[{"jcr:title":"O futuro do Rio Grande do Sul"},{"targetId":"id-share-1","text":"Confira mais em:","tooltipText":"Link copiado com sucesso."},{"jcr:title":"O futuro do Rio Grande do Sul","jcr:description":"Após a trágica inundação de maio, a economia do estado pode levar de três a quatro anos para se recuperar, disse o economista americano Harrison Hong, pesquisador de finanças ambientais, em palestra no Insper. E deveria gastar 1% de seu PIB em obras de preparação contra novos desastres"},{"subtitle":"Após a trágica inundação de maio, a economia do estado pode levar de três a quatro anos para se recuperar, disse o economista americano Harrison Hong, pesquisador de finanças ambientais, em palestra no Insper. E deveria gastar 1% de seu PIB em obras de preparação contra novos desastres","author":"Ernesto Yoshida","title":"O futuro do Rio Grande do Sul","content":"Após a trágica inundação de maio, a economia do estado pode levar de três a quatro anos para se recuperar, disse o economista americano Harrison Hong, pesquisador de finanças ambientais, e m palestra no Insper . E deveria gastar 1% de seu PIB em obras de preparação contra novos desastres   David A. Cohen   Há quatro cenários possíveis para uma região atingida por um desastre natural como o que assolou o Rio Grande do Sul no início de maio, afirmou o economista Harrison Hong, professor de finanças na Universidade Columbia, em palestra no auditório do Insper no último dia 17 de maio. O mais otimista, apelidado de destruição criativa, considera que nos esforços de reconstrução a região encontra oportunidades novas e, após um breve período de trauma, chega a uma situação melhor do que a anterior. O segundo mais otimista, chamado de “reconstruir melhor”, é autoexplicativo: não se encontram caminhos radicalmente novos, mas o desastre, lá na frente, leva a uma estrutura mais resistente e robusta, com ganhos para a economia e o bem-estar da população. Um terceiro caminho seria o de alguns anos de baque com uma paulatina recuperação até um nível bem parecido com o que havia antes da tragédia. Finalmente, o cenário mais pessimista considera que a região, mesmo depois de vários anos, não atinge o nível de riqueza que experimentava antes. Hong, um brilhante pesquisador que em 2009 recebeu o prestigiado Fischer Black Prize, outorgado a cada dois anos a um estudioso com menos de 40 anos por pesquisas originais em finanças, veio ao Brasil para a homenagem que o Insper prestou a seu ex-professor e atual colega José Alexandre Scheinkman (leia sobre a homenagem [ aqui ](https://www.insper.edu.br/noticias/o-amplo-espectro-de-scheinkman/) ). Havia planejado falar sobre outro tópico mas, ante a catástrofe no estado gaúcho, reverteu a palestra, com base em um curso de finanças ambientais que montou junto com Scheinkman para o programa de doutorado de Columbia. É uma área em efervescência. “Embora haja um consenso hoje sobre a ocorrência de impactos derivados das mudanças climáticas, os modelos sobre como estes impactos vão se dar, e sua frequência, variam muito”, disse Hong. É por isso que tanto ele quanto Scheinkman andaram trabalhando, nos últimos cinco ou seis anos, entre si e com outros coautores, para tentar trazer soluções de economistas para a crise climática. E a primeira grande questão, no caso atual do Rio Grande do Sul, é: qual dos quatro caminhos a região vai seguir? Uma análise dos dados de cerca de cem países atingidos por ciclones e ondas de calor entre 1980 e 2019 dá uma boa pista do que acontece com a economia desde três ou quatro anos antes do desastre até quatro anos depois do desastre. Em linhas gerais, temos o terceiro cenário — recuperação até o nível anterior, mas depois de alguns anos de sérias perdas — para o PIB da região. “Isso acontece principalmente porque os investimentos caem”, explica Hong. É fácil de entender. No primeiro momento, há uma grande perda de capital graças à devastação provocada pelo evento climático. Em seguida, vem a incerteza: será este o “novo normal”? A partir de agora teremos inundações mais frequentes, ou ondas de calor mais graves? Essa incerteza segura investimentos. Um terceiro fator é que parte dos investimentos é dirigida para a recuperação e, mais, para adaptação e prevenção de catástrofes. Na média, portanto, o PIB cai e fica abaixo do esperado por três anos; os investimentos caem; o consumo se mantém; a dívida pública, como resultado, aumenta e o mercado de capitais segue o mesmo padrão de queda por três ou quatro anos. Há mais uma má notícia: a base de dados aponta que, após sofrer um grande evento trágico, uma região tem mais chance de sofrer outro. Ou seja, o impacto econômico sobre uma região é composto dos danos diretos — perda de vidas, interrupção de atividades, destruição de capital etc. — e dos danos indiretos, devidos à necessidade de se preparar para futuros eventos similares (elevação de estradas, instalação de sistemas de alarme, reformas com novos padrões de segurança e por aí vai). Antes tarde do que nunca Investir em preparação contra desastres climáticas é essencial, mesmo depois que a tragédia