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Metas de desempenho atreladas ao orçamento ainda são a regra nas empresas

O administrador Alberto Ferreira defendeu dissertação em que mostra como novas metodologias de gestão são implantadas parcialmente no Brasil

O administrador Alberto Ferreira defendeu dissertação em que mostra como novas metodologias de gestão são implantadas parcialmente no Brasil

 

Leandro Steiw

 

O orçamento é a ferramenta central do processo de planejamento e controle das organizações, mas o seu predomínio começou a ser questionado pela percepção de que a contabilidade gerencial, isoladamente, não era suficiente para monitorar todos os aspectos relevantes dos negócios. A execução do orçamento era custosa e pouco flexível. Além disso, a ênfase em metas preestabelecidas incentivaria comportamentos disfuncionais, segundo os críticos. Novas metodologias de gestão, como Beyond Budgeting e Balanced Scorecard, propuseram o abandono do uso simultâneo do orçamento para fins de planejamento financeiro e determinação de metas de desempenho. Mas como as empresas no Brasil usam o orçamento e qual o grau de valor agregado que conferem a ele? Essa foi uma das questões tratadas na dissertação de Alberto Rodrigues Pinto Ferreira, do Programa de Mestrado Profissional de Administração do Insper, orientado pelo professor Luiz Vieira e coorientado pela professora Carla Ramos.

A pesquisa “Valor agregado pelo orçamento: Como as empresas endereçam as principais críticas ao orçamento tradicional”, de 2021, demonstra que as organizações no Brasil são capazes de adaptar os conceitos de orçamento original e o uso das metas orçamentárias para fins de avaliação de desempenho, por meio da utilização de tecnologia para acelerar o tempo de elaboração. Também conseguem produzir revisões frequentes e combinar ferramentas como planejamento estratégico e scorecards (“painéis de indicadores de desempenho”, em inglês), suprindo lacunas da dependência excessiva da gestão de desempenho baseada na contabilidade gerencial. As empresas usam parcialmente elementos do Beyond Budgeting e do Balanced Scorecard, o suficiente para mitigar os principais riscos por eles apontados.

O Beyond Budgeting (“além do orçamento”, em inglês) defende o abandono do orçamento como metas de desempenho. Quando foi proposto, no final dos anos 1990, os pesquisadores previam mudanças radicais no processo de gestão. Porém, estudos feitos posteriormente nos Estados Unidos, no Canadá e em países europeus constataram que a implementação da metodologia fora parcial, com muitas empresas mantendo o uso do orçamento no formato tradicional. Ferreira mostra que, no Brasil, a situação é semelhante — o que surpreende, porque localmente se reclama muito da dificuldade de planejamento. “Mas quando se pergunta qual é o grau de incerteza de um ano, a resposta na grande parte dos setores é que a incerteza não é tão grande assim para esse horizonte de tempo. As empresas não abandonaram o orçamento, e sim criaram processos que reduzem a incidência daquele problema. E estão relativamente satisfeitas com o processo”, diz o autor, que é graduado em Administração de Empresas e em Engenharia Civil e trabalha há 36 anos na área de Finanças.

Primeiro, Ferreira realizou uma pesquisa quantitativa composta por um questionário que replicou uma investigação dos pesquisadores Theresa Libby e R. Murray Lindsay feita nos Estados Unidos e no Canadá em 2010. O objetivo foi verificar como as empresas no Brasil percebiam o valor agregado e utilizavam seus orçamentos. Em resumo, 88% dos respondentes relataram manter o uso simultâneo do orçamento para fins de planejamento financeiro e definição de metas de desempenho, sem que essa decisão tenha afetado negativamente a percepção de valor agregado pelo orçamento. As conclusões corroboraram o resultado encontrado por Libby e Lindsay. “As respostas da amostragem brasileira foram quase idênticas às das pesquisas americanas de dez anos atrás”, diz Ferreira.

Entre as empresas que responderam ao questionário, Ferreira entrevistou pessoalmente representantes da área de Finanças (CFOs ou gerentes de planejamento), CEOs e executivos de outras áreas, obtendo os dados qualitativos da dissertação. Essa fase qualitativa esclareceu as razões que levaram as empresas a avaliar, na etapa quantitativa, o valor agregado do orçamento de forma positiva. “A boa percepção pode ser creditada ao sistema de controle gerencial como um todo, que combina planejamento estratégico, orçamento e ferramentas de gestão de desempenho num ciclo contínuo que se retroalimenta, e não à existência de um processo orçamentário de forma isolada”, escreve Ferreira.

Segundo o autor, a nuance mais interessante do trabalho é que os entrevistados afirmavam estar satisfeitos com o orçamento da empresa, mas os questionários e a pesquisa qualitativa apontavam as lacunas do orçamento solucionadas com outras ferramentas de gestão. “Então, quando alguém responde que está satisfeito, não é com o orçamento, é com o processo combinado. O orçamento continua sendo ruim para reagir à novidade, só que as pessoas usam métricas não financeiras que antecipam o resultado financeiro. Elas reagem antes. Não esperam o fechamento contábil para tomar as providências necessárias”, observa.

A dissertação abre caminhos para investigar a conexão entre a gestão de metas e a gestão de remuneração na incidência de comportamentos indesejados, já que a pesquisa não focalizou a diferenciação da intensidade de incentivos financeiros. Há uma linha de estudo que critica o uso de fortes incentivos financeiros ligados a metas de desempenho, pela dificuldade em estabelecer contratos abrangentes. Outro ponto é que incentivos muito fortes podem criar o chamado rato de laboratório. Alguns setores ou empresas tendem a pagar muito e correm o risco, pela remuneração, de enviesar o comportamento. “A pessoa só faz aquilo para o qual é paga, e não o que é correto. Assim, pode-se criar um viés de burla ao sistema para conseguir ganhar aquele prêmio”, explica Ferreira. “É uma terceira peça do tripé, de recursos humanos e remuneração, que seria muito bom de explorar futuramente.”

Alberto Ferreira
Alberto Ferreira

Achados da pesquisa qualitativa

  1. Há disciplina em seguir um modelo integrado de controle gerencial, englobando planejamento estratégico, orçamento e monitoramento frequente.
  2. Indicadores não financeiros são a chave para monitoramento e adaptação às mudanças.
  3. A revisão de metas é eventual, realizada somente em casos extremos.
  4. Baixa incidência de conflitos de interesse creditada a bons relacionamentos entre CEOs e conselheiros/donos/matriz – credibilidade e confiança.
  5. ERPs viabilizam um processo eficaz de consolidação do orçamento e contabilidade gerencial.
  6. Fusões e aquisições, gestão de projetos multifuncionais e crescimento para fora do país são elencadas como pressões nos sistemas de controle gerencial.

Fonte: Valor agregado pelo orçamento: como as empresas endereçam as principais críticas ao orçamento tradicional. De Alberto Rodrigues Pinto Ferreira, 2021.

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