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A importância da gestão e mitigação de riscos no agronegócio

A sustentabilidade das cadeias do agro passa pela gestão adequada dos riscos que envolvem cada etapa do processo produtivo

A sustentabilidade das cadeias do agro passa pela gestão adequada dos riscos que envolvem cada etapa do processo produtivo

Tecnologia no campo
Agronegócio é uma “fábrica a céu aberto” com características peculiares (Foto: Wenderson Araujo/Trilux/CNA)

 

Wellington Souza*

 

Sob a ótica do produtor, o risco no agro já começa pelo simples fato de sua atividade ser como uma “fábrica a céu aberto”. Eventos pouco previsíveis, como condições climáticas adversas, podem levar a uma frustração de safra, resultando em perdas elevadas em produtividade em decorrência de secas, geadas ou até mesmo chuvas em excesso. Se não bastasse a questão climática, existem também riscos fitossanitários e sanitários, oriundos de pragas ou doenças, que podem impactar a lavoura ou a criação de animais.

Essa “fábrica a céu aberto” geralmente também possui um ciclo operacional mais longo do que a maioria das atividades industriais. Enquanto a indústria de transformação tem a seu favor a possibilidade de transformar uma matéria-prima num produto acabado em poucos dias, horas ou até mesmo segundos, a produção no campo, por mais tecnológica que seja, tem que respeitar a natureza do ciclo de produção da atividade.

Se considerarmos as culturas de soja e milho, os principais grãos produzidos no Brasil, o tempo entre a semeadura e a colheita leva, em geral, entre 90 e 120 dias. Há também de se considerar o tempo de preparo do solo, que pode chegar a 3 meses. Portanto, estamos falando de 6 ou 7 meses entre o início da preparação do solo e o momento da colheita e comercialização.

Durante esse período, além das intempéries climáticas e fitossanitárias, também é necessário lidar com a volatilidade no mercado, instabilidade política e, consequentemente, flutuações nos preços das commodities e de moedas como o dólar e o euro. Portanto, é essencial que sejam adotadas estratégias visando à gestão de riscos para proteger o negócio dos produtores rurais. E há diversas formas de mitigar riscos no agronegócio.

A diversificação de culturas é uma delas. Se uma cultura for afetada negativamente por fatores externos, outras culturas podem compensar as perdas. Nesse sentido, a rotação de culturas, além de ser benéfica para o solo, pode fazer o papel de diversificação para redução dos riscos. Uma possibilidade que tem sido cada vez mais recorrente é a ILP (Integração Lavoura-Pecuária) ou a ILPF (Integração Lavoura-Pecuária-Floresta), que são bons exemplos de diversificação e que estão também associadas à sustentabilidade econômica, ambiental e social. Essa produção baseada em diferentes atividades no mesmo espaço, além de garantir o sequestro de carbono e possibilitar temperaturas mais amenas com maior umidade, também gera aumento da produtividade e maior estabilidade em face das oscilações de mercado.

Outra importante ferramenta de proteção é o seguro agrícola. Contratar um seguro agrícola adequado é uma maneira eficaz de proteger as lavouras e o gado contra riscos imprevisíveis, como condições climáticas adversas, incêndios, pragas e doenças. O seguro agrícola pode fornecer indenizações que ajudam a cobrir os prejuízos financeiros decorrentes desses eventos. Os seguros podem ser subvencionados pelo governo por meio do PSR (Programa de Subvenção ao Prêmio de Seguro Rural), que oferece ao produtor rural a possibilidade de proteger sua produção com custos reduzidos, por meio de auxílio financeiro do governo federal.

Para mitigar os riscos de mercado, aqueles que são associados a variações nos preços das commodities e de moedas estrangeiras, o produtor rural pode recorrer a diversos instrumentos financeiros de hedge. Essas operações podem ser contratadas junto a fornecedores de insumos, trading companies e instituições financeiras.

Fora do sistema financeiro tradicional, há as operações de barter, que consiste numa transação que envolve a troca direta, sem utilização de dinheiro como meio de pagamento. Trata-se de uma boa opção de proteção para os produtores de menor porte, que não têm acesso a instrumentos de hedge mais sofisticados. O produtor, nesse caso, recebe insumos que podem ser fornecidos por uma trading, revenda ou indústria e, em contrapartida, compromete-se a entregar a safra futura, mediante a emissão de um título de dívida, a CPR (Cédula de Produtor Rural). Essa operação, embora tenha um custo financeiro elevado por causa dos termos da troca negociada, possibilita que o produtor “trave” o seu custo de produção ao preço de venda do grão.

