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Retomada Econômica Verde aponta desafios e oportunidades da neutralidade de carbono

Seminário realizado no Insper apresentou uma agenda propositiva para o Brasil vencer a transição energética, tecnológica e climática

Seminário realizado no Insper apresentou uma agenda propositiva para o Brasil vencer a transição energética, tecnológica e climática

 

Leandro Steiw

 

A emergência climática impõe desafios e, em contrapartida, oferece oportunidades para o desenvolvimento do Brasil. Uma série de condições que o país precisará atender na transição para a neutralidade de carbono foi apresentada no dia 30 de maio, no seminário “Retomada Econômica Verde: Aprendizados para a Construção da Agenda Brasileira”, promovido pelo Insper, pelo Instituto Democracia e Sustentabilidade, pela plataforma Por Quê? – Economês em bom português e pelo Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper.

O projeto Retomada Econômica Verde teve como embrião o debate que se seguiu a uma palestra de João Pedro Matos Fernandes, ministro do Ambiente e da Ação Climática de Portugal, em um evento promovido em março de 2020 pelo Arq.Futuro. Na ocasião, ele apresentou o ambicioso plano de neutralidade de emissões de carbono de Portugal — o primeiro país a implantar um plano de descarbonização integral. “Fernandes abordou a tensão existente entre a preservação dos recursos naturais e a necessidade de desenvolvimento econômico, em um modelo econômico baseado na racionalidade da suficiência e na autossustentabilidade”, recordou Tomas Alvim, coordenador geral do Laboratório do Insper, na abertura do seminário.

A agenda propositiva foi um trabalho de dois anos de pesquisa, informou a professora Priscila Claro, líder do Centro de Sustentabilidade e Negócios do Insper. Considerando que as experiências de outros países podem inspirar o Brasil a construir a sua própria estratégia, analisaram-se dados de Chile, França, China e Estados Unidos. “O Brasil tem todas as condições de ser um líder nessa agenda”, disse Priscila. “É a oportunidade de frear o aquecimento global e nos adaptarmos às mudanças climáticas ao mesmo tempo que criamos oportunidades de emprego e renda.”

No caminho, há questões como o esvaziamento de órgãos de controle no governo passado e a urgência em alguns debates no Congresso, como o mercado regulado de carbono. “A sociedade civil conhece pouco e, talvez por isso, entenda pouco como o clima tem a ver com cada um de nós e com todos”, afirmou Priscila.

No entanto, ela citou como o novo governo tem colocado o meio ambiente e o clima como prioridade e oportunidade na agenda política — evidenciado no comprometimento público doméstico e internacional, na integração e articulação transversal dos temas entre os ministérios e na escolha de Belém, no Pará, como sede da COP-30, a conferência mundial sobre mudanças no clima.

Desta forma, se impõem desafios como a participação social e o engajamento público na agenda climática, o letramento e a sensibilização de toda a sociedade e a articulação e a integração dos diferentes setores econômicos. Será preciso viabilizar investimentos públicos e privados, por exemplo, via orçamento do Ministério do Meio Ambiente, Fundo do Clima e Fundo Amazônia. E também incentivos à bioeconomia, à adaptação climática das cidades, às energias renováveis, ao saneamento básico e à restauração florestal — com geração de emprego e renda.

 

Retomada Economica Verde
Um dos painéis do seminário 

 

Opinião convergente

No seminário que marcou o lançamento do relatório, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, disse que converge com boa parte das questões apresentadas no estudo. “Vamos trabalhar para o que o Brasil seja o país da transição energética e da transição para uma agricultura de baixo carbono e nos tornarmos grandes exportadores de sustentabilidade”, afirmou. Conforme Marina, a política do novo governo tem a ver com o desafio de fortalecer a democracia no país e enfrentar a crise social e ambiental, além da crise advinda da extinção de empregos pela revolução tecnológica e da insegurança alimentar de 125 milhões de brasileiros.

Os resultados dos investimentos de mitigação das mudanças climáticas devem abrir um novo ciclo de prosperidade e uma nova forma de produzir e consumir, na opinião da ministra. Ela citou o Reino Unido, a União Europeia e a China como exemplos de esforço no comprometimento com as metas contra o aquecimento global. “O Brasil pode fazer a diferença na emissão de carbono na atmosfera e já deveríamos estar fazendo esse dever de casa”, disse. Entre as ações que pretendem reenquadrar o país na agenda do clima, Marina citou também o combate às injustiças climáticas e ao racismo ambiental, que ficaram nítidas nos recentes desastres registrados no litoral de São Paulo.

