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“Tribunais não podem ser única esperança contra conteúdo abusivo nas redes”

Para Ivar Hartmann, professor do Insper, não há evidência na América Latina de que as Cortes tenham feito o que se espera na contenção do discurso de ódio e da desinformação na internet

Para Ivar Hartmann, professor do Insper, não há evidência na América Latina de que as Cortes tenham feito o que se espera na contenção do discurso de ódio e da desinformação na internet

 

Tiago Cordeiro

 

As organizações da sociedade civil, atuando de forma coordenada e proativa, têm condições de auxiliar as plataformas digitais a conter os discursos de ódio e desinformação distribuídos no ambiente da internet. São mais eficazes do que os tribunais, que não têm conseguido agir de forma tão eficiente quanto pode parecer, ao menos na América Latina.

Esse é o argumento que Ivar Hartmann, professor do Insper, defende em um artigo publicado pelo Centre for International Governance Innovation, uma organização fundada em 2001, com sede no Canadá, e dedicada a debater, de forma independente, questões ligadas à governança em todo o mundo.

“O artigo é uma prévia de um texto acadêmico, parte de um projeto que vai gerar um livro a ser publicado em breve”, diz Hartmann. “O tema geral é regulação de plataforma. Os grandes temas são conteúdo, dados pessoais, concorrência e infraestrutura. Para cada tema, os editores buscaram quatro autores de diferentes continentes. Sou o responsável da América Latina sobre o tema ‘conteúdo’. Pela América do Norte, o autor é o David Kay, ex-relator da ONU para Liberdade de Expressão.”.

Hartmann é doutor em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, mestre em Direito Público pela PUC-RS e mestre em Direito (LL.M.) pela Harvard Law School. É ex-professor associado e pesquisador da FGV Direito Rio (2012-2020), onde coordenou o projeto Supremo em Números, além do Núcleo de Ciência de Dados Jurídicos e do Centro de Tecnologia e Sociedade.

Na entrevista a seguir, ele dá detalhes sobre o discurso de ódio e a desinformação na internet.

 

Ivar Hartmann
Professor Ivar Hartmann

 

Por que os tribunais não são a melhor resposta para combater o discurso de ódio?

A proteção do direito de expressão no ambiente digital não precisa passar decisivamente pelos tribunais. Não há, na América Latina, evidência empírica quantitativa de que as Cortes tenham contribuído para a supressão sistemática do discurso de ódio. Os tribunais não são a arena mais indicada para lidar com esse problema, porque a principal questão não está no conteúdo em si, mas na cultura de ódio digital e nos espaços virtuais em que esses grupos florescem. Esperar que os tribunais vão salvar a pátria é confiar num mecanismo muito centralizado, em que pouquíssimas pessoas vão dizer o que é e o que não é verdade.

 

Qual é o melhor caminho?

Não é a falta de controle, ao contrário. A melhor maneira de lidar com esse desafio é descentralizar essas decisões para a sociedade civil, de maneira organizada e empoderada pelas plataformas, agir com controle. A mobilização de organizações civis, atuando em conjunto e buscando a moderação crowdsourced no ambiente online.

 

Onde entra a legislação?

Ela precisa estruturar e impor às plataformas os mecanismos de participação, de forma que os próprios usuários possam atuar na moderação, sem depender da generosidade dessas empresas. São necessárias regras claras sobre procedimento de moderação. No Brasil, por exemplo, há uma tendência histórica de o Judiciário rejeitar a condenação de declarações racistas supostamente humorísticas, isentando de punição aquilo que alguns pesquisadores têm chamado de “racismo recreativo”.

 

As plataformas alegam que buscam fazer sua parte. São bem sucedidas?

A autorregulação não funcionou. Ela foi aplicada nos últimos dez anos e os resultados foram péssimos. As plataformas sabem disso. Entre as declarações públicas sobre o tema, a de maior impacto foi publicada pelo CEO da Meta, Mark Zuckerberg, que declarou: “Nós não podemos assumir essa função sozinhos”. Contratar mais moderadores latino-americanos não seria o suficiente. A regulação e a contribuição de grupos organizados da sociedade têm o potencial de ser muito mais eficazes do que os tribunais e as plataformas agindo sozinhas.

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