Realizar busca
test

O que esperar da COP27 em meio a tensões internacionais

Financiamento climático, transição energética e segurança alimentar estarão no foco da conferência que acontece de 6 a 18 novembro no Egito

Financiamento climático, transição energética e segurança alimentar estão no foco da conferência que acontece de 6 a 18 novembro no Egito

 

Renato Cintra Camargo, assistente de pesquisa do Insper Agro Global

Camila Dias de Sá, pesquisadora do Insper Agro Global

 

As conferências das Nações Unidas sobre temas ambientais estão entre os grandes encontros internacionais para cooperação entre países no âmbito público, privado e da sociedade civil. A 27ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP27) será sediada em novembro em Sharm El-Sheikh, no Egito, buscando consolidar compromissos e acordos de cooperação climática firmados anteriormente e pavimentar o caminho para alcançar a meta de aumento máximo de 1,5°C da temperatura global até 2030. Na ocasião, líderes e stakeholders globais se reunirão para debater temas relevantes para a mitigação, a adaptação e o financiamento das mudanças climáticas.

A conferência anterior, COP26, trouxe avanços na regulação do mercado global de carbono com o Pacto Climático de Glasgow e envolveu, ineditamente, o setor privado como ator relevante para a concretização dos compromissos firmados. Esse engajamento sem precedentes motivou empresas e bancos brasileiros a assinarem compromissos e a aderirem a iniciativas de redução de emissões, como SBTi e Net Zero Banking Alliance. A COP27 trará, portanto, uma exposição maior desses setores, em que se espera a demonstração de resultados e caminhos para atingir as metas acordadas a partir de Glasgow.

Se na COP26, na Escócia, foi ratificado o Acordo de Paris, a COP27 é o momento de avançar na operacionalização dos mecanismos do Artigo 6, que diz respeito ao estabelecimento de mercados internacionais de carbono. Detalhando: o Artigo 6.2 permite que os países cooperem e troquem entre si os “Resultados de Mitigação Internacionalmente Transferidos” (ITMOs), enquanto o Artigo 6.4 delineia a estrutura de um mecanismo para o comércio global com resultado de emissões, incluindo empresas e sendo monitorado por um órgão de supervisão oficial. O pragmatismo necessário para progredir com as promessas e os compromissos assumidos no ano passado levaram especialistas a chamar a COP27 de “COP da implementação”.

Na COP27 será necessário avançar em temas como financiamento climático, compensação por perdas e danos e adaptação climática. O fornecimento e a mobilização de fluxos de recursos apropriados são fundamentais para assegurar a entrega de prazos e escala de ações, alinhados a outros meios de implementação na forma de tecnologia e capacitação para garantir que países em desenvolvimento participem do esforço global em diferentes setores de descarbonização.

A compensação por perdas e danos também deve ganhar magnitude nas negociações. Trata-se de meios para compensação por prejuízos que não foram — ou não serão — evitados por vias de mitigação e adaptação, um assunto que os países ricos temem pautar, pois pode abrir portas para países pobres com baixas emissões cobrarem reparação financeira por estragos como enchentes, salinização e migração decorrente da elevação do nível do mar, entre outros. Questões relacionadas à crise energética, deflagrada pela invasão da Rússia à Ucrânia, e a crescente inflação global poderão representar percalços para a liberação de tais recursos.

A agricultura, que atuou como coadjuvante em edições anteriores da conferência, deve ter o seu papel no combate às mudanças climáticas reforçado na COP27. Pela primeira vez haverá um pavilhão dedicado única e exclusivamente aos sistemas alimentares: The Food Systems Pavillon. Como país sede, o Egito deve trazer à tona não só os temas de financiamento e adaptação para os países mais vulneráveis, mas também a questão da segurança alimentar. Sua localização no continente africano, onde a garantia de acesso aos alimentos não é uma realidade, traz ao país a responsabilidade de discutir o nexo entre mudanças climáticas e produção de alimentos, em seus diferentes aspectos.

Neste cenário, o agronegócio brasileiro deve ganhar espaço por protagonizar modelos de agricultura de alta produtividade e de baixo carbono, lastreados em tecnologias tropicais de produção. Evidentemente, a agenda de descarbonização brasileira não deve ser guiada apenas pelo Acordo de Paris, mas para o próprio desenvolvimento interno, com mútuo benefício. Nesse sentido, é importante estabelecer uma estratégia clara para alcançar as metas propostas, principalmente de redução do desmatamento, de forma a credibilizar ações e investimentos verdes adotados, agregando a preservação como um importante ativo ambiental dos produtos agrícolas no território brasileiro. O Plano ABC+, como principal ferramenta de incentivo à agricultura sustentável no Brasil, é uma prova palpável de que é possível ter uma agenda de desenvolvimento que escala a produção sustentável enquanto preserva o meio ambiente.

A regulação do mercado de carbono global por meio da implantação do livro de regras ainda levará alguns anos para ser concluída, mas não faltam oportunidades para consolidar e apontar caminhos para o grande pacto verde que se impõe. Com a governança climática global sendo o maior desafio das negociações, o agronegócio brasileiro, representado pela CNA, alerta que é fundamental que decisões relacionadas a questões metodológicas de mensuração de carbono sejam robustas o suficiente para a geração de créditos de alta credibilidade. A negociação do critério de adicionalidade, as regras de aplicação dos ajustes correspondentes e a qualificação dos ITMOs são fundamentais para que o mercado não se torne restritivo a ponto de prejudicar setores e atividades específicas.

Logo após a COP27 sobre mudanças climáticas no Egito, ocorrerá no Canadá a COP15 sobre Biodiversidade. Embora já esteja em sua 15ª edição, essa COP ainda não foi capaz de sensibilizar a sociedade para a questão da perda de biodiversidade e dos seus potenciais riscos, na mesma proporção que a urgência climática tem sido considerada nas mais diferentes esferas. Nesse cenário de riscos e oportunidades, cabe ao Brasil fazer o dever de casa e implementar para valer o Código Florestal, valorizando e permitindo o reconhecimento, em nível mundial, de outros esforços de mitigação na agricultura e na pecuária de baixo carbono. O Brasil deve fazer jus à vocação de potência agroambiental, contribuindo para a segurança alimentar global ao mesmo tempo que preserva ativos hídricos e florestais e a maior biodiversidade do mundo.

Este website usa Cookies

Saiba como o Insper trata os seus dados pessoais em nosso Aviso de Privacidade, disponível no Portal da Privacidade.

Aviso de Privacidade

Definições Cookies

Uso de Cookies

Saiba como o Insper trata os seus dados pessoais em nosso Aviso de Privacidade, disponível no Portal da Privacidade.

Aviso de Privacidade