Uma comparação das propostas dos candidatos nos eixos de política agrícola e comércio, produtividade e infraestrutura, social e ambiental
Henrique Dau, assistente de pesquisa do Insper Agro Global
O agronegócio tem importância histórica na formação econômica e social do Brasil e é hoje um dos principais pilares da economia do país. O setor corresponde a mais de um quarto do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, cerca de 50% do valor das exportações do país e 20% das ocupações no mercado de trabalho[1]. Esses macrodados são diretamente proporcionais à dimensão dos desafios que devem ser considerados pelos agentes públicos na formulação de políticas ao setor, que envolvem questões de ordem econômica, social e ambiental.
Este artigo lança luz sobre as propostas voltadas ao agro dos quatro presidenciáveis de maior expressão no pleito eleitoral deste ano: Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Jair Bolsonaro (PL), Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB). Como fonte, foram utilizados os planos de governo de cada candidatura registrados no Tribunal Superior Eleitoral[2]. As sínteses foram feitas a partir de quatro eixos principais: Política Agrícola e Comércio, Produtividade e Infraestrutura, Social e Ambiental. Este texto não tem o objetivo de realizar qualquer juízo de valor com relação às propostas apresentadas, mas apenas trazer luz sobre a visão de governo de cada um dos principais candidatos.
Neste eixo, cada candidato expõe sua visão com relação a pequenos produtores, grandes exportadores e a participação da agropecuária no comércio internacional.
Com relação à agricultura familiar e pequenos produtores, Lula advoga por incentivos fiscais e acesso ampliado a crédito. Já Bolsonaro e Tebet se aproximam ao defenderem alternativas com menor participação pública, como o incentivo ao cooperativismo. Tebet vai além, propondo auxílio técnico aos pequenos produtores, programas para elevar a capacidade de armazenamento de produtos agrícolas, um Plano Safra plurianual e incentivo ao seguro rural.
Na política comercial, Ciro defende incentivos à exportação, enquanto Simone aposta na diplomacia, sustentabilidade e segurança jurídica como pilares para melhorar a posição comercial do Brasil no cenário global, indicando a redução gradual de barreiras tarifárias para promover a abertura comercial como meio de aumentar a competitividade do setor agro e elevar o protagonismo brasileiro nas negociações internacionais. Lula e Bolsonaro defendem o desenvolvimento da agroindústria como meio de agregar valor ao setor, ambos em tom crítico ao foco excessivo na exportação de commodities.
Quando o assunto é produtividade, há muitas linhas de propostas possíveis. Todos os candidatos concordam em incentivar a pesquisa e o desenvolvimento de novas tecnologias para agregar valor à terra. Citada apenas pelos programas de Ciro e de Tebet, a ILPF (Integração Lavoura-Pecuária-Floresta), além de trazer benefícios ambientais, é uma maneira de elevar a produtividade da terra e a renda de pequenos pecuaristas.
Tanto Tebet como Bolsonaro adotam um olhar voltado ao setor privado quando o assunto é infraestrutura, enxergando uma oportunidade nas concessões, PPPs e privatizações para aprimorar os sistemas ferroviário e hidroviário, por exemplo. Lula e Ciro, por outro lado, defendem um modelo híbrido com presença do setor privado, mas mantendo o governo como principal vetor dos investimentos em infraestrutura. Entretanto, não especificaram em quais modalidades de infraestrutura pretendem investir.
Jair Bolsonaro destaca em seu programa propostas relacionadas ao desmatamento e às emissões de gases de efeito estufa (GEEs). O documento do atual presidente propõe ampliar políticas de combate ao desmatamento por meio de monitoramento via satélites de alta resolução, contratação de bombeiros alocados em áreas onde há concentração de queimadas e incêndios, além de apostar nos modelos de Pagamentos por Serviços Ambientais. Lula enfatiza a tolerância zero contra o desmatamento e o contrabando de madeira ilegal. Para Ciro, a regularização fundiária é um bom caminho para evitar o desmatamento, além de propor a ILPF como método para evitar a necessidade de expansão do pasto via desmatamento.
Já o programa da emedebista, além de se comprometer com o combate ao desmatamento ilegal, defende o fortalecimento dos órgãos de controle como o Ibama. Tebet também propõe a ampliação do Selo Verde, instrumento que possibilitará a rastreabilidade e transparência dos produtos brasileiros que estão de acordo com os padrões internacionais de sustentabilidade. E se compromete com a criação de um cadastro que identifique aquelas empresas ou indivíduos associados a crimes ambientais, além de destacar a importância de acelerar a adoção e informatização do CAR (Cadastro Ambiental Rural) por ser um importante instrumento de controle e detecção de atividades ilegais.
