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Ciências exatas ainda impõem muitas barreiras às mulheres

Na Semana de Ciência de Dados e Engenharia do Insper, elas debateram sobre como vencer o preconceito na área de computação

Na Semana de Ciência de Dados e Engenharia do Insper, elas debateram sobre como vencer o preconceito na área de computação

 

Leandro Steiw

 

Três painéis da Semana de Ciência de Dados e Engenharia do Insper, que aconteceu nos dias 17 a 21 de outubro, foram dedicados aos desafios e às oportunidades de trabalho para mulheres em tecnologia e, particularmente, em Engenharia e Ciência da Computação. “Sabemos que somos uma minoria, por trabalhar num ambiente com predominância masculina”, disse a professora Bruna Arruda, uma das coordenadoras da Comissão de Diversidade, Equidade e Inclusão do Insper. “As meninas no ensino médio ainda acham que a matemática não é para elas e que a engenharia também é coisa de homem.”

Os dados do relatório W-Tech da organização civil Softex evidenciam: no Brasil, as mulheres representam apenas 13,3% das matrículas nos cursos presenciais de graduação em Computação e Tecnologias da Informação e 21,6% nos de Engenharia e correlatos. A média mundial é só um pouco melhor: 30% nos campos de estudo de ciências, tecnologia, engenharia e matemática (identificados pela acrônimo em inglês Stem). O momento de procurar emprego tem sido outro embaraço. De 2015 para 2019, a participação feminina nas posições de TI caiu de 38,1% para 35,6%. A diferença salarial máxima a favor dos homens chegou a 27,9% no período.

E, mesmo superando essas barreiras, as mulheres que se formaram em Engenharia, como Bruna Arruda, demoram a conquistar espaço, muitas vezes por não terem consciência da discriminação. Ela lembrou que, quando entrou no mestrado, era excluída das tarefas mais técnicas nos trabalhos em grupo e, constantemente, encarregada das tarefas administrativas por ser mulher. Bruna recordou que, vindo de uma família inter-racial, foi nas rodas de conversas do Insper, como o “Women in Tech”, que entendeu o seu papel, resgatou a sua identidade e se entendeu como negra.

Engenheira de computação, Bruna Zamith Santos é cientista de dados na Amazon. Ela acredita que encontrar figuras de referência e se fazer ouvir são dois dos desafios na Engenharia. “Das mulheres da minha família, fui a única que segui em ciências exatas e, na faculdade, era a única mulher”, disse. “Quando comecei a procurar e ouvir outras histórias, vi que há milhares de mulheres cientistas e em cargos de liderança em quem se inspirar. Foi muito importante para mim, pois sempre achei que teria que me esforçar o dobro para ser reconhecida.”

Para a engenheira de produção Jessica Dias, que trabalha com supply chain na Baker Hughes, os obstáculos para as mulheres começam na faculdade, porque o senso comum é que homens se dão melhor na profissão. Embora esteja realizada no trabalho, Jessica disse que já pensou em desistir, mas sempre há alguém para lembrar a sua origem e como batalhou para crescer na Engenharia. “Confie em você, entenda os seus pontos fracos e fortes e acredite que você é capaz”, recomendou.

 

Três vezes mais esforço

A engenheira mecânica Marília Pinto Fonseca Lins, analista de diversidade sênior do Itaú Unibanco, seguiu na área de engenharia de dados com foco em sustentabilidade, na qual começou como estagiária há nove anos. “Por volta de 2018, comecei a desenvolver minha consciência racial e criei muito gosto por diversidade e inclusão”, contou. “Sou mulher negra da zona leste de São Paulo, não estive nas melhores escolas, na minha família não tem engenheiros, mas tinha boas notas e entrei na universidade, com bolsa atleta, porque eu jogava handebol.”

