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O professor Hedibert Freitas LopesO professor Hedibert Freitas Lopes

 

Professor titular do Insper, Hedibert Freitas Lopes nasceu em Mato Grosso do Sul, mas cresceu no Rio de Janeiro, em um conjunto habitacional na periferia da cidade. Desde cedo, começou a se interessar por Matemática. Enquanto fazia o cursinho pré-vestibular, começou a trabalhar como digitador, função que continuou a exercer mesmo após ser aprovado na graduação em Matemática na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Só conseguiu largar esse trabalho quando obteve uma bolsa de iniciação científica, concedida por um professor que despertou seu interesse pela Estatística e pela carreira acadêmica.


Após concluir a graduação na UFRJ, Hedibert fez o mestrado em Estatística na mesma universidade. Iniciou sua trajetória como docente na Universidade Federal Fluminense (UFF), aos 23 anos. Após o término do mestrado, se transferiu, via concurso, para a UFRJ, mas logo partiu para uma carreira internacional. Fez o doutorado em Estatística e Teoria da Decisão na Duke University, nos Estados Unidos, o que lhe abriu as portas, anos depois, para a Universidade de Chicago, onde lecionou por 10 anos. Nesse período, colaborou com grandes nomes da academia e consolidou sua reputação internacional na área de estatística bayesiana, tornando-se o primeiro brasileiro reconhecido como fellow da International Society for Bayesian Analysis (ISBA).


De volta ao Brasil, Hedibert escolheu, em 2013, o Insper como sua nova casa acadêmica, atraído pela visão da instituição em promover a pesquisa de alto nível. Atualmente, ele coordena o Núcleo de Ciências de Dados e Decisão, leciona em programas de pós-graduação e desenvolve projetos que buscam posicionar o Insper como um centro de excelência em Estatística e Ciência de Dados. “Poderiam existir hoje 10 mil ‘Hediberts’ por aí, e não apenas 1 em 9.999, se a mobilidade social no Brasil não fosse tão limitada e, muitas vezes, perversa”, diz o professor no depoimento a seguir.

 

Infância no Rio de Janeiro


Nasci em 1968 em Mato Grosso do Sul, onde meus pais, muito jovens, se casaram e começaram sua vida juntos. Meu pai, seguidor da religião adventista, vendia livros da igreja, mas tinha dificuldades em cobrar as pessoas e, por isso, a situação financeira da família era sempre complicada. Quando eu era ainda pequeno, nos mudamos para o Rio de Janeiro, onde meu pai conseguiu um emprego como vigia noturno em um hospital adventista. Minha mãe trabalhou na lavanderia do mesmo hospital.


Em 1976, nos estabelecemos em um conjunto habitacional chamado Cidade Alta, na Avenida Brasil. É um lugar que serviu de cenário para o filme “Cidade de Deus”. Convivi com situações difíceis, como a venda de drogas e episódios de violência na vizinhança. Apesar disso, nunca me envolvi diretamente com essa realidade, talvez pela criação que recebi dos meus pais. Era um ambiente difícil, mas conseguimos viver de forma relativamente pacífica. Com o tempo, conseguimos melhorar um pouco de vida e nos mudamos para um prédio de classe média baixa no bairro do Méier. Foi um grande salto para nós.

 

A importância da educação


A educação sempre teve um papel central na minha vida. Desde criança eu já mostrava interesse por matemática, história, geografia e português. Tive um professor de matemática no primeiro grau (atual ensino fundamental) que tinha deficiência visual e me inspirou bastante. No segundo grau (hoje ensino médio), meu interesse por matemática se solidificou. Comecei a me interessar também por química e desenho técnico, que usava muita matemática e precisão, e decidi que queria seguir carreira em matemática.


Fiz um curso técnico em construção civil, mas percebi que precisava de uma educação mais acadêmica para passar no vestibular. Após o terceiro ano do ensino médio, passei no vestibular de uma instituição privada, mas decidi não cursar porque não teria condições de pagar. Fiquei um ano fazendo cursinho pré-vestibular e, nesse período, me dediquei a preencher as lacunas na minha formação. Um ano depois, consegui passar no vestibular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) para o curso de Matemática.

