No dia 15 de setembro, pesquisadores do Insper, acadêmicos e especialistas de governos e da sociedade civil vão discutir os desafios da agenda racial
Leandro Steiw
O evento anual do Núcleo de Estudos Raciais do Insper (NERI) será realizado no dia 15 de setembro, com o tema “A Cor da Desigualdade”. Os pesquisadores apresentarão os estudos desenvolvidos no último ano e debaterão ideias em políticas públicas, desigualdade educacional, violência e desdobramentos da desigualdade racial com especialistas da academia, do governo e de organizações da sociedade civil. As conversas ocorrerão no Auditório Steffi e Max Perlman, no Insper, das 8h30min às 17h, com transmissão online.
Num primeiro momento, o evento é uma forma de mostrar e repercutir os trabalhos apoiados por financiadores como a Open Society Foundations e o Instituto Ibirapitanga. “Também poderemos conversar com a sociedade sobre esses resultados e os desafios da agenda racial”, diz o economista Michael França, coordenador do núcleo. “Quando se olha com bastante cuidado para essa agenda, evidentemente encontram-se alguns progressos. Mas, em algumas áreas, não se avançou quase nada.”
Muitos desses pontos estão retratados no livro que o núcleo lançará em outubro, uma síntese de pesquisas e análises baseadas em dados de educação, mercado de trabalho e violência. A publicação pretende suprir uma lacuna na literatura baseada em evidências nas áreas racial e de gênero no Brasil, principalmente na comparação aos países mais consolidados em análise e divulgação de estatísticas. As investigações científicas ainda são tímidas diante do tamanho do desafio, observa França.
Um relatório recente do NERI, por exemplo, indica que a média de desempenho dos alunos do 5º ao 9º ano do Ensino Fundamental aumentou em todos os estados brasileiros. Porém, de 2007 a 2019, cresceu a disparidade de notas entre crianças brancas e negras, particularmente entre as pretas. As informações sobre raça e gênero do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) revelam até mesmo um incremento no desnível na educação, favorável aos homens brancos.
Na questão da violência, entre a camada mais jovem da população, cerca de 80% das vítimas de homicídios são negras. Também no mercado de trabalho, quando levados em consideração trabalhadores com características produtivas semelhantes, as pessoas negras recebem salários 15% inferiores – diferença que permaneceu relativamente constante nos últimos 40 anos. “Estamos falando de um país que passou pela redemocratização, com governos de esquerda e direita, e que não está conseguindo fechar esse gap condicional, assim chamado quando se colocam todos os controles possíveis”, afirma França.
O privilégio desses 15% de gap salarial pode ser mensurado. Se um trabalhador branco poupasse e aplicasse esse valor em um fundo de renda fixa, por exemplo, ele conseguiria tirar um ano de férias a cada intervalo de cinco anos — e mesmo trabalhando todos os dias os profissionais negros não acumulariam patrimônio similar. “Observando a evolução histórica dos dados, é preocupante que o Brasil tenha caminhado pouco ou quase nada em várias áreas, apesar de todas as políticas públicas implantadas”, diz França.
Uma década atrás, em meio ao debate sobre a implantação das cotas raciais para ingresso na universidade, havia o argumento de que o investimento na educação básica seria suficiente para reduzir as desigualdades de acesso ao ensino superior. “Concordo que temos que melhorar a educação básica, mas qual seria o cenário sem a política de cotas se a disparidade racial cresceu nesse período?”, questiona França. “A lacuna na educação estaria pior e não teria havido nem a formação de negros desfavorecidos que pudessem pressionar por outras políticas públicas e por um país diferente, como aconteceu.”
A expectativa do núcleo é intensificar o estudo sobre questões sociais e de raça, apresentando dados e fatos e instigando o bom debate. Nesse sentido, França lança outra interrogação: “Vamos continuar sendo esse país excludente em relação à raça, gênero e classe social ou tentaremos fazer algo a mais, pensando um pouco melhor nas nossas políticas públicas? Os avanços são muito residuais. A distância continua se ampliando. Não tenho dúvida de que a sociedade, no aspecto geral, fica incomodada com as injustiças. A grande questão é o que vamos fazer a partir desse incômodo”.
Durante cada um dos quatro painéis de “A Cor da Desigualdade”, os pesquisadores do NERI apresentarão os seus estudos e a evolução dos dados ao longo do tempo. Em seguida, os convidados farão uma reflexão livre sobre o tema. Ao final dos comentários, haverá uma sessão de perguntas aberta ao público. “Será um espaço para trocas entre pessoas de diferentes áreas e para pensar um pouco mais na pauta das desigualdades”, afirma França. A programação pode ser conferida neste link.