A história contada por Marília é exemplar das dificuldades impostas. “Quando virou o primeiro ano, fiquei como única aluna na sala, as outras meninas saíram”, recordou. “A única mulher, negra, sem experiência. Eu vim da quadra, portanto sabia que teria que estudar três vezes mais que os meus colegas. Eu participava de todas as atividades da faculdade, conversava com os técnicos, e nisso você vai aprendendo a colocar a mão na massa. No banco, também demorei a falar e me posicionar. A gente vem de uma estrutura de uma sociedade que é machista, não tem incentivo para estudar matemática e fazer Engenharia. Quando entra no mercado de trabalho, não é diferente.”

Desde cedo, as mulheres são desestimuladas a escolher profissões na área de exatas. No quarto semestre de Engenharia Mecânica no Insper, Gabriela Albuquerque Alves lembrou que, na sua turma no Colégio Embraer, onde fez o ensino médio no interior de São Paulo, só havia cinco meninas. “Estávamos construindo do zero um carrinho de rolimã, com outros meninos, e não queriam que eu usasse as ferramentas porque eu iria me machucar”, disse. “Por que só eu poderia me machucar?”

Assim mesmo, Gabriela foi atrás do sonho de ser engenheira. Bolsista do Insper, ela apresentou, recentemente, o relatório de iniciação tecnológica “Tecnologias para maior inserção das mulheres lésbicas no campo científico tecnológico”. “Criamos um tipo de Linkedin de mulheres lésbicas para conversar e tentar ajudar a inclusão no mercado de trabalho”, explicou. “Você tem que saber que todo lugar de espaço vai impor desafios. Muitos vão te machucar e você precisa ter noção de que aguenta. Acho que a minha fala pode mudar essa noção de espaço de uma pessoa.”

 

Redes de relacionamento

Graduada em Relações Internacionais, Andrea Motta se direcionou para as atividades de inovação e tecnologia, focando em inclusão e diversidade por meio da UK Tech HuB, uma plataforma de empreendedorismo digital do governo britânico. Ela comentou que nem sempre as oportunidades serão óbvias para quem deseja trabalhar com tecnologia. “Estamos vendo transformação digital em todas as áreas, e em todas precisamos de gente e em todas falta diversidade”, disse. Andrea optou por trabalhar com governos e políticas públicas, para os quais já existem ecossistemas de inovação implementados.

Como sugestão de complementação para o empreendedorismo, Andrea Motta citou o Future Females, uma comunidade de apoio para mulheres desenvolverem as suas ideias profissionais. Ela acredita que enviar currículos para vagas de emprego não é a única nem a mais eficiente solução. “É preciso ter uma rede de relacionamentos e buscar onde estão as oportunidades específicas para mulheres”, sugeriu. “Tenha uma estratégia de carreira. Pode ser que você bata cabeça. Há 10 anos, eu não tinha essa clareza de que chegaria aqui, mas queria chegar. Não desanime. Saiba que você é pioneira, vai fazer coisas incríveis e que o desafiador é interessante.”

Mesmo em 2022, os preconceitos serão escancarados. Uma das fugas habituais para ser aceita é copiar a imagem que se espera das lideranças, normalmente vinculadas ao homem, ainda mais em ambientes predominantemente masculinos. “Fui colocando uma máscara para as pessoas poderem confiar em mim e, conforme fui crescendo na carreira, fui voltando às minhas características pessoais”, disse Carla Oliveira, engenheira de produção e gerente de produtos digitais da Dasa, empresa do setor de saúde. “Se eu tivesse a maturidade e a posição de hoje, faria outra coisa, mas naquela época eu não tinha voz para falar.”

Andrea Ramos Santos, CEO e fundadora da DisrupDiva, uma comunidade voltada ao protagonismo feminino, mencionou um dos vieses inconscientes relacionados ao etarismo e à ascensão profissional: “A idade perfeita é a idade do homem”. “Sempre buscamos o homem como a palavra final, por isso é importante fazer esse exercício para reconhecer outras mulheres”, disse. Carolina Fouad Kamhawy, gerente de projetos do Hub de Inovação Paulo Cunha do Insper, comentou que o Women in Tech é uma das iniciativas da escola em prol da liderança feminina.

 


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