Em encontro organizado pelo Centro de Evidências da Educação Integral, especialistas discutem o conhecimento acumulado sobre o desenho de programa para diminuir a evasão
No Brasil, a evasão escolar no ensino médio não melhora há mais de 10 anos. É neste cenário que surgem programas de transferência de renda e iniciativas como Poupança Jovem ou Bolsa Escola 10, que pretendem impactar positivamente as variáveis de fluxo de jovens, como matrícula, frequência, aprovação e conclusão da última etapa da educação básica, o ensino médio.
No entanto, é necessário aprender com a experiência e resultados das iniciativas avaliadas. As discussões são sobre focalizar esses programas, a aplicação de condicionalidades para o recebimento, entre outros temas importantes. Para alcançar um modelo que incorpora o aprendizado acumulado, é preciso considerar as evidências trazidas pela ciência. Esse foi o objetivo do segundo encontro sobre esse tema promovido pelo Centro de Evidências da Educação Integral, que — em parceria com o Instituto Natura e o Instituto Sonho Grande — realiza um estudo de avaliação ex ante (expressão latina que significa “antes do fato”) do impacto de desenhos alternativos de programas de bolsas de estudo sobre a evasão escolar durante o ensino médio.
A versão preliminar do estudo que revisa a literatura do tema, assinado pelos pesquisadores Ricardo Paes de Barros, Laura Muller Machado e Laura Almeida Ramos de Abreu (do Insper) e Samuel Simões Oliveira Franco (da empresa de pesquisas, estudos e ciência de dados Oppen Social), foi apresentada em evento realizado em janeiro no Insper.
Na abertura do segundo encontro, que aconteceu no dia 13 de março, Laura Muller Machado, coordenadora do Programa Avançado em Gestão Pública (PAGP) e do Master em Gestão Pública (MGP), afirmou que a evasão é um problema de muitos anos no Brasil, mas na pandemia o fluxo de alunos em todas as etapas da educação básica piorou, em especial no ensino médio. “Alguns estados brasileiros já estão fazendo programas de bolsa para garantir que os alunos não evadam. Encontramos na literatura mais de 100 artigos que avaliam esses programas, e o objetivo desse encontro é tirar as assimetrias e analisar tudo o que a ciência sabe sobre esse tema”, diz.
Estudo liderado pelo pesquisador Ricardo Paes de Barros constatou que o custo para o país em relação ao aluno que não conclui o ensino médio pode ser em média de R$ 372 mil. “Quando se contabilizam possível renda futura, riqueza, participação no mercado de trabalho, expectativa de vida, criminalidade e satisfação pessoal, o custo pode chegar a R$ 220 bilhões por ano”, diz Vitor Pontual. “Por isso é importante avaliar exemplos bem-sucedidos, como os programas de Niterói, Piauí e Alagoas.”
Programas experimentais de combate à evasão nos Estados Unidos tiveram resultados mínimos na evasão nos anos 1990 e 2000. No entanto, o grau de sucesso melhorou recentemente quando ocorreu a implementação de mecanismos que envolvem o desenvolvimento de habilidades socioemocionais e que trabalhem algumas funções executivas nos estudantes, como autorregulação, controle de impulsos e planejamento de longo prazo.
O professor Francisco H. G. Ferreira, da London School of Economics, avalia, porém, que é preciso considerar não só os efeitos sobre escolaridade que os programas podem trazer, mas também o grau efetivo de aprendizado. “Os programas parecem ter efeito maior sobre a matrícula. O efeito sobre o aprendizado é positivo, porém pequeno. Em casos que a transferência é maior, há impacto sobre a renda da família e também sobre o aprendizado.”, afirma. Artigos que analisaram mais de 30 programas de redistribuição pelo mundo sugerem também que é preciso pensar em adaptações nos programas para alcançar as comunidades mais remotas.
Especialistas reforçam o papel da escola, que deve ter uma participação ativa na implementação e no acompanhamento do programa de bolsas. “É preciso ter um apoio adicional da escola, que pode principalmente dar a informação de quantos alunos estão prestes a evadir. Porém, é importante ter um sistema formalizado e objetivo para que a escola não tenha um poder discricionário de seleção”, afirma Tássia de Souza Cruz, professora de Fundação Getulio Vargas. Além disso, programas de mentoria e tutoria, como o projeto de vida, são fundamentais para promover o engajamento do aluno no ensino médio.