O Urban-Based Education Festival (URBE), realizado na escola Avenues, reuniu projetos de estudantes e promoveu discussões sobre educação e sustentabilidade
No dia 2 de dezembro, a escola Avenues São Paulo realizou, em seu campus no bairro do Morumbi, na capital paulista, a primeira edição do Urban-Based Education Festival (URBE). O evento, que contou com o apoio do Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper e da BEĨ Educação, teve como tema central “Visões de uma cidade melhor”. Para debater o futuro das cidades, a programação do festival foi montada a partir de um roteiro diversificado, incluindo exposição de projetos, painéis com especialistas, workshops e atividades para crianças e familiares.
A exposição de projetos foi a principal atração do evento. Nela, foram apresentados trabalhos realizados por estudantes de 13 instituições de ensino básico públicas e privadas de todo o país, da Educação Infantil ao Ensino Médio. Os projetos, que foram desenvolvidos em diferentes áreas, como arquitetura, urbanismo, meio ambiente e cultura, tinham o objetivo de mostrar a cidade como uma extensão da escola, promovendo impactos econômicos, sociais ou ambientais positivos na comunidade.
Ao longo da programação, foram realizados três painéis com diversos especialistas, que abordaram temas como a importância da educação para a formação de cidadãos conscientes do seu papel no futuro das cidades, a interligação entre urbanismo e educação e as possibilidades de tornar as cidades mais sustentáveis, inclusivas e agradáveis para todos os moradores.
“Cidade é o espaço da cidadania, é um território partilhado, que tem vida em comum, apesar de todas as diferenças sociais e econômicas que segregam esse bem, que é de todos. Se a cidade pertence a todos, ela precisa ser um espaço em que se atua, se cria e se convive”, disse Cristine Conforti, diretora do Programa Brasileiro da Avenues São Paulo. “Este evento, que a Avenues inaugura em 2023 em parceria com a BEĨ Educação e o Arq.Futuro, é um manifesto e uma celebração. Ao explorar territórios da cidade como extensões da sala de aula, estudantes de diferentes escolas do país apresentam suas visões e discutem projetos que acenam para cidades melhores.”
Moderador de dois dos painéis, o coordenador-geral do Laboratório Arq.Futuro, Tomas Alvim, explicou que a ideia principal era discutir a relação entre a escola e a cidade. Ele destacou a disparidade entre as realidades urbanísticas nos Hemisférios Norte e Sul. “Enquanto as cidades do Norte estão avançadas em termos econômicos, de sustentabilidade e no uso de dados, as do Sul Global enfrentam desafios significativos ainda da época da revolução industrial, como a falta de saneamento básico para metade da população no Brasil”, disse Alvim, ao ressaltar a importância das cidades nas decisões e transformações, especialmente diante do desafio planetário das mudanças climáticas.
Ao comentar especificamente o papel da escola na relação com a cidade, Alvim indagou: “Qual tem sido a resposta da escola aos desafios da cidade? O muro. Ela tem a mesma resposta que o condomínio, o prédio corporativo e às vezes o espaço público, que se cercam para se proteger e criar uma falsa sensação de segurança”.
A educadora Marília De Santis, que começou a trabalhar na Prefeitura de São Paulo como professora de educação infantil e hoje é diretora de uma escola de ensino fundamental em Heliópolis, falou justamente sobre a importância de romper bolhas e derrubar muros. “Eu conheço Heliópolis desde 2010 e digo que foi uma virada importante na minha vida conhecer os movimentos sociais”, relatou ela. “Eu era uma educadora muito focada na sala de aula, dentro da escola. Aí, quando conheci Heliópolis, aprendi que a cidade é uma grande escola, que a cidade não é de todos ainda, mas em algum momento vai ter que ser.”
Participante de um dos painéis, a educadora Paola Ricci, pesquisadora do Transformative Learning Technology Lab do Teachers College da Columbia University, comentou a questão do “apartheid das infâncias”. Segundo ela, “as infâncias no mundo estão cada vez mais apartadas. Crianças de contextos socioeconômicos diferentes simplesmente não se encontram na escola e no espaço público, algumas presas em seus territórios porque não têm acesso, outras presas em suas bolhas blindadas por causa de questões de insegurança”. Para Paola, “a escola tem um papel muito importante de não ampliar essa segregação entre as infâncias.”
A arquiteta e ativista urbana Ester Carro participou de um dos painéis, discorrendo sobre a ONG que ajudou a fundar, o Fazendinhando, um instituto de transformação territorial, cultural e socioambiental que atua em favelas. Os moradores do Jardim Colombo, um dos núcleos da favela de Paraisópolis, se mobilizaram para transformar um lixão local em um parque, a Fazendinha. “Cada um de nós que estamos aqui precisamos participar da mudança e ser agentes da transformação. Precisamos ter consciência de que temos essa responsabilidade. A nossa fala, a nossa ação, a nossa escolha, a nossa decisão vão fazer uma diferença muito grande para a sociedade, para diminuir as desigualdades sociais e territoriais”, afirmou.
Ex-executivo de empresas de mídia e consumo, Mauro Calliari é doutor em urbanismo pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. Em um dos painéis no URBE, ele sugeriu a introdução de uma disciplina no ensino fundamental: História da Cidade. Essa disciplina abordaria o papel social do urbanismo, incentivando os alunos a refletirem sobre como podem contribuir para o desenvolvimento e o bem-estar da cidade. As atividades seriam tratadas de maneira colaborativa, integrando disciplinas como História, Geografia, Português, Matemática e outras, permitindo uma compreensão holística da cidade e suas dinâmicas e preparando os alunos para serem cidadãos engajados e conscientes. Calliari também convidou a todos que caminhem mais para conhecer a cidade. “O maior meio de transporte de São Paulo hoje é o pé”, disse ele, ao sugerir que as pessoas caminhem até a padaria, a farmácia, a feira livre e outros lugares para “experimentar a cidade”.
Quem tem experimentado e conhecido bastante a cidade de São Paulo é Maria Figueiredo, aluna de 9 anos do Avenues e que deu o seu depoimento em um dos painéis do festival. Nascida em Portugal, Maria mora no Brasil há um ano e é apaixonada pela cultura, arte, arquitetura e história de São Paulo. Ela contou que, todos os finais de semana, visita algum museu com sua família. Contudo, observou: cada vez que vai a esses museus, fica mais convencida de que eles poderiam ser mais atraentes para as crianças, com a inclusão de maior número de educadores para explicar as obras de arte, visitas guiadas e atividades para tornar a experiência mais memorável. Nesse aspecto, Maria elogiou o Instituto Tomie Ohtake. “Sempre que vou lá, aprendo muita coisa e tomo um banho de cultura”, relatou.
A estudante concluiu sua fala com uma mensagem dirigida a todas as crianças e adultos: “O evento URBE pretende ensinar às pessoas que é importante saber sobre a própria cidade. E mais importante ainda é saber que eu e vocês, todos nós, podemos melhorar e mudar a nossa cidade. Não só o governo — nós também podemos ajudar a nossa cidade a ser melhor”.