A ideia da iniciativa, que contou com a participação de alunos do Insper, é incentivar o uso livre, lúdico e diverso do Museu de Arte de São Paulo
Tiago Cordeiro
Por três semanas, de 25 de novembro a 16 de dezembro, quem frequenta diariamente os arredores do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp), na Avenida Paulista, pôde observar 150 cadeiras de praia de tecido vermelho espalhadas pelo vão e pelo mirante do edifício. Resultado da primeira fase do projeto Placemaking Masp — uma iniciativa realizada em conjunto pelo museu e pelo Insper e que busca analisar a vida pública do espaço em função do uso e do grau de acessibilidade —, a intervenção urbana teve o objetivo de propor uma nova utilização do lugar que é um dos cartões-postais da capital.
Durante a ação, as cadeiras ficaram dispostas de formas diferentes, às terças, quartas, sextas-feiras e sábados, de modo a incentivar o uso livre, lúdico e diverso para a área, uma praça de 3.500 metros quadrados com grande valor simbólico e urbanístico. E um grupo de estudantes do Insper participou ativamente do placemaking.
“Na primeira fase, em julho, fizemos a contagem de pessoas, analisando o perfil, além de realizar entrevistas com os frequentadores. Também analisamos os prédios ao redor e o uso do espaço público. Agora, na segunda fase, vamos comparar os resultados com este novo momento, em que as pessoas puderam se sentar, o que muda o modo de ocupar o espaço”, explica Giovana Vilhena, de 22 anos, aluna do 6º semestre de Direito do Insper.
Ela é uma das estudantes, de diferentes cursos, que participam da iniciativa. “Eu já admirava o trabalho do Laboratório Arq. Futuro de Cidades. Quando soube do projeto, por meio de um grupo de WhatsApp, decidi participar”, diz Vilhena. “Sou nascida em Distrito do Cervo, em Minas Gerais. São apenas 3 mil habitantes. A discussão sobre urbanismo é novidade para mim.”
A pesquisa conta com a participação de alunas e alunos de graduação de Engenharias, de Ciência da Computação, de Direito e da pós-graduação em Urbanismo Social do Insper. A ideia do projeto é codesenhar os espaços livres das cidades para transformá-los em lugares de equidade, vida pública, acessibilidade e habitabilidade. Foi com essa perspectiva que o Insper propôs ao Masp uma parceria com o objetivo de integrar cultura e convívio social.
Conceito difundido ao longo das últimas seis décadas, mas ainda pouco conhecido no Brasil, o placemaking se baseia em um método de mapeamento de atores, coleta de microdados em escala local, conceitualização e, sobretudo, testagem com a finalidade de aprimorar propostas de intervenção específicas, em um modelo de governança comunitária.
O resultado é uma experiência única para o intercâmbio de saberes e para a aplicação do conhecimento adquirido em sala de aula na “vida como ela é” da cidade. A análise do uso do espaço acontece em paralelo com a escuta de stakeholders, do levantamento das condições físicas e do desenho baseado em evidências.
. “O Placemaking Masp é uma pesquisa aplicada em que se perguntam quais são os condicionantes — físicos, espaciais, sociais, culturais, econômicos e jurídicos — das relações estabelecidas entre os espaços livres do Masp e seu entorno. A proposta é fornecer subsídios para a elaboração de uma estratégia de governança e ativação cultural do icônico vão livre do Museu”, explica a arquiteta Laura Janka Zires, que conduz a pesquisa e é coordenadora do Núcleo Arquitetura e Cidade do Laboratório.
Ela comenta que, nessas intervenções, é possível evidenciar que os lugares se criam pela forma como as pessoas se apropriam do espaço. “Nesta segunda fase do Placemaking Masp, pudemos observar uma presença maior de crianças. Na contagem feita na primeira fase, apenas 3% das pessoas observadas eram crianças”, relata a pesquisadora. “Também verificamos que as pessoas ficam por mais tempo sentadas nas cadeiras, e algumas chegam a dormir, um indicador de que se sentem seguras e confortáveis.”
