Pressionadas a adotar uma agenda ambiental, social e de governança, grandes empresas procuram startups capazes de contribuir com respostas mais ágeis e eficientes
Tiago Cordeiro
Pouco antes da 26ª Conferência do Clima, realizada no ano passado em Glasgow, na Escócia, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) entrevistou 500 executivos de médias e grandes empresas industriais do Brasil. Descobriu que 72% admitem estar pouco ou nada familiarizadas com ESG, sigla em inglês para se referir às práticas ambientais, sociais e de governança.
Mas, ainda que desconheçam as implicações do conceito, 81% consideram importante, ou muito importante, o tema ESG. Com relação especificamente a ações de sustentabilidade, 63% dos entrevistados pretendem aumentar os investimentos nos próximos dois anos. E tomaram essa decisão incentivados pela pressão que sentem em relação à sociedade e aos consumidores (caso de 41% dos participantes) e o atendimento às exigências regulatórias (40% do total).
A pesquisa da CNI indica que, mesmo quando grandes empresas não entendem perfeitamente o significado de ESG, elas estão decididas a investir em ações nessa linha, principalmente para prestar contas à sociedade e aos reguladores. Para alcançar esse objetivo, seja no meio industrial, seja nos demais setores da economia, muitas das grandes corporações estão procurando o apoio de parceiros externos, capazes de agregar insights, métricas e tecnologias. As chamadas ESGTechs estão entre as empresas mais procuradas para participar desse processo.
“O mundo das startups é muito dinâmico e atento aos desafios enfrentados no ambiente corporativo e também na sociedade, de forma mais ampla”, diz Vinicius Picanço Rodrigues, Ph.D em Engenharia Mecânica pela Technical University of Denmark (DTU) e professor assistente no Insper, onde atua nas áreas de Sustentabilidade e Operações em programas de graduação, pós-graduação e educação executiva.
De fato, ao longo dos últimos anos, à medida que as startups passaram a olhar para nichos e se mostraram capazes de atender, de forma ágil e disruptiva, a necessidades de cada área da economia, novos apelidos foram surgindo: salestechs (para soluções de vendas), fashiontechs (moda e beleza), construtechs (construção civil), lawtechs (ligadas ao Direito), insurtechs (seguradoras tecnológicas), agtechs (voltadas para o agronegócio), edtechs (educação), healthtechs (saúde), HRtechs (recursos humanos) e pettechs (mercado pet), entre outros.
Mais recentemente, ganharam renome as greentechs, dedicadas a soluções ambientais, e as ESGTechs, que atuam em diferentes dimensões que fazem parte do guarda-chuva que engloba ações nas frentes ambiental social e de governança, incluindo desde a transição energética para uma matriz sem carbono até o aumento da diversidade nos cargos de liderança e nos postos de conselho administrativo.
A plataforma de inovação aberta Distrito estima que, no Brasil, as greentechs receberam US$ 532,4 milhões em 54 aportes de investidores de janeiro a dezembro de 2021, quase o dobro do valor registrado em 2020. Em termos globais, os recursos alocados por startups de soluções ambientais deverão alcançar US$ 44,6 bilhões em 2026, segundo a consultoria global Allied Market Research, Em 2018, elas haviam levantado um total de US$ 6,8 bilhões.
As startups focadas em soluções ESG atuam, por exemplo, utilizando dados de satélite para monitorar ameaças a florestas, ou controlando a destinação adequada de resíduos sólidos, ou aplicando tecnologia blockchain para validar as cadeias logísticas da distribuição de produtos. Também avaliam os processos internos das companhias e propõem soluções de gestão que aumentem a transparência.
“As startups contribuem principalmente de três formas”, diz o professor Picanço, que já foi pesquisador visitante do System Dynamics Group da Sloan School of Management do Massachusetts Institute of Technology (MIT). “A primeira é desenvolver e implementar mecanismos de mensuração de resultados e impacto, além de estruturar a comunicação e reporte dessas informações. A segunda se apoia no desenvolvimento de tecnologias emergentes — como inteligência artificial, internet das coisas ou blockchain — para entregar soluções específicas paras as necessidades de cada empresa”. A terceira maneira consiste em desenhar e implementar estratégias sustentáveis mais concretas. “Muitas empresas se beneficiam desse olhar de fora, porque sabem que precisam agir, mas não entendem por onde devem começar devido à infinidade de modelos, métodos e ferramentas”, diz Picanço.
Ele afirma que todas as empresas vão sofrer pressão para implementar medidas concretas em ESG. “Dependendo do setor, a maior fonte de cobrança vai vir da regulação, ou do consumidor, ou dos fornecedores, ou dos investidores. Todas essas fontes de pressão já estão atuando. O que varia é o grau de importância de cada uma delas de acordo com a área de atuação da empresa.”
Para Picanço, a governança está na base das ações, especialmente para corporações que prestam serviço ao poder público. “É fundamental implementar ações robustas de compliance, anticorrupção e em busca por diversidade nas equipes e transparência nos processos”, afirma.
Já o pilar social, segundo ele, reflete as características específicas da sociedade brasileira. “Temos questões socioeconômicas profundas no Brasil, para as quais as empresas em geral ainda não dão a devida atenção.”
Por fim, no campo ambiental, contribuir para que toda a cadeia mude processos ajuda não só a reduzir emissões, como também ganhar eficiência. “O mundo corporativo precisa investir em mapeamento e monitoramento de suas cadeias de suprimentos, tanto imediatas quanto estendidas. E as startups têm muito a contribuir nesse sentido.”