Levantamento sobre empreendedorismo social no Brasil, conduzido por Marcus Salusse, conquista destaque internacional
Coordenador de programas abertos de Educação Executiva do Insper, Marcus Salusse recentemente desenvolveu uma pesquisa, conduzida em parceria com a Fundação Arymax (organização sem fins lucrativos dedicada à inovação social) e com o Seforis (programa multidisciplinar da Comissão Europeia focado em investigar o potencial de empreendedorismo social no mundo), sobre o empreendedorismo social brasileiro.
O estudo mereceu uma reportagem detalhada na Stanford Social Innovation Review, publicação mundial da Universidade Stanford, nos Estados Unidos, voltada a estudos sobre inovação social. Na entrevista a seguir, Salusse dá mais detalhes sobre a pesquisa.
Como surgiu a ideia de fazer a pesquisa 101 Empreendedores, que obteve reconhecimento mundial?
Surgiu durante meu doutorado em administração e estratégia empresarial na Fundação Getulio Vargas. Tive contato com pesquisadores do mundo inteiro na fase de doutorado-sanduíche na Austrália, na Queensland University of Technology (QUT). Uma das pesquisadoras, Ute Stephan, atualmente na King´s College London, é organizadora do Seforis e, conversando com ela, resolvemos fazer a pesquisa no Brasil, que contou com diversos profissionais. Foram mais de 200 horas de pesquisa com vários empreendedores sociais e também um questionário.
E quais foram as principais conclusões da pesquisa?
O ponto mais importante é que ainda temos na literatura mundial a ideia de que empreendedorismo social é algo feito de cima para baixo. Há uma dificuldade de reconhecer e acolher esse empreendedor como senhor do seu próprio destino. Na nossa pesquisa, olhamos para recursos e não nos referimos apenas a dinheiro. Descobrimos que o recurso financeiro está muito conectado com satisfação e felicidade. Observamos o quanto é importante acessar recursos financeiros para conseguir se desenvolver. Uma constatação da pesquisa é que empreendedores sociais da periferia em geral tem 37 vezes menos recursos para iniciar o seu negócio do que empreendedores de classes mais abastadas. E aí há uma série de problemas com isso. As vendas, por exemplo, são 21 vezes menores. Falta um colchão de segurança.
Quais as consequências disso?
Esse empreendedor não pode errar. Além disso, tem a parte de capital humano, que é importante para o conhecimento técnico e geração de valor, especificamente por meio de criatividade e inovação. Muitos empreendedores acabam criando negócios parecidos com os que já existem e com baixo nível de tecnologia. Também têm baixo conhecimento técnico, o que impacta negativamente o desempenho da organização.
Há outros tipos de capital?
Sim, tem o capital psicológico, que é superimportante. Trata-se de olhar com otimismo para o negócio e a vida em geral. O capital social também é bem interessante. Mesmo que o empreendedor cresça, muitas vezes ele não consegue acessar outras redes influentes por falta de capital social. E o capital social é algo muito importante para o desenvolvimento do negócio. O empreendedor social acaba ficando dentro da comunidade, que é carente de recursos.
E como essas questões podem ser endereçadas?
A primeira questão é mudar a perspectiva e o mindset para começar a olhar para o empreendedor social da periferia como o protagonista da mudança, não o seu beneficiário. Isso inclui criar mecanismos públicos e privados para desenvolver os empreendedores sociais como geradores da soluções do seus problemas. Esses mecanismos podem ser capacitação, redes de acolhimento, de capital psicológico. Temos exemplos legais. O DJ Bola, empreendedor social do Jardim Ângela, em São Paulo, fundou o ANIP, programa de aceleração para empreendedores da periferia. Há vários outros exemplos.