Livro lançado no Insper mostra que os cursos técnicos no ensino médio aumentam a renda e a empregabilidade dos alunos
O Brasil tem cerca de 2 milhões de alunos matriculados na educação profissional e tecnológica de nível médio (EPTNM), uma modalidade educacional que busca preparar os estudantes para o mercado de trabalho e para a vida em sociedade. A formação técnica e profissional ganhou relevância com o Novo Ensino Médio, a reforma instituída por lei federal em 2017 para tornar a grade curricular mais flexível e atender aos diferentes interesses dos jovens. No novo modelo, os estudantes podem optar por uma formação técnica e profissionalizante. Ao final da educação básica, além do certificado de conclusão do ensino médio regular, eles receberão o diploma do curso técnico ou profissionalizante.
Contribuir para o debate acerca da EPTNM é um dos objetivos do livro Impacto da Educação Técnica sobre a Empregabilidade e a Remuneração, lançado em um evento realizado no Insper, em 29 de novembro. O livro, disponível neste link, foi realizado por pesquisadores do Insper em parceria com o Instituto Unibanco e com o Itaú Educação e Trabalho. Assinam como autores da obra os pesquisadores Ricardo Paes de Barros, Lígia Lóss Corradi, Samuel Franco, Laura Muller Machado e Andrezza Rosalém.
A obra consiste em uma revisão sistematizada da literatura nacional e internacional, abordando as estimativas disponíveis do impacto privado da EPTNM no Brasil sobre a empregabilidade e a remuneração do trabalho. A partir da análise de 76 projeções, presentes em 16 estudos, os autores apontam que o egresso da formação profissional tem um retorno na própria remuneração superior a 3 reais para cada real investido — revelando que a educação técnica está entre os investimentos públicos mais rentáveis no país.
Na abertura do evento de lançamento do livro, a pesquisadora Laura Abreu resumiu como surgiu o projeto: “A origem do livro remonta a aproximadamente dois ou três anos, no contexto das discussões sobre a implementação do Novo Ensino Médio, que motivou diversos estudos sobre a expansão do ensino técnico. O desenvolvimento da obra resultou de um esforço significativo por parte dos responsáveis pela sua concepção, que se empenharam em compilar e analisar numerosos estudos e estimativas sobre o tema. O propósito principal é consolidar esse conhecimento, tornando-o acessível a todos, especialmente aos formuladores de políticas públicas no Brasil”.
Também na abertura, o pesquisador Rodrigo Soares, vice-presidente acadêmico do Insper, destacou a importância de trazer o ensino técnico para o debate público e incorporá-lo de maneira estruturada no sistema educacional brasileiro. “Devemos superar a abordagem anterior, na qual o ensino técnico frequentemente era visto como uma extensão de ensino secundário regular, tornando-o, de fato, uma opção profissionalizante para um determinado segmento da população”, disse Soares. Segundo ele, enfrentar esse desafio requer uma abordagem interdisciplinar, pois envolve questões sociais, culturais, políticas e econômicas. “Isso está alinhado ao DNA do Insper. Esse livro exemplifica nosso compromisso em contribuir para o processo de decisão política, que, em última análise, será uma decisão tomada pela sociedade, mas que seja baseada na melhor informação disponível. Nesse sentido, a contribuição trazida pelo livro é fundamental.”
Ana Inoue, superintendente do Itaú Educação e Trabalho, destacou a importância de produzir evidências e reflexões qualificadas sobre educação profissional no país, uma vez que há pouco material substancial sobre o tema. Ela lembrou que, no Brasil, a maior parte dos alunos que concluem o ensino médio acaba não seguindo para uma universidade. “Não podemos aspirar a oferecer ensino superior para todos, e nem sei se essa seria a abordagem ideal, dado que não dispomos de vagas suficientes. Contudo, é crucial que os alunos que terminam o ensino médio tenham a oportunidade de poder avançar em suas trajetórias. A educação técnico-profissional funciona como uma espécie de boia para que essas pessoas tenham oportunidades contínuas de crescimento.”
Andrezza Rosalém, sócia-diretora da Oppen Social e uma das autoras do livro, apresentou algumas lições extraídas do trabalho. “O conjunto de textos que sistematizamos revelou que a educação profissional tecnológica de nível médio tem um impacto significativo na vida dos estudantes”, disse. No que se refere à empregabilidade, ela ressaltou que os estudantes que concluem a EPTNM têm 5,5 pontos percentuais mais chances de estarem no mercado de trabalho formal em comparação com os trabalhadores sem formação.
Em relação aos efeitos da formação profissional de nível médio na remuneração do trabalho, as conclusões do estudo indicam que os graduados da EPTNM recebem uma remuneração até 12% superior ao daqueles que concluem apenas o ensino médio. Esses impactos são mais expressivos quando o egresso está empregado formalmente, trabalha em sua área de formação técnica ou não possui formação superior completa.
O pesquisador Ricardo Paes de Barros apresentou uma atualização dos resultados obtidos após a conclusão do livro. Embora a obra tenha se concentrado em avaliar o impacto da educação técnica na qualidade da inserção dos graduados no mercado de trabalho, o pesquisador lembrou a importância de compreender de forma mais ampla os custos e os benefícios sociais e privados da educação técnica para orientar políticas públicas. “O nosso projeto original era avaliar não somente o impacto privado da educação técnica, mas o impacto geral. Isso porque acreditamos que os benefícios da educação técnica transcendem o indivíduo, estendendo-se para a sociedade como um todo”, disse. Ele ressaltou que a educação técnica afeta não somente a renda individual, como também as taxas de ocupação, formalização e remuneração, desempenhando um papel crucial na melhoria da renda média dos trabalhadores e na redução da pobreza.
A pesquisadora Laura Muller Machado chamou a atenção para a baixa porcentagem de matrículas em cursos técnicos no ensino médio no Brasil (11%) em comparação com a média de 42% nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Laura apresentou algumas recomendações para mudar esse cenário, como ampliar a oferta de educação técnica no ensino médio no Brasil e informar os jovens sobre os benefícios que deixam de ter ao não concluírem os cursos técnicos. “Atualmente, muitos cursos de ensino médio incluem uma disciplina chamada Projeto de Vida, dedicada a reflexões sobre a trajetória profissional que os jovens desejam seguir. Seria valioso promover discussões mais aprofundadas com esses alunos, orientando-os na escolha de cursos e ajudando-os a visualizar o impacto positivo que a conclusão desses cursos pode ter em suas carreiras”, disse.
Por fim, André Portela Souza, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas, que participou do evento de lançamento com comentários e perguntas aos autores, expressou sua satisfação pelo avanço na pesquisa educacional no Brasil, comparando o estágio atual com o cenário de duas ou três décadas atrás. “Parabenizo os autores por terem encontrado 72 estimativas sobre o impacto da educação profissional e tecnológica no Brasil, evidenciando o avanço no debate desse tema. Destaco também para a robustez dos resultados, com a convergência entre os números das estimativas experimentais e não experimentais, o que proporciona maior confianças nos dados”, afirmou.
Confira as fotos do evento de lançamento do livro aqui.