 

Da quadra de basquete à sala de digitação


Quando eu ainda estava no segundo grau, cheguei a pensar em ser jogador de basquete. Em 1985, joguei pelo Botafogo na categoria infanto-juvenil e também pela equipe de basquete intercolegial da minha escola. Mas uma lesão no pé me fez perceber que seguir carreira no basquete seria arriscado. Se eu fosse excepcional, poderia ganhar muito dinheiro, talvez até ir para a NBA, mas e se não fosse?


Decidi focar nos estudos. Durante o cursinho pré-vestibular, comecei a trabalhar como digitador em um centro de processamento de dados. O trabalho, que consistia em digitar grandes volumes de dados em um terminal, me permitiu estudar durante o dia e trabalhar à noite. Continuei com esse trabalho depois de entrar na UFRJ. Saía da universidade às 17h e começava a trabalhar às 18h, permanecendo até a meia-noite. Foram quatro anos de trabalho nesse ritmo.


No último ano da faculdade, ganhei uma bolsa de iniciação científica, que, na época, era quase equivalente ao salário de um digitador. Isso permitiu que eu me dedicasse exclusivamente aos estudos e à pesquisa.

 

 

O interesse pela Estatística


Durante a graduação na UFRJ, tive uma aula de Introdução à Estatística que me marcou profundamente. O professor Paulo Bravo, que ministrava a disciplina, mais tarde se tornaria uma figura essencial na minha trajetória ao me conceder uma bolsa de iniciação científica. Fiquei fascinado pela maneira como ele explicava os conceitos. Um exemplo que me impressionou: a partir da numeração de 10 táxis em uma determinada região, selecionados aleatoriamente, era possível estimar o número total de táxis na cidade. Esse método é semelhante ao utilizado para estimar a população de animais em uma floresta: captura-se um grupo aleatório, marca-se, solta-se novamente na floresta e, depois de algum tempo, recaptura-se para verificar quantos foram recapturados. Com isso, é possível estimar a população total.


Como jovem estudante de Matemática, fiquei encantado com essa aplicação da Estatística, que envolvia probabilidade e amostragem. No final do curso, procurei o professor Paulo e perguntei: “Professor, gostei muito dessa matéria. Como faço para seguir com mestrado e doutorado nessa área?”. Ele me respondeu: “Calma, termine a graduação primeiro, depois você faz o mestrado e, em seguida, o doutorado”. A partir desse momento, decidi seguir nessa direção. O professor Paulo foi uma referência fundamental para mim. Embora não tenhamos mais contato hoje, ele foi determinante na minha decisão de me tornar pesquisador e professor.
 

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Carreira internacional


Minha primeira experiência como docente foi na Universidade Federal Fluminense (UFF), entre 1992 e 1996, enquanto fazia meu mestrado em Estatística na UFRJ. Em 1996 me transferi, via concurso, para a UFRJ, onde fiquei até 2003. No total, permaneci como docente por pouco mais de 10 anos, com um intervalo de quatro anos, durante os quais me afastei para fazer o doutorado em Estatística e Teoria da Decisão na Duke University, nos Estados Unidos. Quando retornei ao Brasil, continuei lecionando na UFRJ por mais três anos, enfrentando o desafio de equilibrar uma alta carga de ensino com a pesquisa. Foi nesse período que meu orientador de doutorado na Duke me recomendou para uma vaga na Universidade de Chicago.


Em janeiro de 2003, fui para Chicago para uma entrevista, e em março recebi uma oferta de trabalho que mudou completamente minha vida. Passei 10 anos na Universidade de Chicago, um período extremamente produtivo em termos acadêmicos. Colaborei com professores sêniores, participei de inúmeros eventos científicos e intensifiquei minha agenda de pesquisa, aproveitando a facilidade de viajar para outras grandes cidades dos Estados Unidos.