já tiver ocorrido, diz  Harrison Hong    Uma das conclusões de seus estudos é que as regiões atingidas por desastres devem investir em preparação contra tragédias climáticas. Não se parece com colocar uma tranca depois que a porta foi arrombada? Sim. O ideal seria estar preparado antes do evento. Mas o nível de consciência de uma sociedade em geral não permite que se façam esses gastos previamente. Tipicamente, as pessoas não prestam muita atenção ao tema… a não ser logo depois de desastres. E nem sempre é o primeiro desastre que leva a uma alta percepção do risco. Temos uma simulação da consciência que funciona mais ou menos assim: o nível de preocupação com eventos climáticos começa perto de zero. Quando ocorre algo como uma inundação, ele imediatamente sobe. Mas, conforme o tempo passa, vai caindo de novo. Então, se ocorre um segundo evento, a preocupação atinge um novo patamar, um pouco mais alto do que o anterior, para novamente começar a cair. E assim vai, num aprendizado aos saltos, até que a população se convence da necessidade de investir em preparação.   Uma crítica que se costuma fazer é que gastar com prevenção não rende votos… É uma boa questão. Nas áreas que foram afetadas por grandes desastres, minha impressão, olhando os dados, é que você vê governos aptos a aumentar seus investimentos em adaptação, e eles tipicamente financiam isso com algum tipo de taxas sobre propriedade, porque primariamente são as propriedades que são destruídas. Quando você diz aos donos de imóveis que nós precisamos ter alguma taxa de propriedade para ajudar a reconstruir, limpar, prevenir… pelo menos nos Estados Unidos, politicamente, depois de desastres, governos municipais têm sido capazes de aprovar medidas de adaptação.   Quanto tempo demora para construir o consenso de que o gasto com prevenção e preparo para desastres é prioritário? Depois de um desastre, os governos não deviam esperar nada. Este é o momento em que o público está mais pronto para apoiar essas políticas. No nosso modelo de análise, com a passagem do tempo as pessoas ficam mais relaxadas, porque esquecem do desastre. E é compreensível, porque há uma grande incerteza: será que aquilo foi um exceção raríssima, ou a partir de agora vai acontecer muitas vezes?   Mesmo sem ter certeza, é melhor investir nas obras de preparação? Como dosar esses gastos? O mínimo a fazer é aprovar algum orçamento que preveja a adaptação. A justificativa é: “nós tivemos um grande desastre, vamos passar um orçamento para os próximos poucos anos”. Deve-se explicar para as pessoas que, sem uma limpeza geral, sem projetos como elevação de estradas, vai ser muito difícil fazer a economia voltar ao que era. Nós sabemos disso pela experiência de outros países que foram afetados por enchentes.   Que é preciso investir em preparação não há dúvida. A questão é quanto transformar a infraestrutura, quanto gastar… Isso eu acho que se pode avaliar usando algumas das análises empíricas, ver o quanto outros países mudaram depois de grandes desastres. Quanto eles aumentaram seu orçamento de adaptação e se eles tiveram bons resultados. Dá para usar a comparação porque todo país que está bem preparado agora já esteve, em algum momento, despreparado. E aí eles perceberam que estavam sendo afetados demais, se convenceram de que sempre sofreriam esse tipo de desastre.   Quanto custa estar bem preparado? Tipicamente os países bem preparados para enfrentar desastres climáticos gastam por volta de 1% do PIB anualmente. É o que se deve esperar para o Rio Grande do Sul, cerca de 1% do PIB regional. Isso é um aprendizado, pode variar. O modelo vai dizer que, se você começa a notar mais impactos, deve aumentar o gasto; se não tem ocorrências há algum tempo, talvez possa diminui-lo um pouco.   E os outros estados, deveriam tirar lições da tragédia também? Bom, você deveria perguntar, e isso é bastante factível, em diferentes estados do país quais são os dois ou três tipos de desastre mais prováveis de acontecer, quais foram os registros históricos, quais foram os danos.   Em geral os governos acabam usando as verbas de preparação para desastres em outras áreas, em que há mais pressão política por investimentos… Isso é parte do problema. Mas você tem que comparar o retorno dos investimentos. Se você diz que, em vez de preparação contra enchentes, vai gastar com x ou y, precisa calcular o que esse gasto vai representar em crescimento do PIB. Dificilmente será maior do que o retorno de estar preparado para um desastre. Isso no longo prazo, é claro. Eu mostrei a tabela de países, há uma diferença enorme entre países mal e bem preparados contra desastre: em algumas décadas, é a diferença entre ser um país pobre e ser um país que oferece bem-estar aos cidadãos. Minha estimativa é que a perda de PIB no Rio Grande do Sul vai ser de pelo menos 1%, podendo chegar a 3%. Ou seja, esse desastre vai arrasar um ano inteiro de crescimento. É bastante difícil encontrar algum investimento mais importante do que a prevenção. Eu entendo: seguros são altamente valiosos, mas as pessoas não pensam neles dessa forma."}]