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Decisões do STF geram impactos financeiros que precisam ser mensurados

Em palestra no Insper, o economista Guilherme Mendes Resende falou sobre como a análise econômica do direito auxilia ministros em julgamentos no Supremo Tribunal Federal

Em palestra no Insper, o economista Guilherme Mendes Resende falou sobre como a análise econômica do direito auxilia ministros em julgamentos no Supremo Tribunal Federal

Guilherme Mendes Resende com professores do Insper (2)
O economista Guilherme Mendes Resende (primeiro à esquerda) com professores do Insper 

 

Bruno Toranzo

 

A combinação entre Direito e Economia, por meio da análise econômica do direito, tem sido ferramenta importante para uma compreensão mais profunda do alcance das decisões em temas diversos, ligados, por exemplo, a questões sociais, ao âmbito fiscal e a políticas públicas. O Supremo Tribunal Federal (STF) inovou neste ano ao criar uma equipe econômica para dar apoio às suas decisões judiciais e para a gestão orçamentária da Corte, demonstrando como a pauta econômica está entre as prioridades do órgão máximo do Poder Judiciário.

No dia 18 de março, o economista Guilherme Mendes Resende, assessor especial da Presidência do STF, deu palestra no Insper sobre o espaço de atuação dos economistas, ainda pouco explorado em processos judiciais, bem como os benefícios da análise econômica para os operadores do direito. O evento, aberto a alunos de graduação e pós-graduação, foi promovido pelo Centro de Regulação e Democracia (CRD) do Insper e pela Cátedra Família Martinez Goldberg.

“O ministro Luís Roberto Barroso, atual presidente do STF, fez uma reestruturação no gabinete da presidência em uma área que se chama assessoria de apoio à jurisdição, com a criação de três núcleos. Estou inserido no núcleo de processos complexos e estruturais”, explicou Resende, Ph.D. em economia pela London School of Econmics (LSE) e ex-economista-chefe do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Os processos complexos são aqueles cuja decisão judicial trará impactos consideráveis em termos econômicos. “Não há nada carimbado definindo o processo como complexo, não há uma receita pronta para isso. Esses casos são identificados no dia a dia por terem potencial de causar grande impacto econômico, motivo pelo qual um parecer sobre essas consequências é solicitado para que possa servir de insumo para a decisão que será tomada”, disse o economista.

 

Estado de coisas inconstitucionais

Já os processos estruturais são aqueles cuja solução extrapola a decisão em um único caso concreto, como usual em temas relacionado a políticas públicas. “O STF tem recorrido a esses processos com mais frequência nos últimos tempos. Caso recente envolveu o sistema carcerário, com a identificação pela Corte de um estado de coisas inconstitucionais nos presídios”, observou Resende. Em vez de decidir pontualmente, o STF solicita ao Executivo um plano de curto, médio e longo prazos para solucionar o problema, já que, por ser estrutural, a Corte sabe que não será resolvido somente por meio de uma decisão pontual.

Ao pedir esse plano, é preciso conceder um tempo razoável para que o Estado possa implementá-lo, passando antes pela validação do próprio Supremo. “Nesse contexto, o STF precisa de uma equipe que analise esse plano, verificando a existência de indicadores de monitoramento, de implementação, matriz de riscos, responsabilidades definidas, o que permitirá sua execução nos próximos anos, passando, portanto, pelo crivo do nosso núcleo”, explicou o economista. O objetivo é mitigar o problema e, depois de alguns anos, com a execução bem-sucedida do plano, eliminá-lo por completo, resolvendo os problemas identificados. Outra decisão muito comentada foi a das terras indígenas, com destaque para a desintrusão — retirada dos invasores — e o cuidado com a saúde dos indígenas. “Uma decisão pontual do STF dificilmente vai resolver esse tipo de problema. Você precisa de um plano para garantir que os invasores expulsos não retornem às áreas. Daí a classificação desse tipo de processo como estrutural.”

 

Correção do saldo do FGTS

Um processo complexo que contou com a contribuição de Resende foi referente à aplicação da taxa referencial (TR) na correção dos saldos das contas vinculadas do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço). Nesse julgamento, que ainda está em andamento, três ministros foram favoráveis a assegurar que o conjunto da remuneração do FGTS seja, no mínimo, igual ao da poupança. A ação direta de inconstitucionalidade, que deu origem a esse caso, defende que a utilização da TR, índice inferior ao da poupança, corrói o patrimônio do trabalhador, já que não repõe as perdas inflacionárias.

“A solução, portanto, seria igualar a remuneração do FGTS à da poupança. O Ministério da Fazenda apresentou relatórios da Caixa com simulações de impacto para o orçamento geral da União considerando essa modificação. Com base nessa e em outras análises, além de dados econômicos, como as projeções para a Selic disponíveis no Boletim Focus, chegamos à constatação de que o cenário ideal seria corrigir apenas os novos depósitos do FGTS pela regra da poupança e somente a partir de 2025. Ou seja, o caminho seria adotar uma modulação na decisão, assegurando que os depósitos antigos não sofressem alteração”, explicou Resende. Nesse caso, há, portanto, uma preocupação de conciliar o interesse legítimo dos trabalhadores com os impactos na área fiscal do governo. “Nossa função é mostrar os diferentes cenários econômicos para os ministros, dando insumos para que eles tomem suas decisões.”

 

Quando as execuções fiscais não compensam

Por fim, outro caso recente, da última sessão do ano passado, versou sobre a possibilidade de os juízes extinguirem o processo de execução fiscal porque sua tramitação custa mais, para o Estado, do que o valor da causa. O custo médio de um processo de execução fiscal está por volta de R$ 10 mil, de acordo com estudo realizado em 2015 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

“Não faz sentido, do ponto de vista econômico, acionar a máquina pública para gastar R$ 10 mil em uma execução fiscal, por exemplo, de IPVA em valores inferiores a esse”, observou Resende. O Plenário do STF seguiu essa linha de raciocínio ao decidir que os juízes estaduais podem extinguir a execução fiscal de baixo valor pela ausência de interesse de agir, de acordo com o princípio da eficiência administrativa, respeitada a competência constitucional de cada ente federado.

 

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