O período em Chicago me permitiu expandir minha rede de colaboradores internacionais e orientar muitos alunos, além de manter um padrão elevado de pesquisa em nível internacional. Em 2022, fui reconhecido como fellow na área de estatística bayesiana, sendo o primeiro brasileiro a receber essa distinção. Mesmo após retornar ao Brasil, continuo ativo no cenário acadêmico internacional, participando de conferências, organizando eventos e mantendo minha pesquisa em alto nível, colhendo os frutos dessa experiência até hoje.

 

Uma família entre dois países


Em Chicago, conheci minha esposa, Maria Vibranovski, uma bióloga carioca que estava na Universidade de Chicago fazendo um pós-doutoramento em genética e evolução, após concluir seu doutorado no Instituto de Química da USP. Em 2008, decidimos morar juntos e, em 2010, nasceu nosso primeiro filho, Alexandre. Dois anos depois, decidimos voltar ao Brasil para estar mais perto da família e oferecer a dedicação necessária ao nosso filho.


De volta ao Brasil em 2012, Maria passou em um concurso para professora do Instituto de Biociências da USP, com apenas uma vaga e várias dezenas de candidatos. Um ano depois eu comecei a trabalhar no Insper. Estabilizados, decidimos ter outro filho, Diego, que nasceu em 2016 e que, como previsto por Maria, ajudou muito no desenvolvimento do Alexandre. Além dos dois filhos, tenho uma filha mais velha, Anne Jacqueline, fruto de um relacionamento na época da faculdade e que viveu comigo durante muitos anos, inclusive em Durham e Chicago. Hoje, ela é adulta, é casada e trabalha e mora no Rio de Janeiro.


No total, passei 10 anos em Chicago, mas a decisão de voltar ao Brasil foi influenciada principalmente pela necessidade de dar mais suporte aos meus filhos. Agora, com minha família completa, carrego uma tatuagem com as iniciais dos nomes dos meus três filhos (A2D), um lembrete simbólico e matemático da importância de cada um na minha vida.

 

O ingresso no Insper


Ao voltar para o Brasil, em 2012, comecei a interagir com o pessoal da algumas instituições de ensino. Foi então que bati na porta de Rinaldo Artes, professor do Insper, que me apresentou ao que estava sendo desenvolvido na escola. Acabei optando por ir para o Insper e participei de diversas transformações na instituição.


O que me atraiu no Insper foi a visão clara de promover pesquisa. Sob a liderança de Claudio Haddad, o Insper, mesmo sendo uma organização sem fins lucrativos, sempre buscou replicar os modelos das melhores universidades dos Estados Unidos, com forte ênfase na pesquisa. Embora em uma escala menor, o Insper oferece condições de pesquisa que lembram muito o ambiente que eu tinha em Chicago.


O Insper sempre incentivou novas ideias, desde a criação de trilhas e graduações, até o desenvolvimento de mestrados, doutorados e núcleos de pesquisa. Com isso, a instituição tem proporcionado um ambiente ideal para realizar pesquisa em alto nível, permitindo-me manter um padrão internacional em termos de orientação de alunos, participação em conferências e colaboração com pesquisadores de fora.

 

Ciências de Dados e Decisão


Atualmente, coordeno o Núcleo de Ciências de Dados e Decisão no Insper, que existe há cerca de seis anos. Com a recente reformulação do Centro de Gestão e Políticas Públicas (CGPP), conseguimos integrar o núcleo ao centro, o que tem impulsionado o desenvolvimento de projetos conjuntos.


Com essa nova estrutura, o núcleo está entrando em uma fase de crescimento e expansão, com o surgimento de projetos que envolvem não apenas professores de estatística e ciência de dados, mas também alunos e técnicos. Estamos construindo um ambiente mais colaborativo e aplicando a ciência de dados de forma prática e impactante, o que fortalece ainda mais a relevância do núcleo dentro e fora do Insper.

