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Como os professores podem conviver com o ChatGPT

A ferramenta de inteligência artificial produz textos coerentes, mas só funciona bem se o usuário souber o que está procurando

A ferramenta de inteligência artificial produz textos coerentes, mas só funciona bem se o usuário souber o que está procurando

 

Leandro Steiw

 

Em apenas um mês, cerca de 100 milhões de pessoas cadastraram-se no ChatGPT, o aplicativo de inteligência artificial da OpenAI. Muita gente já testou as funcionalidades e ficou impressionada com o resultado. Consequentemente, professores e acadêmicos preocupam-se com a possibilidade de estudantes entregarem para o robô a produção de suas lições e trabalhos. A questão urgente: o ChatGPT é tudo isso mesmo?

Diante do interesse crescente pela ferramenta, o Insper realizou a mesa-redonda ChatGPT, uma IA que está impactando as nossas vidas, no dia 8 de fevereiro, com os professores Raul Ikeda, Fábio Ayres, Tiago Tavares e Fabrício Barth, dos cursos de Ciência da Computação e Engenharia de Computação. No público, docentes buscavam sugestões de como identificar textos escritos pelo aplicativo e tentavam entender o efeito das mudanças no ensino. “Vamos ter que pensar e tentar jogar juntos com o ChatGPT e qualquer modelo que venha a substituir”, disse Ikeda.

O professor Tiago Tavares testou a capacidade de resolução de problemas do ChatGPT, pedindo para ele resolver as provas do Enem 2022. O desempenho foi razoável, melhor em ciências humanas do que em matemática. O robô constrói textos coerentes e aparentemente originais, mas é ruim em cálculos, não consegue interpretar figuras e não compreende o sentido implícito de um texto — as ditas entrelinhas. “Mas, se um aluno começasse a escrever desse jeito, já estaria bem na disciplina”, afirmou Tavares.

O ChatGPT também não fornece as fontes vinculadas à informação, como se faz na ciência. “Ele cria frases que se parecem com uma fonte, interpolando título de artigo que parece muito plausível para aquela informação”, disse Tavares. Assim, pedir referências bibliográficas é uma maneira de driblar o chat da OpenAI. Em outros experimentos, o robô entregou títulos de trabalhos que pareciam fazer sentido, mas que não existiam. Às vezes, até o nome do autor era inventado, uma criativa mistura de nomes de outros escritores.

Embora o estilo do texto seja correto e coeso, o resultado só fica bom se o interlocutor souber o que está procurando. O chat junta argumentos de forma muito básica. “Se não for uma pergunta objetiva, você vai ter que interagir várias vezes e fazer um refinamento no próprio texto”, afirmou Tavares. Dá para a ferramenta ajudar a corrigir provas, por exemplo, a partir da comparação de argumentos e fatos presentes na resposta do aluno com o gabarito previamente fornecido pelo professor.

 

Papagaio que parafraseia

A inteligência artificial faz poemas, letras de músicas e e-mails com facilidade. Fábio Ayres pediu uma letra de samba-enredo e disse que o resultado ficou fantástico. No entanto, essa IA roda no modelo GPT-3.5, que foi treinado até 2021, logo não conseguirá argumentar com precisão sobre fatos posteriores ao arquivo com o qual foi treinada. “O modelo mental que tenho dessas coisas é como se fosse uma máquina de busca, um Google, que sabe fazer paráfrase muito bem”, disse Ayres. “Ele formata a saída de dados de um modo mais inteligentinho. É um papagaio teimoso que parafraseia bem.”

Embora o ChatGPT ainda seja incapaz de transcender o texto, Ayres acredita que não deve demorar para alguma startup juntar diversos modelos e criar um chat que também entenda figuras, equações e outras funcionalidades. A evolução em machine learning e deep learning não começou no ano passado, mas há mais de uma década, impulsionada pelo avanço teórico, o aumento gradativo da capacidade dos computadores, da escala e do dinheiro investido. Principalmente desse último, dado o interesse de big techs como Microsoft, Google e Amazon.

Segundo Ayres, não é todo dia que uma empresa pequena, como a OpenAI, cutuca os monstros mundiais da computação. “A Microsoft correu para colocar dinheiro em massa na OpenAI”, observou. “O Google tinha um modelo equivalente para uso interno, o LaMDA, correu atrás e anunciou que vai colocar para funcionar. O ChatGPT foi o primeiro a abrir essa porta, mas vão pingar outros. Os modelos tendem a se espalhar, e crescer o número de startups que estão tentando transformar isso em coisas de consumo mais simples.”

Essas ferramentas cometem erros porque dependem dos dados que alimentaram o modelo. Fabrício Barth disse que a inteligência artificial propôs uma ementa de disciplina muito coerente com os conteúdos ensinados em uma das disciplinas da Ciência da Computação. Mas, em outro teste, não soube responder quem era o médico psiquiatra paulista Carlos Byington (1933-2019) e ainda atribuiu a autoria de teorias e conceitos do brasileiro ao suíço Carl Gustav Jung (1875-1961).

 

O que vem por aí

Os professores arriscaram alguns palpites para um futuro próximo: a geração de conteúdo automático é uma realidade que será usada em mecanismos de busca na internet e produção de obras literárias (já há registros de livros infantis totalmente gerados em IA). Ayres e Tavares, por exemplo, trabalham em um projeto para a produção de melodias, em parceria com a Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, dos Estados Unidos. Para Ayres, inclusive, os áudios serão uma tendência na área em 2023.

Cada vez mais os trabalhos multimodais (texto, imagem, vídeo e som) vão se aproveitar das ferramentas de inteligência artificial. Possivelmente, será possível customizar o chat para negócios específicos, treinado empresa a empresa. “Não dá para proibir, nem ignorar”, disse Tavares. “São dois extremos que me parecem inocentes.” Entre tantas recomendações para os professores ainda temerosos, vale outra sugestão de Ikeda: “Um ponto importante é testar, entrar no chat e fazer perguntas. Ver o que gera e se a saída é factível ou não”.

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