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Insper Cineclube apresenta “Cidade de Deus”, um marco do cinema brasileiro

O filme de Fernando Meirelles e Kátia Lund, de 2002, apresenta uma visão do avanço violento do tráfico no Rio de Janeiro e fez sucesso internacional

O filme de Fernando Meirelles e Kátia Lund, de 2002, apresenta uma visão do avanço violento do tráfico no Rio de Janeiro e fez sucesso internacional

 

Leandro Steiw

 

Vinte anos já são tempo para ver em perspectiva o filme Cidade de Deus, atração do Insper Cineclube no dia 21 de setembro, no Auditório. Sucesso de audiência: foi. Estima-se que o longa-metragem de Fernando Meirelles e Kátia Lund tenha sido assistido nos cinemas brasileiros por 3,3 milhões de pessoas. Sucesso de bilheteria: foi. O filme faturou 30 milhões de dólares nos cinemas, dez vezes mais do que custou. Sucesso internacional: foi. Recebeu quatro indicações para o Oscar, inclusive para melhor diretor.

Baseado no romance homônimo do escritor carioca Paulo Lins, o filme conta a história do avanço do crime organizado e do tráfico de drogas na favela Cidade de Deus, no Rio de Janeiro. O narrador é Buscapé, interpretado por Alexandre Rodrigues, que nasceu num ambiente violento, mas tenta realizar o sonho de se tornar fotógrafo. No lado oposto está Dadinho (Douglas Silva), que se revela um sociopata ainda criança e muda de nome para Zé Pequeno (Leandro Firmino) quando passa a controlar o tráfico na região.

As histórias se entrelaçam, na maior parte das vezes, de forma trágica. O traficante carismático Bené (Michel Gomes e Phellipe Haagensen) mantém sob controle a raiva de Zé Pequeno, de quem é amigo desde a infância. Sandro Cenoura (Matheus Nachtergaele) também trafica na Cidade de Deus e é rival de Pequeno, mas amigo de Bené. Em busca de vingança, está Mané Galinha (Seu Jorge), o criminoso que não mata gente honesta. Há ainda pequenas quadrilhas de menores de idade que vivem por ali. Violência e morte são os pontos em comum, seja para os bandidos, seja para os trabalhadores.

No primeiro final de semana de exibição, em 99 salas de cinema de 14 estados, Cidade de Deus teve 133.000 espectadores, uma marca considerável em se tratando de produções nacionais, ainda mais em uma época dominada por títulos estrelados pela apresentadora infantil Xuxa Meneghel. O público gostou do ritmo da narrativa, com cortes e sequências então incomuns nos filmes brasileiros, muitas vindas da experiência de Meirelles como publicitário. Descontando Matheus Nachtergaele, os demais atores e atrizes eram rostos desconhecidos das telas, dezenas deles crianças e adolescentes que moravam nas comunidades cariocas.

A crítica dividiu-se. Muitos elogiaram o resultado da mistura de artistas inexperientes, diálogos realistas, violência explícita e realidade social. Outros — inclusive moradores da Cidade de Deus — lamentaram o estigma que a produção lançaria sobre a favela, como um lugar de bandidos em confronto permanente. Não poucos detrataram o filme como “cinemão”, mera reprodução dos modelos hollywoodianos. Somados todos os argumentos, percebia-se que a obra havia aumentado de dimensão, mesmo que tenha sido pensada, desde o início, para trilhar carreira internacional.

 

Chuva no molhado

Fernando Meirelles defendeu, cinco anos depois, no livro Biografia Prematura: “A pegada de CDD é justamente ver a formação do tráfico de dentro para fora, através dos olhos do Buscapé ou dos moradores, como o Paulo Lins fez no livro. Se eu desse uma visão sociológica, da classe média, além de estar chovendo no molhado, não seria mais este filme, seria um outro, talvez mais ao gosto dos colegas do Cinema Novo, onde cada novo filme era visto como um discurso bombástico, feito para chacoalhar as cristaleiras. Essa não era a intenção”.

Desde 2002, cenas e falas de Cidade de Deus foram reproduzidas ou reeditadas em quadrinhos, animações, documentários e listas de cinemaníacos. O longa-metragem já vendeu cópias em VHS, DVD e Blu-ray, o que certamente acrescentou mais alguns milhares de espectadores mundo afora. Gerou o subproduto Cidade dos Homens, série exibida pela TV Globo e feita com boa parte da equipe do filme.

Indicado ao Oscar pelo roteiro adaptado, Bráulio Mantovani continuou vinculado ao mundo do cinema, coassinando o argumento de Tropa de Elite, blockbuster de 2007. Diversos dos artistas adultos e mirins envolvidos em Cidade de Deus se profissionalizaram, fizeram telenovelas, séries ou outras produções cinematográficas. Vários não tiveram as mesmas oportunidades. A violência não deu trégua no país. E, sobretudo, 20 anos depois, Cidade de Deus ainda tem energia para divergir opiniões.

 


Três curiosidades sobre “Cidade de Deus”

 

1. Legenda do cinema

O filme estreou em maio de 2002 no Festival de Cinema de Cannes, na França. Chegou aos cinemas brasileiros no dia 30 de agosto. Nos Estados Unidos, ficou em cartaz por 15 meses. No Reino Unido, foi o terceiro filme de língua estrangeira mais assistido até então. Recentemente, o aplicativo Preply vasculhou o site IMDb e apontou Cidade de Deus como o filme não falado em inglês mais visto no mundo, atrás dos franceses Intocáveis (2011) e O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (2001).

 

2. Frase de renome

A fala da transição de Dadinho virou citação pop, parafraseada nas mais diversas situações: “Meu nome agora é Zé Pequeno”, em versão incompleta e polida.

 

3. Origem acadêmica

Antes de escrever o livro que deu origem ao filme, Paulo Lins morou na Cidade de Deus (dos 6 aos 36 anos de idade) e foi assistente da antropóloga Alba Zaluar (1942-2019) em uma pesquisa acadêmica sobre criminalidade no Rio de Janeiro. Alba foi uma das primeiras pessoas a criticar o longa-metragem, declarando à Folha de S.Paulo que era equivocado o retrato que a película fazia do tráfico no Brasil e na representação da população da favela.

 

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