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Nobel de Economia reforça necessidade de políticas para alavancar presença feminina no mercado de trabalho

Professora Ana Diniz destaca a importância do prêmio concedido à norte-americana Claudia Goldin e fala de iniciativas do Insper para discutir a sobrecarga e o espaço das mulheres na sociedade

Professora Ana Diniz destaca a importância do prêmio concedido à norte-americana Claudia Goldin (foto) e fala de iniciativas do Insper para discutir a sobrecarga e o espaço das mulheres na sociedade

 

Michele Loureiro

 

O Prêmio Nobel de Economia de 2023 foi entregue à norte-americana Claudia Goldin, de 77 anos, por suas pesquisas sobre mulheres no mercado de trabalho ao longo dos últimos dois séculos. Nascida em Nova York, ela é doutora pela Universidade de Chicago e, desde 1990, é professora na Universidade Harvard. Entre diversos pontos, seu estudo mostrou que a maior parte da atual diferença salarial entre homens e mulheres na mesma ocupação surge principalmente com o nascimento do primeiro filho.

Para a professora Ana Diniz, coordenadora do Núcleo de Estudos de Diversidade e Inclusão no Trabalho do Insper, a concessão do prêmio para Claudia Goldin é motivo de celebração. “O primeiro ponto a ser levado em conta é que ela é a terceira mulher na história a receber o Nobel de Economia. Já existe um feito de reconhecer a importância da atuação, recorrentemente invisibilizada, que as mulheres têm nas ciências”, diz a docente, que também é coordenadora do curso de graduação em Administração do Insper. “Além disso, o tema é de fundamental importância e aponta a necessidade de uma política para superar as desigualdades na organização social dos cuidados na nossa sociedade.”

Em seu estudo, Goldin mostra que a participação das mulheres no mercado de trabalho não teve uma tendência ascendente ao longo do seu período de estudo e aponta as desigualdades de gêneros. “A pesquisa mostra que a inserção das mulheres no mercado não é retilínea, ela acontece em U. Ou seja, há uma piora dessa participação e depois uma retomada. A autora identifica que essa melhora é o resultado de diversos elementos, como a alteração das dinâmicas sociais e do mercado de trabalho no pós-guerra, a ampliação da área de serviços, a desconstrução de estereótipos e a chegada da pílula anticoncepcional, que permitiu o controle de reprodução e ofereceu novas oportunidades para o planejamento da vida das mulheres”, observa Ana Diniz.

Dentro dessa parte dos estereótipos, segundo a docente do Insper, é fundamental destacar o papel que os movimentos de mulheres e feministas tiveram para contribuir para a revisão desses valores tradicionalistas, que, muitas vezes, levavam à exclusão das mulheres do mercado de trabalho.

Apesar da modernização, do crescimento econômico e do aumento da proporção de mulheres empregadas no século 20, durante muito tempo a diferença salarial entre mulheres e homens praticamente não diminuiu. De acordo com o trabalho de Goldin, parte da explicação é que as decisões educacionais, que impactam uma vida inteira de oportunidades de carreira, são tomadas em uma idade relativamente jovem e levam em conta as experiências de gerações anteriores — como as mães que não voltaram a trabalhar até que os filhos tivessem crescido.

Historicamente, grande parte da diferença salarial de gênero poderia ser explicada por diferenças na educação e nas escolhas ocupacionais. No entanto, Goldin mostrou que grande parte dessa diferença agora ocorre entre homens e mulheres na mesma ocupação e que ela surge principalmente com o nascimento do primeiro filho. “Isso chama atenção para uma questão que tem sido objeto de discussão intensa, desde os anos 1980 e de forma particular na América Latina, que é a divisão sexual do trabalho. Precisamos falar sobre a sobrecarga que as mulheres enfrentam em relação ao trabalho de cuidados e doméstico”, diz a professora Ana.

Considerando que o dia tem 24 horas, e que essas mulheres são majoritariamente responsabilizadas pelo trabalho reprodutivo, que inclui os afazeres domésticos e os cuidados de pessoas com algum nível de dependência, isso com certeza vai competir com a disponibilidade que elas têm para a inserção no espaço público, seja para gerar renda, seja para participar da vida política.

Segundo Ana, a pesquisa da economista norte-americana aponta que as desigualdades no mercado de trabalho, principalmente do ponto de vista de rendimentos, não são apenas um efeito da concentração de mulheres em um determinadas áreas, que muitas vezes são desvalorizadas. “Por meio da análise de evidências, a autora identifica que, dentro das mesmas ocupações, há uma imensa distância entre homens e mulheres e ela aponta a presença de filhos como uma das principais questões que afetam essa participação das mulheres.”

Para a docente do Insper, a concessão do Nobel coloca luz na questão do cuidado, que impacta na autonomia econômica das mulheres. “O tema ganhou destaque novamente no período pós-pandemia, por causa das medidas de isolamento. Políticas públicas para lidar com esse problema têm sido desenvolvidas em vários países da América Latina, a exemplo do Brasil, que está implementando a Política Nacional de Cuidados, justamente para pensar como reorganizar esses aspectos”, explica Ana.

Cuidar é parte da nossa humanidade, segundo a professora, para quem “o problema não está no cuidado em si, mas na organização desigual desse cuidado que vai sobrecarregar as mulheres, em particular as empobrecidas e negras, quando comparadas aos homens. E isso prejudica a participação delas em outros espaços”.

 

Ações do Insper para reduzir a desigualdade

A lupa que o Nobel de Economia traz para essa pauta deve ajudar nas discussões. O Insper, em parceria com o Instituto Talenses Group, está desenvolvendo o Mapa da Autonomia Econômica das Mulheres. De acordo com Ana, o projeto objetiva construir coletivamente um mapa de temas, definições, dados, redes de atores e atrizes, e práticas para a promoção da autonomia econômica das mulheres.

O tema ganha cada vez mais espaço no Insper. Recentemente, em uma aula do curso de Introdução a Políticas Públicas, houve a participação especial de Mariana Mazzini, professora de Administração Pública e Gestão Social da Universidade Federal do Rio Grande Norte (UFRN) e coordenadora-geral de Gestão de Informações da Secretaria Nacional de Cuidado e Famílias do MDS (Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome). Ela trouxe dados que ajudam a entender que cuidado é um trabalho cotidiano de produção de bens e serviços necessários para a reprodução das sociedades, para a sustentabilidade da vida e a garantia do bem-estar das pessoas.

Segundo Mazzini, o cuidado inclui as tarefas diárias, como preparação de alimentos, manutenção da limpeza, organização dos domicílios e apoio a atividades diárias de pessoas com dependência para realização das atividades básicas e instrumentais da vida diária (como trocar uma fralda, apoiar uma pessoa idosa com dependência para caminhar ou ir ao banheiro). “Em comparação com os homens, as mulheres dedicam mais que o dobro do número de horas semanais ao trabalho doméstico e de cuidados não remunerado”, disse na apresentação.

Para Mazzini, é necessário que haja políticas públicas que permitam a reorganização e o compartilhamento da responsabilização social pelos cuidados para atender às necessidades de quem requer cuidados e de quem cuida. A ideia é que a Política Nacional de Cuidados ajude a valorizar, redistribuir e diminuir a sobrecarga de quem cuida, ao mesmo tempo que atende quem precisa de cuidado.

 

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