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“Há necessidade de trabalhar a diversidade na cultura das empresas”

O aumento da contratação de pretos e LGBTQIA+ é apenas o primeiro passo. As organizações precisam agir para promover também a sensação de pertencimento, diz o professor Thales Graça Athanásio

Thales Graça Athanásio

O aumento da contratação de pretos e LGBTQIA+ é apenas o primeiro passo. As organizações precisam agir para promover também a sensação de pertencimento, diz o professor Thales Graça Athanásio

 

Bruno Toranzo

 

O Dia Nacional da Consciência Negra, 20 de novembro, foi instituído para lembrar a morte de Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares, assassinado em 1695. A data serve para promover reflexões, discussões e ações para combater o racismo e a desigualdade social no Brasil. Não faltam dados que mostram o quanto o país ainda precisa avançar nesse sentido. Em 2021, os trabalhadores brancos receberam, em média, R$ 19 por hora de trabalho no país. O valor superou em cerca de 74% o rendimento dos pretos (R$ 10,90 por hora) e em 68% a quantia paga aos pardos (R$ 11,30 por hora).

Esses números, ajustados pela inflação, estão no levantamento “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil”, realizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), e foram calculados com base no indicador de rendimento médio do trabalho principal das pessoas ocupadas.

Há outros dados que demonstram a desigualdade entre pretos e brancos no mercado de trabalho. Mais da metade dos trabalhadores do país em 2021 era formada por pretos e pardos, o correspondente a 54%, mas os dois grupos somados ocupavam somente 30% dos cargos gerenciais. Os brancos preenchiam 69% desses postos de trabalho. Já a taxa de desemprego foi de 11% entre os brancos, 17% entre os pretos e 16% entre os pardos.

Cenário semelhante se observa em relação ao público LGBTQIA+. Apenas 14% de mulheres trans e travestis tinham empregos formais em 2020, de acordo com dados da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). Entre os homens trans, esse percentual foi de 59%. A pesquisa foi feita com 528 transexuais de sete cidades paulistas.

Há empresas que justificam a não contratação de pessoas pertencentes a esses grupos pela dificuldade de encontrar mão de obra qualificada dentro da urgência muitas vezes demandada pelas vagas em aberto. “Esse discurso está em desuso, mas ainda acontece. Fui convidado recentemente para um evento de diversidade promovido por um aplicativo de entrega de comida. Há um grupo no RH especializado em encontrar essas pessoas no mercado, utilizando o critério de diversidade”, diz Thales Graça Athanásio, professor de Cálculo nos cursos de Administração e Economia do Insper e líder da rede de afinidade Raça. “Eles fazem o processo seletivo de tal maneira que o primeiro contato de um possível colaborador com a empresa seja feito por uma pessoa pertencente àquele grupo. Assim, se eles estão entrevistando uma mulher, será outra mulher que fará esse primeiro contato. Isso auxilia no processo de identificação e, consequentemente, de futuro pertencimento, além de tornar a conversa inicial mais leve.”

Mas se engana quem pensa que o estímulo à diversidade para na contratação. A empresa precisa fazer com que os colaboradores entendam e respeitem as particularidades desses grupos. “Há necessidade de trabalhar a diversidade na cultura da empresa com algum tipo de letramento. É papel da empresa garantir que o colaborador contratado se sinta à vontade no dia a dia”, diz Athanásio. “O RH deve estar atento à taxa de retenção. O colaborador só fica onde se sente bem e, para isso, a sensação de pertencimento é fundamental.”

O significado de letramento, de acordo com o professor, é mostrar para as pessoas aquilo que talvez nunca tenham pensado, pois não pertencem a determinado grupo. “Isso porque você não vê sob a ótica de outras pessoas, motivo pelo qual considera algumas práticas naturais, mas que, para determinado grupo, podem não ser”, diz Athanásio.

A empresa deve então promover encontros com a presença de todos os colaboradores para trabalhar questões como essa, que envolvem geralmente o viés inconsciente. “O não querer dizer algo pode resultar, ainda assim, em alguém ofendido pelas palavras ditas. Quando isso ocorre, ambas as partes precisam parar para conversar, sem que se sintam atacadas ou ofendidas”, afirma.

Essas práticas, segundo o especialista, promovem uma cultura de respeito à diversidade no sentido de haver plena integração da empresa com esses profissionais. “Não são esses grupos que devem se adaptar à empresa, mas o contrário, com um trabalho interno de valorizar e incentivar a diversidade em todos os níveis da organização”, afirma.

 

Desigualdade entre homens e mulheres

O assunto da diferença salarial entre trabalhadores e trabalhadoras foi bastante abordado durante as eleições presidenciais. As mulheres recebem cerca de 20% menos do que os homens no Brasil. Essa diferença salarial entre os gêneros persiste mesmo na situação de escolaridade, idade e categoria de ocupação iguais. Os dados são da consultoria IDados, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, do IBGE.

“O estímulo à diversidade, equidade e inclusão no mercado de trabalho envolve demandas de vários grupos. O encontro que fizemos recentemente procurou contemplar todos eles. As empresas precisam estar atentas a essas questões para que suas ações estejam realmente alinhadas com o discurso”, diz Athanásio.

O evento “Diversidade, equidade e inclusão no mercado de trabalho”, promovido pela Comissão de Diversidade, Equidade e Inclusão do Insper, foi realizado no último dia 16 de novembro, com a presença, além de Athanásio, de Gabriel Romão (homem trans, negro, formado em Pedagogia pela PUC-SP), Gustavo Narciso (diretor executivo do Instituto C&A) e Jackeline Camillo (mulher, mãe, negra, especialista em treinamento e desenvolvimento de pessoas), que compartilharam suas experiências sobre o tema da inclusão de pessoas no mercado de trabalho.

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