Bruno Toranzo
Serão necessários 50 bilhões de reais anuais para universalizar no Brasil os serviços de saneamento básico até 2033, conforme previsto no Marco Legal do Saneamento, que estabelece as metas de levar água potável para 99% da população e estender a coleta de esgoto para 90% dos domicílios até aquele ano. A projeção é da Inter.B Consultoria, que apontou um crescimento de 16,1% nos investimentos do ano passado, alcançando 24,5 bilhões de reais. Entre os principais desafios para o cumprimento das metas do Marco Legal está o saneamento em áreas irregulares, como favelas e zona rural, tema de um curso de curta duração do Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper, com início no dia 27 de junho. “Sabemos fazer o saneamento em áreas urbanizadas. Esse conhecimento já está assimilado no Brasil. O desafio é promover o saneamento também nas chamadas áreas irregulares, como favelas, e em zonas afastadas, como o ambiente rural”, diz Maíra Bitencourt Rocha, engenheira sanitarista da Diagonal e docente-líder do curso, cujas inscrições estão disponíveis neste link.
Há particularidades nos citados territórios que precisam ser consideradas para que o acesso ao saneamento seja viabilizado. O conhecimento do contexto das favelas, por exemplo, é relevante, permitindo definir de que modo as intervenções serão conduzidas nas comunidades. “Neste ano, estamos remodelando a edição anterior do curso, com a inclusão de áreas como a zona rural, que, assim como as favelas, são desafiadoras para o poder público e as concessionárias”, explica Maíra. Existe a necessidade, segundo a especialista, da adoção nesses locais de outras tecnologias na infraestrutura de saneamento, como as baseadas na natureza, estando entre elas a de jardins filtrantes.
O que também pode fazer a diferença para esses locais distantes são os modelos de associação para operar os sistemas, como o Sisar (Sistema Integrado de Saneamento Rural), que surgiu em 1996 no Ceará. O Sisar é formado pelas associações comunitárias que têm sistemas de abastecimento de água e esgoto pertencentes à mesma bacia hidrográfica. Nessa federação de associações, a contribuição mensal financia uma estrutura responsável pela manutenção dos sistemas, pelo fornecimento de insumos e pela capacitação social.
O objetivo é evitar o sucateamento prematuro da infraestrutura de abastecimento de água e de esgotamento sanitário construída. Para isso, as comunidades beneficiadas recebem palestras de educação sanitária, uso racional dos recursos hídricos e atividades de capacitação social. No total, são 164 municípios atendidos pelo programa, 2.302 localidades abastecidas e mais de um milhão de beneficiados.
“Não é apenas a tecnologia que vai promover a universalização, mas a gestão dos sistemas depois da sua implantação. Na zona rural, a viabilidade financeira para a operação dos sistemas é mais complicada, motivo pelo qual os modelos associativos aparecem como solução possível”, pontua a especialista. No curso, esses modelos serão aprofundados, permitindo ao aluno compreender o seu funcionamento no âmbito da universalização.
Paralelamente à associação, tem crescido a aplicação do sistema condominial, cuja premissa é possibilitar passar a rede de esgoto por onde é possível — diferentemente do modelo tradicional, que deve seguir as ligações e estrutura já construídas. Para tanto, esse método do sistema condominial considera o contexto da região onde será feita a obra de saneamento e a participação popular como condições essenciais para o desenho das soluções necessárias.
“Por meio do sistema condominial, faço a customização da infraestrutura de saneamento porque a rede vai passar por onde der, por onde a realidade desses locais permitir. O importante disso tudo é coletar o esgoto e levar para o sistema de tratamento”, explica Maíra, que dá como exemplo bem-sucedido o saneamento das favelas próximas ao Rio Pinheiros, em São Paulo. Por fim, o curso mostrará a relevância de integrar os quatro blocos do saneamento — água, esgoto, resíduos e drenagem — para que ocorra sua efetiva universalização.