No sistema financeiro, as operações de hedge estão se tornando cada vez mais disponíveis para produtores rurais mais bem estruturados. A maioria dessas operações, que são contratadas junto aos bancos e corretoras, envolve a necessidade da existência de um limite de crédito pré-aprovado para o produtor contratar a operação.

Também estão nas prateleiras dos principais bancos que operam com a cadeia do agronegócio as operações de swap e de NDF (Non Deliverable Forward).

As operações de swap consistem numa troca de indexadores. Geralmente, elas são contratadas para proteção contra a variação das taxas de câmbio, principalmente do dólar. O produtor, com o receio de que o dólar caia no momento que for realizar a venda da commodity, troca esse ativo em dólares — que pode ser a saca de soja — a uma taxa prefixada. Neste caso, o produtor que estava “ativo em dólares”, com a contratação de uma operação de swap, fica “passivo em dólares” e “ativo em taxa fixa” em reais. Com isso, ele elimina a variação cambial sobre o montante da operação de swap contratada e passa a ter um recebível em reais.

As operações de NDF podem ser contratadas tanto para fixar a moeda dólar quanto para travar o preço da commodity agrícola numa data futura. Por meio dessa operação, o produtor de soja que, por exemplo, “vende” uma NDF poderá fixar o preço de venda da commodity até o momento da colheita ou da comercialização do grão, a depender da sua estratégia comercial. Essa fixação de preços poderá ocorrer em dólares ou em reais. No vencimento da operação, se o preço de mercado ficar abaixo do contratado, o produtor recebe a diferença do banco. Mas se o preço de mercado ficar acima do negociado, o produtor é quem paga a diferença para o banco.

Mas há também o NDF de dólares ou de euros, para proteção contra o risco de variação cambial. Essas operações têm por finalidade possibilitar o chamado hedge cambial, que protege a empresa da oscilação no preço da moeda estrangeira. Portanto, para o produtor ficar protegido, é necessário fixar tanto o preço da commodity quanto a cotação do dólar, que é a moeda na qual o produto é negociado no mercado internacional.

Além das operações de swap e NDF, existem as operações que podem ser contratadas em bolsa de valores, que são os contratos futuros e os contratos de opções. Para contratar essas operações na B3, é necessário depositar garantias, os chamados “depósitos de margem”. Eles servem para dar segurança e liquidez nessas operações e evitar inadimplência de uma das contrapartes que tiver de honrar seus compromissos.

Os contratos futuros são instrumentos financeiros que possuem ajustes diários. Eles consistem em duas pontas: a “ponta compradora” e a “ponta vendedora”. A primeira ganha na alta do ativo objeto do contrato futuro, enquanto a segunda ganha com a baixa.

Um produtor que queira fazer hedge do preço da soja, por exemplo, deverá vender uma quantidade de contratos cujo valor seja equivalente ao volume de soja que pretende negociar no futuro. Caso o preço da soja caia, o produtor receberá ajustes diários ao longo da vigência da operação. E, caso o preço da commodity suba, ele vai pagar ajuste diário para a ponta compradora do contrato futuro.

Por fim, os contratos de opções, que também são negociados em bolsa, na B3, são contratos que conferem o direito, mas não a obrigação, de comprar ou vender um ativo a um preço específico em um determinado prazo previamente definido.

Existem dois tipos de opções: as opções de compra (call options) e as opções de venda (put options). Funcionam de forma semelhante a um seguro de automóvel, por exemplo. O comprador de uma call option ou de uma put optionpaga, no momento inicial da contratação, um prêmio que equivale a uma pequena fração do ativo objeto que lastreia a transação. Com isso, ele passa a ter um direito de comprar ou vender um determinado ativo a um preço previamente estabelecido numa data futura.

Já o vendedor da call ou da put recebe o prêmio e assume uma obrigação de vender ou comprar o ativo objeto, caso o comprador da opção assim o desejar. Se isso acontecer, dizemos que a opção deu “exercício”, ou seja, o comprador da opção exigiu do vendedor a realização da liquidação financeira da operação.

Num mercado em que os preços das commodities são ditados pelo mercado internacional e em que os produtores rurais são meros tomadores desses preços, uma boa gestão de custos, aliada à utilização de instrumentos de mitigação de riscos, é fundamental para a manutenção da saúde financeira do negócio. Sobretudo em tempos de grande volatilidade como o que estamos vivendo nos últimos anos.


* Wellington Souza é economista, sócio-consultor da Stracta Consultoria e membro do Comitê Alumni de Agronegócios do Insper.


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