Celina Vieira de Melo, nascida em Fortaleza há 23 anos e aluna do 7º semestre de Engenharia Mecânica, conheceu a iniciativa depois que um amigo participou de um Parking Day, outro projeto promovido pelo Laboratório, voltado para a promoção de atividades de lazer na Rua Uberabinha, adjacente ao campus do Insper.
“Esse colega falou sobre a oportunidade de participar das atividades do Placemaking Masp. Adorei a ideia e me candidatei à vaga”, conta Celina. “O Museu de Arte de São Paulo é um dos marcos culturais mais importantes do Brasil, conhecido não apenas por sua impressionante coleção de arte como também por sua arquitetura única. No entanto, o espaço do vão não tem tido um bom aproveitamento para a cidade, nem para o próprio museu.”
Com base no mapeamento realizado pelos estudantes, o Placemaking Masp vai testar propostas de intervenção específicas, sempre tendo no horizonte um modelo de governança comunitária. Em coerência com essa dinâmica surgiu a ideia de colocar cadeiras. “A proposta é que as pessoas possam se sentar e fazer as atividades que preferirem, seja usar o aparelho celular, seja apenas observar o movimento ao redor”, afirma Melo. “Para mim, isto é o mais importante do projeto: tornar o ambiente do vão do Masp um lugar que as pessoas possam utilizar para fazer as atividades que desejarem, e não apenas utilizá-lo como uma ‘sala de espera’ para entrar no museu.”
Os dados coletados pelos estudantes ainda estão sendo analisados. Contudo, Vilhena tem uma impressão pessoal sobre a iniciativa: “Me pareceu claro que mais pessoas utilizam o espaço quando podem se sentar. Vi muitas pessoas utilizando o vão e o mirante para ler, descansar, comer.”
Nascido em Belo Horizonte, Rodrigo França Chaves, de 24 anos, cursa a pós-graduação em Data Science no Insper e participou ativamente do trabalho de análise das informações coletadas. “Percebi que podia ajudar muito o projeto tornando os dados mais visuais e digeríveis para pessoas que não têm tanto letramento para ler gráficos e mapas. Além disso, a ideia é tornar os gráficos interativos e criar um site para disponibilizar essas informações”, explica. “Criei um dashboard no Power BI [ferramenta de avaliação e visualização de dados]. A maior parte do meu trabalho é feita em frente ao computador, mas também fui ao Masp para coletar dados e entender melhor com o que estava trabalhando.”
Os três estudantes avaliam bem a experiência. “Além de coletar os dados da pesquisa e entender melhor o que fazer com eles, como tratá-los e como fazer com que eles sejam visíveis para uma pessoa que não entende sobre o tema, pude ter uma nova percepção do que é a cidade de São Paulo”, destaca Melo. “A pesquisa me fez ter um olhar muito mais crítico como cidadã sobre a cidade, seja sobre acessibilidade ou mobilidade, seja sobre os caminhos que quero seguir na minha vida profissional.”
Por sua vez, Chaves conheceu uma frente de pesquisa inédita para ele. “Aprendi muito. Na verdade, eu sabia pouco sobre visualização de dados. Tive que entender como funciona o Power BI quase do zero. Hoje posso dizer que conheço quase todas as funcionalidades do programa”, diz ele. “Além disso, consegui entender como é importante trazer os dados de maneira mais digerida para que o maior número possível de pessoas possa entender a importância do que estamos fazendo.”
Para Vilhena, a experiência foi valiosa principalmente porque lhe proporcionou a possibilidade de conhecer uma nova metodologia de pesquisa em urbanismo. “A proposta do placemaking ainda é pouco conhecida em nosso país. Tive a experiência de participar de uma iniciativa pioneira, em um dos locais mais representativos da cultura brasileira”.