O limite de gastos federais imposto por emenda constitucional em 2016 permitiu à União realizar desembolsos com saúde no triênio seguinte equivalentes aos que ocorreriam se a regra anterior ainda estivesse vigente. Na pandemia de 2020, tampouco tem sido empecilho para vultosas despesas extraordinárias.
O mecanismo, pensado para deter a aceleração das despesas primárias (não financeiras) e do endividamento público, dispõe que o total dos dispêndios de um ano não pode superar o realizado no ano anterior, corrigido pela inflação do IPCA.
No caso da saúde, a nova regra impede que as despesas caiam de um ano para o outro. Antes disso, a lei obrigava a União a gastar com saúde no mínimo um percentual da chamada receita corrente líquida, o montante arrecadado que fica no Tesouro Nacional após transferências constitucionais como as para estados e municípios. Esse percentual era crescente, começando em 13,2% em 2016 e devendo chegar a 15% em 2020.
Ao cotejar esse mandamento anterior com a nova regra determinada pelo teto, Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper, concluiu que os gastos federais na saúde de 2017 a 2019, que somaram R$ 353,8 bilhões, superaram ligeiramente (R$ 9,3 bilhões ou 2,7%) o que teria sido desembolsado caso fosse mantida a regra anterior.
Se for considerada a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que, meses antes da aprovação do limite de despesas, antecipava o atingimento dos 15% da receita corrente líquida como gasto mínimo de saúde, os desembolsos no triênio sob o teto foram pouco inferiores (R$ 2,5 bilhões, ou -0,7%) do que teriam sido no parâmetro anterior.
A comparação não computa os efeitos positivos que a própria introdução da regra do teto pode ter exercido sobre o crescimento da economia e, por essa via, sobre o comportamento da receita corrente líquida, muito atrelado ao desempenho da atividade.
Mendes destaca outras razões pelas quais o regime do teto de gastos pode melhorar a gestão orçamentária na saúde.


Ao colocar uma trava nas despesas indexadas ao salário mínimo, induzir a uma reforma da Previdência e dificultar a conquista de salários ainda mais elevados pela elite do funcionalismo, o dispositivo permitiu à saúde deixar a condição de perdedora na disputa por recursos do Orçamento que ostentou no regime anterior, em que a despesa com saúde sempre cresceu abaixo da com as demais rubricas.
O gasto com saúde parou de subir, em termos reais, em 2012 –quatro anos antes da criação do teto– sobretudo porque se estagnou a variação da receita, que indexava esse gasto. Com o teto, pela primeira vez em muitos anos foi possível despender acima do mínimo obrigatório e evitar perda de financiamento.
A União gastou na saúde pública, no primeiro triênio sob o teto, mais que o mínimo previsto na nova regra. Em 2020, para enfrentar a pandemia, os créditos extraordinários, que não contam para o limite de despesas, superavam R$ 37 bilhões até maio.
O teto de gastos também propicia um horizonte mais estável para as ações em saúde, à diferença das fortes oscilações a que se sujeitariam com as despesas atreladas à receita corrente líquida. Anula-se o caráter pró-cíclico do regime anterior, que obrigava a desembolsos elevados quando a economia ia bem e a cortes substanciais quando ia mal.