade do desejo do usuário (design) e a viabilidade financeira, econômica e organizacional (empreendedorismo). Na parte profissionalizante, o estudante pode definir caminhos de formação complementar e aprofundamento a partir da escolha de disciplinas eletivas nos temas de bioengenharia, simulação computacional, engenharia da mobilidade, engineering analytics e engineering management, automação, robótica. É ainda ofertada uma série de outros temas transversais à escola, tais como finanças, empreendedorismo, estratégia, políticas públicas, direito etc.
Outro diferencial é o trabalho em equipe intensivo, com alunos gerindo requisitos de projeto, prazos, pressões e conflitos interpessoais desde o início do curso. Tudo isso convivendo dentro de uma ampla gama de laboratórios, que contam com uma das mais modernas infraestruturas do país. Esses laboratórios estão à disposição das atividades acadêmicas do curso e dos estudantes. Assim, no Insper, nosso aluno não fica observando a demonstração de um experimento, mas eles colocam a “mão na massa”, guiados por metodologias ativas de aprendizado. Por fim, nosso currículo, corpo docente e infraestrutura foram recentemente credenciados pela ABET, reconhecendo que o conjunto está alinhado com as mais modernas práticas internacionais de educação e com as últimas tendências de mercado.
Qual a importância dos projetos finais desenvolvidos com empresas?
É fundamental. O Capstone, como chamamos o projeto final do curso, insere o aluno dentro de um problema real de uma empresa. Ele trabalha diretamente com um mentor técnico dessa empresa num problema técnico relevante, mas ainda deve-se atentar a aspectos de design, organização, comunicação, trabalho em equipe e análise de risco.
Por exemplo, temos um projeto com uma grande empresa do ramo de agronegócios para melhorar a qualidade do fornecimento de sementes. O aluno entende como funciona esse mercado específico, os problemas, as demandas. Ao mesmo tempo, acompanha e troca ideias com colegas trabalhando em áreas diferentes — aeroespacial, consultoria, financeiro, saúde. Alguns alunos ainda desenvolvem projetos de conclusão e continuam essas ideias como startups. Isso dá a eles oportunidade para analisar diversos tipos de mercado antes mesmo do estágio. É como diz um de nossos alunos: “O melhor caminho para você entrar no mercado de trabalho é já estar dentro dele”.
Para finalizar, qual o diferencial do engenheiro formado pelo Insper?
Ele tem boa formação teórica e consegue aplicá-la em problemas práticos, porque foi extensivamente treinado a integrar essas duas frente ao longo de todo o curso. Incorpora ferramentas computacionais avançadas, mas as concilia com competências humanas — entende necessidades dos clientes, comunica-se bem e trabalha em equipe.
Alinhado a esse perfil, recebi recentemente um feedback de uma empresa que contratou nossos alunos: são profissionais que lidam bem com projetos complexos. Conseguem entender um problema, planejá-lo e desdobrá-lo em problemas menores, trabalhar com times de especialistas e se comunicar tanto internamente quanto com parceiros externos. Esse feedback resume o que desenhamos para o curso: um profissional com perfil criativo na resolução de problemas, com excelência acadêmica e visão integrada das áreas de conhecimento e que desenvolve competências fundamentais de liderança e comunicação, tornando-se apto a seguir a missão do Insper de transformar o país.