Sobre as emissões de GEEs, Bolsonaro e Tebet propõem uma transição para combustíveis cada vez mais limpos, como o hidrogênio verde e os biocombustíveis, além de mencionarem a importância da regulamentação do mercado de crédito de carbono. Já os textos dos candidatos petista e pedetista, embora manifestem preocupação com a pauta ambiental, não deixam claro quais são suas propostas para o combate às emissões e sequer mencionam os termos “biocombustível” ou “mercado de carbono”.
O Eixo Social trata principalmente das políticas com relação a minorias no campo, como quilombolas e indígenas, trata da questão fundiária e também da segurança alimentar.
A proteção dos direitos e do bem-estar de quilombolas e povos indígenas é citada em todos os documentos, ainda que com visões diferentes sobre o tema. Todos os candidatos reafirmam a importância de garantir acesso a serviços públicos como saúde e educação, mas apenas Tebet e Bolsonaro citam a conectividade como um elemento-chave de integração e desenvolvimento dessas comunidades. Dos quatro candidatos, o atual presidente é o único que não relaciona a defesa das terras indígenas e quilombolas como um elemento de proteção a essas comunidades.
Quando o assunto é acesso à terra, Bolsonaro e Tebet enfatizam a regularização fundiária e o combate à invasão ilegal de terras, enquanto Lula defende a reforma agrária. Dos quatro, o único que cita a segurança no campo é Bolsonaro, que propõe o armamento civil em regiões rurais como método de defesa contra atividades criminosas.
No tópico segurança alimentar, o atual presidente e o ex-presidente concordam mais uma vez e defendem políticas de compras públicas para garantir a oferta doméstica de alimentos saudáveis.
Jair Bolsonaro dá maior espaço ao setor privado nas propostas apresentadas e aposta na cooperação entre governo e mercado para atrair investimentos para a infraestrutura, promover a sustentabilidade e elevar a oferta de crédito para pequenos produtores. Apesar dessa relação com o mercado, o documento se assemelha aos de Lula e Ciro em dois aspectos: no incentivo ao desenvolvimento da agroindústria e nas compras públicas para garantir segurança alimentar. Possivelmente preocupado com a má reputação de sua gestão na questão ambiental, o documento publicado pela campanha do atual presidente deixa clara e dá maior ênfase para a importância do meio ambiente no seu eventual segundo mandato, buscando construir confiança nessa área.
O programa de Simone Tebet também aprecia a participação do setor privado, mas se distingue da proposta de Bolsonaro em dois aspectos principais: primeiro, ao colocar a segurança jurídica como principal elemento na capacidade de atrair investimentos e promover acordos comerciais. Segundo, ao reconhecer as limitações do mercado, somando a necessidade de fortalecimento das agências fiscalizadoras a mecanismos de incentivo à sustentabilidade, como o Pagamento por Serviços Ambientais e a regularização do mercado de carbono, por exemplo. Do ponto de vista social, se aproxima de Lula e Ciro, em defesa do direito à terra de minorias e no combate intransigente ao desmatamento.
O programa de Lula é baseado em uma maior ação estatal, não deixando claro o espaço para a cooperação do setor privado. Em seu documento, o programa do ex-presidente afirma que os grandes produtores são agentes focados na exportação, enquanto os pequenos produtores estariam mais voltados para a promoção da agricultura orgânica e da segurança alimentar doméstica. O plano de governo de Bolsonaro antagoniza nessa visão, posicionando os pequenos agricultores com papel de igual importância nas exportações e na segurança alimentar, sem diferenciá-los dos grandes exportadores nesse sentido. O texto também faz menções reiteradas à defesa do meio ambiente e combate aos crimes ambientais, mas não especifica propostas para isso.
Já o programa do candidato Ciro Gomes não aborda o tema agro em seu programa diretamente, embora mencione brevemente a intenção em incentivar a pesquisa e as exportações do setor, além de defender a pecuária de baixo carbono como método de combate ao desmatamento e se declarar a favor da proteção dos territórios indígenas. Entretanto, não há detalhes sobre política agrícola, infraestrutura ou comércio.
[1] Dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq-USP) e da Secretaria Especial de Comércio Exterior (Secex).
[2] Os planos de governo dos candidatos geralmente são atualizados ao longo das eleições. No entanto, para a elaboração deste texto, optou-se pela utilização do documento oficial.