 

Linhas de pesquisa


Atualmente, meus principais interesses de pesquisa estão focados em três áreas. A primeira envolve minha participação em dois projetos temáticos da Fapesp, em colaboração com a Unicamp e a USP. Atuo como pesquisador principal no projeto, e meus interesses são em modelos de séries temporais para dados de altíssima dimensão, aplicados a cenários macroeconômicos e financeiros.


O outro projeto temático, que acaba de ser contemplado pela Fapesp e no qual também sou pesquisador principal, é uma parceria com o professor Paulo Furquim de Azevedo e a Procuradoria do Estado de São Paulo, que utiliza estatística, machine learning e inteligência artificial para análise, modelagem e tomada de decisões baseadas em grandes volumes de textos de processos judiciais.


Além disso, estou explorando uma terceira área de pesquisa relacionada a modelos causais, especialmente em políticas públicas. Nos próximos 10 anos, planejo expandir essa área, combinando séries temporais, causalidade e aprendizagem bayesiana para criar uma interseção robusta entre essas vertentes de pesquisa.

 

Estatístico bayesiano


Sou o primeiro brasileiro fellow da International Society for Bayesian Analysis (ISBA) e estive no comitê científico do último ISBA World Meeting, realizado em Veneza no início de julho deste ano. Além disso, já presidi o Capítulo Brasileiro da ISBA (ISBrA). Recentemente, nos dias 22 e 23 de agosto, quatro dos meus projetos foram apresentados por coautores na edição de 2024 do European Seminar on Bayesian Econometrics (ESOBE), em Örebro, na Suécia, num dos eventos internacionais mais importantes do mundo bayesiano.


Dois dos quatro trabalhos são de Igor Martins e Rafael Alcântara, dois egressos do nosso Doutorado em Economia dos Negócios, orientados por mim, e que defenderam suas teses em fevereiro último. A partir de agosto, estão começando seus pós-doutoramentos na UT Austin e na Universidade de Örebro. Os trabalhos são em coautoria com três dos mais renomados pesquisadores em Estatística e Econometria bayesiana da atualidade: Richard Hahn (ASU), Carlos Carvalho (UT Austin) e Sylvia Frühwirth-Schnatter (Vienna University).

 

Na sala de aula e outras atividades


Já dei aulas na graduação do Insper, mas, desde 2017, tenho me concentrado em ministrar aulas na pós-graduação. Atualmente, ensino duas disciplinas no Mestrado Profissional em Economia e uma no Doutorado em Economia dos Negócios. Além das aulas, minhas responsabilidades incluem a orientação de doutorandos e a participação em várias atividades acadêmicas, como a edição associada de uma revista na área de Estatística e Computação, onde seleciono pareceristas e reviso artigos. Além disso, estou envolvido em comitês acadêmicos, como bancas de avaliação para professor titular, e continuo publicando artigos e participando de comitês de doutorado.


Minha trajetória reflete a de alguém que, vindo de uma classe baixa, conseguiu, por meio dos estudos, alcançar uma posição de destaque. No entanto, sempre reflito sobre o fato de que, embora eu tenha conseguido, muitos outros não tiveram a mesma oportunidade. Poderiam existir hoje 10 mil “Hediberts” por aí, e não apenas 1 em 9.999, se a mobilidade social no Brasil não fosse tão limitada e, muitas vezes, perversa.

 

Projeto para o futuro


Todas as iniciativas que venho desenvolvendo no Insper, especialmente nas áreas de Estatística e Ciência de Dados, têm como objetivo, no longo prazo, criar uma área formal dedicada a essas disciplinas dentro da instituição. Em outras palavras, meu objetivo nos próximos 5 a 10 anos é estabelecer uma área formal de Estatística e Ciência de Dados na escola, onde os profissionais seriam contratados, avaliados e promovidos de acordo com os padrões específicos dessa área. Este é o meu grande objetivo dentro do Insper, algo que espero realizar antes de me aposentar.
 




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