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“O tema das emissões da agropecuária merecia mais atenção”

Em entrevista concedida do Egito, Marcos Jank, coordenador do Centro de Agronegócio Global do Insper, avalia a 27ª Conferência das Partes e o papel do agronegócio para o controle das mudanças climáticas

Em entrevista concedida do Egito, Marcos Jank, coordenador do Centro de Agronegócio Global do Insper, avalia a 27ª Conferência das Partes e o papel do agronegócio para o controle das mudanças climáticas

 

Tiago Cordeiro

 

Entre os dias 6 e 18 de novembro, aproximadamente 40 mil pessoas se reuniram no Centro Internacional de Convenções de Sharm El Sheikh, no Egito, para dar sequência aos diálogos a respeito da contenção das mudanças climáticas. O objetivo da Conferência das Partes (COP), que neste ano chegou à 27ª edição, é manter o aquecimento global no máximo a 2oC — e se possível a 1,5oC — em comparação com os níveis pré-industriais.

Muito mudou desde a realização da primeira COP, em Berlim, em 1995. “O que era um encontro de governos e ONGs passou a contar com uma participação expressiva do setor privado”, diz Marcos Jank, coordenador do Centro de Agronegócio Global do Insper.

Experiente em participações em Conferências das Partes, Jank acompanhou pessoalmente os debates realizados no balneário de Sharm El Sheikh, uma cidade de 73 mil habitantes banhada pelo Mar Vermelho. Em entrevista concedida do Egito, Jank avaliou o encontro, comentou a participação do Brasil e sugeriu que, na próxima conferência, o potencial de redução de emissões do agronegócio seja debatido mais a fundo.

 

Havia uma expectativa de que os mercados de carbono regulados iriam avançar nesta COP. Foi o que aconteceu?

Da ótica de políticas de governo, as COPs são caracterizadas por avanços lentos. Caminhamos bem menos do que gostaríamos no setor público, especialmente no mercado regulado de carbono. Esta é uma área que permanece uma promessa, e não uma realidade, ainda que se tenha evoluído mais um pouco neste encontro. O que vem avançado rapidamente é o mercado voluntário, pela força das empresas e dos mecanismos de desenvolvimento de mercado que foram criados.

 

Qual o papel do setor privado nos debates?

Muito grande. É uma presença que não existia antes. Agora vemos praticamente todas as grandes corporações globais presentes, assumindo compromissos importantes de redução de emissões, com metas para neutralizar as emissões e se tornar net zero. Este foi um tema bastante presente, assim como a questão da rastreabilidade do desmatamento. Aliás, as pautas das COPs estão muito mais diversificadas. No passado, falava-se apenas da questão da queima de matérias-primas de origem fóssil.

 

Quais os impactos dos debates realizados no Egito para o agronegócio brasileiro?

A COP27 avançou menos do que deveria na questão das emissões da agricultura. O Brasil ainda é considerado um vilão do desmatamento, que aumenta no país desde 2018. Hoje, 95% do desmatamento é ilegal. Por outro lado, o Brasil dá o exemplo na produção de energia de fonte renovável e segue avançando em fontes eólica, solar e de biomassa, enquanto o mundo rico parece não estar disposto a avançar.

O país também tem contribuições a dar quanto se trata das emissões da agricultura. Há décadas o país intensifica a produção, transforma pastos degradados em terras produtivas, melhora a qualidade do gado, integra lavoura e pecuária. Com isso, consegue não só manter uma agricultura mais competitiva e sustentável, com melhor balanço de emissões, mas também reduz a pressão por desmatamento.

Ainda assim, hoje essas ações não geram crédito nenhum ao produtor. Esperamos que, em algum momento, elas façam parte do mercado regulado de carbono, que permita que o agro receba reconhecimento e incentivos.

 

Durante o evento, 14 empresas do setor de alimentos apresentaram um roadmap para alcançar a redução de emissões, preservando a produção de alimentos para uma população global de 8 bilhões de pessoas. Como o senhor avalia esse anúncio?

Conversei com várias das empresas envolvidas. Elas atuam principalmente com soja, carne bovina e palma, áreas que ainda produzem muito desmatamento. Apresentaram uma proposta conjunta para aumentar a rastreabilidade da cadeia. O setor de soja chegou a anunciar que, em 2025, não vai mais comprar o grão de áreas em que sejam identificados desmatamentos, legais ou ilegais. São propostas difíceis de executar. Não ficou claro como elas serão efetivadas.

No caso da soja, o produtor que desmata legalmente está ancorado pelo Código Florestal. Na agropecuária, os frigoríficos compram boi de um produtor que faz a fase final da engorda, mas o animal passa antes por diversas fazendas, onde pode ter havido desmatamento. A promessa é rastrear até a origem, o que é muito difícil.

 

Há um ano, o senhor afirmava que o Brasil tinha perdido protagonismo na agenda climática global. Neste ano, o país se apresentou com a segunda maior delegação, atrás apenas da dos Emirados Árabes Unidos. Como avalia a participação do país nesta edição?

Nunca vi tantos brasileiros em uma COP. E havia uma euforia no ar. Participei da conferência do presidente eleito Luís Inácio Lula da Silva. Foi uma palestra muito boa, de muita qualidade na redação. Ele apontou as dificuldades da área de clima e propôs algumas ações e se compromete fortemente com a redução do desmatamento ilegal na Amazônia.

Falou em aproximar os oito países da Amazônia. Sugeriu que a COP30, de 2025, aconteça no Brasil, mais precisamente num dos estados da Amazônia. Falou da necessidade histórica de que os países ricos ajudem os pobres e mencionou o problema de financiamento da descarbonização. Ele trouxe uma mensagem de que desmatamento e redução de emissões vão ser prioridades em seu novo governo.

 

O que esperar da próxima COP, a ser realizada em novembro de 2023 em Dubai?

É importante tratar das emissões da agricultura com maior profundidade. Para os produtores brasileiros, este tema representa uma oportunidade. O reconhecimento da agricultura de baixo carbono do Brasil é uma pauta estratégica.

 

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