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Concessões de rodovias oscilam entre a guerra de preços e a de votos

O Brasil tem milhares de quilômetros de estradas na fila de licitação, mas a privatização não é muito popular em anos de eleições, diz o professor Sandro Cabral

O Brasil tem milhares de quilômetros de estradas na fila de licitação, mas a privatização não é muito popular em anos de eleições, diz o professor Sandro Cabral

Rodovia no Brasil
Movimento de veículos em rodovia: as discussões técnicas sobre licitações costumam avançar mais lentamente em período eleitoral  (crédito: Agência Brasil)

 

Leandro Steiw

 

Em 2022, 13 mil quilômetros de rodovias federais poderiam ser concedidos à iniciativa privada, nas contas do Ministério da Infraestrutura. Nos próximos 30 anos, período típico de duração dos contratos, os investimentos chegariam a 100 bilhões de reais, principalmente nos seis lotes de rodovias no Paraná, avaliados em 44 bilhões de reais. Os estudos sobre os 3,4 mil quilômetros paranaenses foram protocolados no Tribunal de Contas da União em novembro de 2021. A expectativa é marcar o leilão para o segundo trimestre, se o projeto for aprovado.

Em fevereiro, foi publicado o edital de licitação do sistema BR-116/493/465, que liga a capital do Rio de Janeiro a Governador Valadares, em Minas Gerais. O leilão está marcado para 20 de maio. Vencerá a oferta com a menor tarifa de pedágio e maior valor de antecipação de outorga (licença paga ao poder público pela exploração da concessão). O contrato de 30 anos prevê investimentos de 8,8 bilhões de reais em duplicação e construção de faixas adicionais, vias marginais e passarelas, distribuídos pelos 727 quilômetros de estrada.

Outra licitação aguardada para este ano, mas suspensa pela Agência Nacional de Transportes Terrestres, é a da BR-381/BR-262, entre Minas Gerais e Espírito Santo. Foi a terceira vez que se adiou o leilão. Segundo a ANTT, o edital precisa ser aperfeiçoado. Um dos motivos é a inclusão de um mecanismo de proteção contra a alta do preço de insumos, como aço e asfalto, que o governo pretende testar no contrato. Os investimentos nos 670 quilômetros seriam da ordem de 7,3 bilhões de reais ao longo do contrato.

A invasão da Ucrânia pela Rússia catapultou o preço do barril de petróleo, matéria-prima do asfalto, o insumo mais importante nos primeiros anos de recuperação dos trechos concedidos. O Ministério da Infraestrutura pretende testar um índice de reajuste de obras combinando 70% da variação do IPCA e 30% da do IGP-DI — nos contratos em vigor, é 100% pelo IPCA. A explicação é que o IGP-DI capta melhor as variações cambiais que incidem sobre os insumos da indústria e da construção, entre os quais o asfalto.

 

Votos a pavimentar

As demais rodovias federais encontram-se em processo de estudo, consulta pública e apreciação do TCU, o que as tornam vulneráveis a atrasos. Como se sabe, 2022 é ano eleitoral, e as discussões técnicas costumam ser eclipsadas pelo processo político. Segundo Sandro Cabral, professor titular do Insper e coordenador do Mestrado Profissional em Políticas Públicas (MPP), o ritmo deve diminuir, seja porque o tema das concessões de serviços públicos ao setor privado não é necessariamente popular em períodos eleitorais, seja porque em tais períodos as atenções de políticos estarem voltadas ao processo sucessório. “Uma agenda de concessões e PPPs requer dedicação e comprometimento da parte de atores políticos e atores técnicos”, observa.

Cerca de 60% do transporte de cargas no Brasil é feito por meio de 1,7 milhão de quilômetros de rodovias. Pelas próprias características dessa matriz, o estoque de vias disponíveis está longe de atingir o limite. “Temos muitas oportunidades no Brasil. A questão é que se precisa fazer estudos de viabilidade e cálculos sobre o melhor custo-benefício, inclusive politicamente”, diz Cabral. Existem estradas federais e estaduais menores que os governos podem repassar para o setor privado. Também há concessões que estão vencendo e sendo relicitadas.

Em Mato Grosso, por exemplo, estão em estudo dez trechos de rodovias estaduais que passam ou pela capital, Cuiabá, ou por polos do agronegócio — importantes para escoar a produção de grãos. Entre prospecção de mercado e publicação do edital, há os arcos rodoviários metropolitano de Fortaleza, João Pessoa e Recife e o rodoanel de Belo Horizonte, além de estradas em Sergipe, Amazonas, Pará, Tocantins, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul.

O Índice ABCR, da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias, aponta uma defasagem de 2,3% no fluxo de veículos leves e pesados nas estradas sob concessão em fevereiro de 2022, relacionado ao início da pandemia de covid. Num país predominantemente rodoviário, o índice permite inferir o comportamento da economia diante da retomada das atividades presenciais e a estabilidade no transporte de cargas. O tráfego de veículos pesados, porém, já é 6,6% superior no mesmo intervalo de tempo.

No Brasil, predominam as concessões ao investidor que oferece o maior valor de outorga, o menor preço de pedágio ou ambos — o modelo foi se ajustando desde o início do programa de privatizações, em 1995. Uma alternativa são as parcerias público-privadas (PPPs), para os projetos que não se sustentam apenas com a tarifa do pedágio e precisam da contrapartida estatal. É o caso dos metrôs, cujo impacto na mobilidade urbana justifica a divisão dos investimentos. O Banco Mundial estima que o setor privado investiu, no Brasil, 56 bilhões de dólares (cerca de 265 bilhões de reais) em projetos rodoviários de 1990 a 2021.

Conforme pesquisa da Confederação Nacional do Transporte, são necessários 82,5 bilhões de reais para a reconstrução do asfalto e a restauração de trincas, buracos, ondulações, remendos e afundamentos de 93 mil quilômetros. A CNT apresenta dois indicadores das consequências da má conservação: em 2021, os custos de acidentes causados por falhas na pavimentação, sinalização e geometria atingiram 12,2 bilhões de reais, com o desperdício de 956 bilhões de litros de diesel.


NO RADAR

A situação das rodovias federais programadas para licitação em 2022:

 

Qualificação ao PPI

• BR-060/153/262/DF/GO/MG (relicitação)

 

Estudos

• BR-040/DF/GO/MG

• BR-135/316/MA

• BR-158/155/MT/PA

• BR-163/267/MS (relicitação)

• Rodovias do Centro-Oeste e Norte

• Rodovias do Nordeste

• Rodovias do Rio Grande do Sul

 

Consulta pública

• BR-040/495/MG/RJ

 

TCU

• Rodovias Integradas do Paraná

 

Edital

• BR-116/493/465/RJ/MG – Leilão em maio

• BR-381/262/MG/ES – Leilão suspenso

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