Para Ricardo Young, presidente do Instituto Democracia e Sustentabilidade, o Brasil pode nadar de braçada no cenário de desenvolvimento sustentável. Uma das incoerências está no fato de o país ser quinto maior emissor de carbono do mundo, mas apenas a décima economia. “Não podemos justificar por que transformarmos nossos ativos do meio ambiente em emissão de gases”, afirmou. “O relatório mostra o que está sendo feito em outros países no controle da emissão, e estamos oferecendo ao governo em busca de uma resposta à sociedade de qual será o nosso modelo de país.”

Sergio Leitão, diretor executivo do Instituto Escolhas, acredita que o grande empecilho é que o cenário mudou em relação há 20 anos. “O país está dividido e tem um Congresso que exerce poderes como nunca”, disse. “Uma parte das forças econômicas deste país passou a acreditar que a legislação ambiental havia entrado no domínio econômico. Desde então, tem sido constante o ataque às regras ambientais. O confronto agora é interno. O que vamos aceitar no acordo da transição para a sustentabilidade? A sociedade ambiental precisa entender que terá que fazer esse acordo ou vai ficar minoritária no debate.”

O embaixador André Corrêa do Lago, secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, concordou parcialmente com a avaliação de divisão interna. “Todos os países estão internamente divididos”, afirmou. “Os países mais barulhentos são aqueles que têm enorme dificuldade em resolver internamente como vai se dar a transição. Contra a paranoia de que o que vem de fora é contra o crescimento do Brasil, vamos precisar da academia e da sociedade civil para esse debate muito apertado.”

Segundo Corrêa do Lago, o Brasil precisa do dinheiro de fora, como o Fundo Amazônia. “Por outro lado, sabemos que não precisaríamos do dinheiro, porque existe a solução que procuramos no Brasil”, disse. “Não conheço nenhum país em desenvolvimento que possa fazer melhor do que o Brasil nessa agenda.” Para ele, o problema de evitar a transição energética e tecnológica em prol da sustentabilidade não é questão de quanto dinheiro outros países darão ao Brasil, mas como essas economias vão lidar com os produtos brasileiros.

João Paulo Capobianco, secretário executivo do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, discordou da visão de fim do mundo e da destruição total na política ambiental baseada na atuação do Congresso. “Há certa ansiedade que pode ser paralisante, que você não pode se deixar levar quando está no governo”, afirmou. “O governo tem um grupo muito ativo em mercado de carbono regulado. Vamos negociar com o Congresso qual é a melhor maneira de entrar com o projeto. A sociedade mudou. Tivemos quatro anos de trevas, de uma conjunção baixo astral de governo e Congresso. Agora é o momento de avançar e cobrar.”

 

Vantagem competitiva

O potencial na geração de energia solar e eólica foi destacado por Luciana Costa, diretora de Infraestrutura, Transição Energética e Mudança Climática do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. “Vamos precisar do hidrogênio verde para fazer a transição”, disse. “Hoje, 70% do custo do hidrogênio verde é energia, e o Brasil tem uma energia das mais baratas do mundo. Temos vantagem competitiva nas fontes solar e eólica, e a maioria da nossa matriz já é renovável, diferentemente do resto do mundo. Também em biomassa e biocombustível. O problema é que, para investir no Brasil, o custo do nosso capital é mais caro do que na Europa, por exemplo.”

Para Juliana Lopes, diretora de Natureza e Sociedade do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável, é um imperativo ter governança ambiental, social e corporativa para fazer negócios. “A regra do jogo mudou, e as empresas responsáveis partem da base do consumo limpo e sustentável”, afirmou. “Temos uma massa crítica do setor empresarial brasileiro sinalizando que quer a regulação do mercado de carbono. Podemos ser o primeiro país a se tornar uma economia neutra e ajudar outros países a atingir essa meta. Então, usar essa moeda do carbono para materializar o desenvolvimento econômico.”

A agenda que o Brasil está discutindo só vai decolar se for dada atenção à Amazônia, na opinião de Beto Verissimo, cofundador do centro de pesquisa Imazon e diretor do Centro de Empreendedorismo da Amazônia. Ele comentou que a região é responsável pela sexta emissão de carbono do mundo e abriga uma área equivalente ao estado de São Paulo em desmatamento e degradação. No entanto, participa com menos de 9% do Produto Interno Bruto do país — isto é, a sua exploração, embora intensa, representa muito pouco na economia brasileira.

Verissimo citou um estudo da Universidade Princeton, nos Estados Unidos, na qual é professor visitante. Uma simulação de planeta sem a Amazônia revelou um cenário catastrófico para a agricultura, com alterações na quantidade e na regularidade das chuvas, além do aumento das temperaturas nas cidades brasileiras. “Para criar um ambiente de investimento na Amazônia, vamos precisar dela”, disse.

 

Retomada Econômica Verde
Participantes do encontro realizado no Insper

 

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